Conhecida entre o final dos anos 1970 e começo dos 80 como “a igreja de Tim Maia”, a turma fiel à Imunização Racional voltou com tudo às ruas do centrão de São Paulo. É o que testemunhei ao flanar pela Pauliceia nos últimos meses. Lá estão os religiosos, em busca de converter novos seguidores.
A legião cresce a cada final de semana, mesmo em tempos de domínio absoluto dos pastores neopentecostais.
Fundada em 1935, na cidade do Rio de Janeiro, pelo médium Manuel Jacintho Coelho, a Cultura Racional é uma entre muitas “religiões OVNI” que surgiram no século 20.
Em nenhuma outra parte do planeta, no entanto, a corrente mística teve o privilégio de gerar dois discos extraordinários: “Tim Maia Racional, Vol. I” e “Tim Maia Racional, Vol. II”.
Somente por estas duas obras-primas, os fãs do cantor carioca já teriam que agradecer para o resto dos dias, século seculorum, amém.
Mas o que seria uma religião OVNI, perguntaria o leitor. Seja o leitor crente ou descrente.
Uma religião OVNI é qualquer corrente mística baseada na crença em extraterrestres. Os adeptos botam fé nos ETs como criaturas empenhadas no “bem-estar da humanidade”.
Cerca de mil livros da coleção “Universo em desencanto”, publicada entre outubro de 1935 e junho de 1990, dão o lastro teórico para os adeptos. Por este motivo, o principal mandamento é a inscrição “leia o livro”, como vemos pichada em muros — sim, tenho visto, de novo, as mensagens nos muros de cidades de todas as regiões do país.
Os “Racionais” seriam extraterrestres puros e perfeitos que habitariam o “Mundo racional”, plano mais elevado da existência. A cosmologia da turma possui ainda outros três planos: o Astral Superior, habitado por seres que não conseguiram desenvolver por completo o raciocínio e que se manifestam como discos voadores; o plano Astral inferior, habitado pelos seres que não possuem uma “conduta racional” e, para completar, o Astral Térreo, habitado pelos orixás, “o povo do chão e o povo do ar”.
Embora tenha sido fundada na década de 1930, essa religião tornou-se famosa no Brasil apenas durante os anos 1970, quando Tim declarou ter largado as drogas para seguir o líder espiritual Manuel Jacintho Coelho.
Tim Maia largou a crença em setembro de 1975, com apenas dois anos de fé na corrente religiosa. A separação foi pesada.
Segundo o escritor Nelson Motta, biógrafo do artista, o cantor saiu à janela de casa furioso. Pistola mesmo. E começou a gritar para todo o Rio de Janeiro que o “guru” Manoel Jacintho era um pilantra, um ladrão e um tarado que “comia todo mundo”.
Com a saída do grupo místico, Tim Maia renegou os dois discos, que se tornaram preciosidades para a legião de fãs. O médium morreu em 1991, aos 87 anos.
Na busca por novos adeptos, no centro de capital paulistana, a turma da igreja OVNI não toca no nome daquele que um dia foi padroeiro e principal atrativo da causa. Uma ingratidão irracional, diria o próprio Tim.
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