Que os leitores mais sensíveis desculpem o palavrão no título. Nada mais adequado ao protagonista deste texto.
Praticamente impossível algum usuário de redes sociais não ter visto nos últimos dias o vídeo gravado em dezembro de 2020 no qual o então presidente Jair Bolsonaro, sentado ao lado do filho 03, Eduardo, fez o pedido esdrúxulo:
“Me chama de corrupto, porra!”
O desafio foi anunciado com um sorriso largo, quase pornográfico, daqueles que combinam com quem acredita na impunidade absoluta e no fanatismo de seus seguidores. Voltou a circular agora, por causa do escândalo da apropriação das joias da Presidência.
Bolsonaro já tinha feito esse mesmo pedido na campanha presidencial de 2018 e também depois de assumir o cargo. A intenção era se apresentar como contraponto a Lula e outros petistas, a quem o líder da extrema direita brasileira chama de “ladrões”.
O curioso é que na época do vídeo Bolsonaro já estava às voltas com as acusações de rachadinha praticada nos mandatos de deputado federal. Uma das personagens envolvidas entrou até para o folclore político: Val do Açaí, aquela senhora lotada no gabinete de Bolsonaro, em Brasília, que nunca saiu de Angra dos Reis, no Rio Janeiro — a cidade fica a 1.200 quilômetros do DF.
Qualquer sujeito com um mínimo de decência consegue reconhecer que roubar dinheiro público destinado a pagar servidores do Legislativo é corrupção deslavada. Mesmo assim, Bolsonaro se sentiu à vontade para se autodenominar honesto.
Essa estranha noção de honestidade resistiu até mesmo às acusações de seu ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, que ao deixar o governo chutou o balde e contou à imprensa que Bolsonaro manipulou a Polícia Federal para proteger o filho Flávio, acusado de… rachadinha.
Nada disso parece pesar na consciência do então presidente quando ele sorri no vídeo e convida:
“Me chama de corrupto, porra!”
Agora, quase quatro anos após a gravação dessas imagens, temos acesso aos detalhes do inquérito em que a PF detalha vergonhosas mutretas de Bolsonaro. Segundo os investigadores, as manobras que o ex-presidente e sua trupe fizeram para se apropriar ou vender joias que são da União resultaram em desvios de itens no valor de R$ 6,8 milhões. Pode ser mais.
Dessa vez, Bolsonaro não está tão sorridente.
Tem recorrido à surrada versão de que é alvo de perseguição. A abundância de provas, no entanto, não deixa espaço para chorumelas: cada vez que um dos antigos auxiliares do ex-presidente comenta o caso ele se afunda um pouco mais.
Dinheiro vivo pra lá; dinheiro vivo pra cá; as joias da Presidência vendidas em espelunca nos Estados Unidos; o advogado que foi recomprar o Rolex escondido atrás de um poste; a ridícula foto do general refletido na embalagem da escultura que seria vendida; conversas em aplicativo de mensagem… está tudo no inquérito.
É preciso reconhecer, já passou da hora de aceitar o convite que o Mito tem feito esses anos todos. Vamos tratá-lo da forma que ele merece e pede.
Políticos, seguidores e imprensa, usem com o ex-presidente o adjetivo correto.
A palavra exata, que o próprio sugeriu.
Ou seja:
Chamem Bolsonaro de corrupto, porra!
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