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MPF pede anistia política a João Cândido, líder da Revolta da Chibata

Parecer ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania defende instauração de processo administrativo
09/04/2024 | 05h00

O Ministério Público Federal (MPF) enviou um parecer ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDH) defendendo a instauração de processo administrativo para reconhecer a condição de anistiado político de João Cândido Felisberto, líder da Revolta da Chibata, ocorrida em 1910.

Documento pede reparação e reconhecimento

Falecido devido a um câncer, aos 89 anos, em 1969, João Cândido não recebeu em vida reconhecimento ou anistia do Estado brasileiro. Sua única remuneração foi uma pequena pensão concedida pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul.

O MPF coletou evidências mostrando que a perseguição ao Almirante Negro persistiu ao longo de sua vida, mesmo após a revolta. O documento destaca, segundo o procurador Julio José Araujo Junior, o trabalho da pesquisadora Silvia Capanema, que expõe a perseguição contínua, inclusive durante a ditadura militar.

“A manifestação da coordenadora-geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas, Fernanda Thomaz, elenca uma série de episódios que, ocorridos após 1946, indicam não apenas a omissão prolongada do Estado brasileiro em anistiar o almirante negro, mas também uma atuação proativa em vigiar, perseguir e controlar a vida e o legado de João Cândido”, afirma o responsável pelo parecer.

Escritores também foram perseguidos

O requerimento, enviado em 19 de março, conforme relata o Correio Brasiliense, menciona as contribuições da pesquisadora Silvia Capanema, cujo livro sobre a vida do marinheiro é pontuado.

Segundo ela, o próprio militar teve que intervir junto ao comandante da Marinha, em 1912, quando enfrentava perseguição por oficiais enquanto buscava emprego na Marinha Mercante.

Mesmo após a anistia de novembro de 1910 e sua absolvição no processo do Tribunal Militar, em 1912, João Cândido continuou a sofrer com perseguições da Marinha até os anos 1960.

A pesquisadora ressaltou também que as perseguições se estenderam não apenas ao Almirante Negro, mas também a todos os que escreveram sobre ele.

O biógrafo Álvaro Nascimento menciona que a canção “Mestre-Sala dos Mares” foi vetada durante a ditadura militar por seu conteúdo considerado negativo, pois afirmava se tratar de um “conteúdo esdrúxulo” e “mensagem negativa” por contar da “chibata na Marinha”, “prostituição no cais” e “lutas inglórias”, “do trabalhador do cais e sua negritude sofrida”.

Ainda de acordo com o pesquisador, em 1985, a União da Ilha homenageou João Cândido no Carnaval, mas teve que submeter o planejamento do desfile à censura, afirmando que os eventos do passado não tinham relação com a Marinha atual.

MPF pede título de herói

No parecer, o MPF confirma que João Cândido foi alvo de uma perseguição contínua. “Com sua morte, imaginava-se que a perseguição cessaria. Contudo, isso não ocorreu. Com o auxílio de Álvaro Nascimento, foi possível acessar documentos que indicavam não haver disposição da ditadura civil-militar em parar com o silenciamento sobre a história da Revolta da Chibata”.

O procurador Julio José ressalta a importância de analisar o pedido de reparação da família do marinheiro para “afastar de uma vez os obstáculos que impedem a sua inscrição no panteão dos Heróis da Pátria”, acrescenta.

Quem foi João Cândido?

O militar João Cândido Felisberto, conhecido como “Almirante Negro”, liderou a Revolta da Chibata em novembro de 1910, no Rio de Janeiro. O movimento teve como objetivo acabar com os castigos corporais violentos impostos pela Marinha aos marinheiros, a maioria dos quais negros, em um período logo após a abolição da escravatura.

Sob a liderança de João Cândido, oficiais da Marinha (em geral negros) manifestaram contra as chibatadas aplicadas como castigo

Sob a liderança de João Cândido, oficiais da Marinha (em geral negros) manifestaram contra as chibatadas aplicadas como castigo. Foto: Reprodução

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