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Juliana Dal Piva

Formada pela UFSC com mestrado no CPDOC da FGV-Rio. Foi repórter especial do jornal O Globo e colunista do portal UOL. É apresentadora do podcast "A vida secreta do Jair" e autora do livro "O negócio do Jair: a história proibida do clã Bolsonaro", da editora Zahar, finalista do prêmio Jabuti de 2023.

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Mauro Cid tem ‘preocupação’ com retaliação dos bolsonaristas, diz advogado

Cezar Bittencourt, responsável pela defesa do ex-ajudante de ordens da Presidência, é o entrevistado da sessão cinco perguntas
30/04/2024 | 05h01

Por Karla Gamba

Pouco mais de um mês depois de voltar para a prisão por ordem do Superior Tribunal Federal (STF) em função do vazamento de áudios em que dizia ter sido coagido a delatar, o tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens e braço-direito do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), se sente “um pouco deprimido” por ter fala sobre o ex-chefe na colaboração premiada e vê sua família manifestar “preocupação” com uma possível retaliação de Bolsonaro e seus apoiadores, afirma Cezar Bittencourt, seu advogado de defesa.

Em entrevista à coluna, o defensor de Cid diz que seu cliente só contou a verdade e alega que a minuta de decretação de estado de sítio encontrada no escritório de Bolsonaro — parte central da trama golpista investigada pela Polícia Federal — é “ridícula como conteúdo”.

Ele admite, porém, que o documento era um “esboço de uma ideia que precisava ser trabalhada”. Provas colhidas pela PF corroboram que a discussão em torno da minuta era parte central da tentativa de articular um golpe de Estado para reverter o resultado da eleição de 2022 e manter Bolsonaro no poder.

O defensor diz que a família de Cid tem sofrido com sua volta à prisão — ele está detido a 200 metros da casa onde sua família vive, em uma área militar. O pai do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o general Mauro Cesar Lourena Cid, é acusado de participar do esquema de venda de joias presenteadas ao Estado brasileiro por autoridades sauditas.

Além de aparecer em uma foto usada para vender uma das joias, a investigação da PF reuniu evidências de que o general Lourena Cid usou a própria conta bancária para receber valores oriundo da venda dos itens desviados. Foram encontradas mensagens de Cid afirmando que o seu pai estaria com US$ 25 mil que poderiam ser entregues a Bolsonaro, em mãos.

Como ficou a relação do tenente-coronel Mauro Cid com o ex-presidente Jair Bolsonaro? Nos últimos meses falou-se muito sobre uma suposta preocupação dele em ser visto como traidor.

Cezar Bittencourt: Ele foi assessor, não empregado do presidente. Ele era um assessor designado pelo Exército. E como assessor o Cid se saiu muito bem, como é do seu feitio e da sua competência. A relação que ele tinha com o presidente era muito boa, de muita confiança. Então Cid se sentiu um pouco deprimido por ter que falar determinados fatos que ele não gostaria de falar. Mas na investigação não tem economia interna, tem que trazer o que sabe, falar o que aconteceu.

A gente trabalha com a realidade dos fatos, com o que a gente produz nos autos, e nada mais. Não nos importamos com o Bolsonaro. Ele cuida da defesa dele da melhor forma possível, tem bom defensor, e segue a vida.

Existe algum temor da família Cid de que possa haver retaliação por ter delatado, seja por parte do ex-presidente, de autoridades que foram mais comprometidas ou até de apoiadores do ex-presidente?  

Temor não é bem o termo, mas sim preocupação. Uma preocupação não posso dizer que não existe, ela existe. Mas não existe um temor do que pode acontecer.

Não há nada pessoal contra o presidente, mas infelizmente os fatos aconteceram. Estão aí, e a Justiça vai julgar. A defesa trabalha com a consciência tranquila, com segurança, sem temer retaliação. Mas não houve nenhuma pressão, nenhum recado que o presidente Bolsonaro possa ter mandado contra o Cid ou a defesa dele. Então, nesse sentido, o presidente Bolsonaro não tomou nenhuma medida. Seja contra a família do Cid, contra o Cid ou não contra a defesa do Cid.

O senhor acompanhou seu cliente em todos os depoimentos para a colaboração premiada. Existe uma especulação sobre as afirmações de Mauro Cid sobre o papel de Jair Bolsonaro nos episódios que estão sendo investigados. Na suposta tentativa de golpe, por exemplo, afinal, o que ele relata sobre o nível de envolvimento de Bolsonaro com a minuta, os encontros com outros comandantes para planejar o golpe, como consta no relatório da PF?

Eu nem me lembro direito. Aquela tal minuta é ridícula como conteúdo, como texto para elaborar um artigo de qualquer lei. Digamos que foi um esboço de uma ideia que precisava ser trabalhada. Aquilo para nós é irrelevante.

Como a família de Cid tem encarado a volta dele para a prisão? Eles têm o visitado com frequência?

Evidentemente que, como qualquer família, eles sofrem muito. Aliás, a família sofre mais do que o próprio indivíduo. Tem o pai e a mãe dele, que estão mais tempo aqui em Brasília que no Rio de Janeiro. Praticamente se mudaram para cá [Brasília]. Os pais fazem visitas semanais. A esposa também visita semanalmente. E eles compartilham as angústias. É um calvário, mas isso acontece em todo processo. Cid sempre foi o primeiro da lista em todas as promoções possíveis, em todos os empreendimentos no crescimento da carreira.

O pai dele, o general Mauro César Lourena Cid, tem algum receio de ser alvo com o avanço das investigações? Vocês já conversaram sobre isso?

Já conversamos a respeito. Em tese, sempre há uma preocupação do que fazer, do que não fazer e como fazer. Mas todo mundo sabe e está muito claro, em relação à foto, por exemplo, de uns presentes que o presidente Bolsonaro recebeu lá no Oriente Médio, é fato público e notório que aqueles presentes são de pequeno valor. Então não tem nenhum receio dele responder por isso.

Ele já foi ouvido pela Polícia Federal, e é normal que seja ouvido porque a polícia precisa colher provas, mas nós estamos tranquilos. Ele, a família, eu, que sou seu defensor também, estamos tranquilos que não tem nada a repercutir negativamente em termos de crime contra o general Cid.

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