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Por Mateus Coutinho – Brasil de Fato

O Museu do Holocausto de Curitiba alertou o governo do Paraná sobre a participação de um veículo com símbolo nazista no desfile de 7 de setembro em Curitiba no ano passado. A entidade dedicada à memória das vítimas do holocausto, porém, nunca obteve nenhum retorno do governo estadual sobre a situação.

O aviso foi feito em 18 de setembro do ano passado à Casa Militar do governo do Paraná, órgão vinculado diretamente ao governador do Estado, Ratinho Junior (PSD). Procurado sobre a situação, o governo estadual se limitou a informar, por meio de sua assessoria de imprensa, que “o veículo não pertence à Casa Militar do Paraná. O desfile de 7 de setembro em Curitiba tradicionalmente é organizado pelo Exército”.

Apesar de atribuir a responsabilidade ao Exército, integrantes do governo estadual participaram da organização do desfile também, que contou com apoio da Casa Militar da Governadoria do Paraná para o cerimonial e o fornecimento de materiais como gradis e palanque.

A falta de resposta das autoridades estaduais foi comunicada pelo Museu do Holocausto ao Ministério Público Federal (MPF) no Paraná, em uma manifestação encaminhada no dia 7 de fevereiro e que traz uma análise detalhada sobre o veículo que desfilou e a simbologia que ele carrega.

Como revelou o Brasil de Fato, a situação do veículo com símbolo nazista foi divulgada inicialmente por um site de notícias local e só começou a ser esclarecida recentemente, quando o MPF acionou as autoridades locais e o Exército.

Em reunião com o MPF no último dia 23 de fevereiro, o general Erlon Pacheco da Silva, que comanda a Artilharia Divisionária da 5ª Divisão de Exército, responsável por coordenar o desfile do 7 de setembro, admitiu que o veículo desfilou na parte destinada às entidades civis, mas disse que nem ele e nem os responsáveis pelo veículo sabiam que o símbolo do automóvel era nazista. Ainda segundo o órgão, o veículo teria sido utilizado em outros cinco desfiles na capital paranaense.

No Brasil, a apologia ao nazismo por meio da divulgação de símbolos, emblemas, ou a propaganda do regime nazista é crime que pode levar à prisão.

Nos autos da investigação, no entanto, não há nenhuma imputação de crime ou ato ilícito a Laércio.  Ele afirmou à reportagem que já vendeu o veículo e que o automóvel seria uma homenagem ao “Caroço dos Pracinhas”, segundo ele o nome dado a um veículo alemão que foi capturado pelos americanos e cedido aos pracinhas da FEB que estavam na Itália em 1944 e reformaram o veículo. “Nosso intuito sempre foi enaltecer os pracinhas e os aliados, sempre foi isso, nada mais que isso.”

Museu: não há dúvida sobre simbologia nazista

O símbolo nazista no veículo que desfilou não era a suástica, a representação mais famosa do terceiro Reich, mas uma cruz chamada de Balkenkreuz. Trata-se do principal símbolo utilizado em todos os carros e aviões militares alemães entre 1940 e 1945, segundo o Museu do Holocausto de Curitiba.

Apesar de não ser a representação mais reconhecida do regime nazista, para o coordenador-geral do Museu do Holocausto de Curitiba, Carlos Reiss, o fato de a cruz aparecer desenhada no modelo Volksvagen Kubelwagen projetado para as forças armadas nazistas, não deixa dúvidas de que se trata de uma referência ao terceiro Reich.

“Usada por cavaleiros germânicos na época das Cruzadas, durante a Idade Média, a cruz Balkenkreuz foi posteriormente inserida em equipamentos militares alemães durante a Primeira Guerra Mundial. Foi sob o regime nazista, em especial entre 1940 e 1945 que o símbolo se tornou a principal insígnia para veículos e aviões militares alemães. A escolha do símbolo não foi por acaso: em termos geopolíticos, os nazistas acreditavam no retorno à doutrina da ‘investida ao Oriente’. A Balkenkreuz não deve ser confundida com a Cruz de Ferro (esta, anterior e também posterior ao nazismo), cujos cantos são curvos”, diz a manifestação do Museu do Holocausto.

Ainda de acordo com o coordenador do Museu, após a Segunda Guerra Mundial, os símbolos associados ao nazismo, incluindo a cruz no veículo que desfilou em Curitiba, deixaram de ser utilizados nos veículos militares alemães após a Segunda Guerra, em um esforço para afastar o exército daquele período.

“Hoje em dia, quando usada em veículos militares, como o deste desfile cívico-militar, ele inevitavelmente remete ao regime nazista. Em outras palavras, tanto o veículo quanto a cruz representados de forma isolada não garantem a interpretação de simbologia nazista ou de qualquer forma de apologia; porém, o uso da cruz estampada num Kübelwagen não deixa dúvidas sobre seu propósito”, segue Reiss na manifestação.

Reiss conclui o documento manifestando o profundo “espanto e mal-estar” causado pelo episódio. “Aproveitamos da oportunidade para ressaltar que a presença de um veículo com um símbolo de um país estrangeiro e que remete ao nazismo e ao extermínio de milhões de pessoas soa-nos ofensivo e causa-nos profundo espanto e mal-estar, sobretudo apresentado ao público e a autoridades em um país democrático como o Brasil”

O MPF pretende ainda realizar uma reunião com o Museu do Holocausto e outra com a Brigada Paranaense de Viaturas Militares Antigas, entidade da qual o proprietário do veículo com simbologia nazista faz parte. A BPVMA é uma entidade sem fins lucrativos dedicada à preservação de viaturas militares, manutenção dos valores cívicos, homenagear a Força Expedicionária Brasileira (grupamento militar do país que lutou na Segunda Guerra na Europa) e demais missões brasileiras.

A reportagem entrou em contato com a Brigada, mas não obteve retorno. O espaço está aberto para posicionamentos.

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