ICL Notícias

Por Nicolás Satriano

Depois de serem perseguidos no governo de Jair Bolsonaro, profissionais que se dedicam a analisar projetos do Ministério da Cultura (MinC) não estão tendo vida fácil também na gestão de Lula. Eles cobram condições de trabalho justas e regularidade nas remunerações.

Os pareceritas — que são responsáveis por, entre outras tarefas, emitir pareceres de projetos submetidos à Lei Rouanet — redigiram uma carta aberta dirigida à ministra Margareth Menezes para denunciar falta de transparência na contratação e atrasos em pagamentos.

Conforme explicam na carta, os pareceristas são peritos credenciados para fazer a análise de projetos culturais. Eles elaboram pareceres que envolvem a viabilidade das propostas, se economicamente os projetos podem ser aprovados e se estão adequados à legislação. Os profissionais não têm vínculo empregatício com o MinC e a remuneração deles é por cada serviço prestado à pasta.

“Desempenhamos papel essencial na tramitação das propostas culturais submetidas à aprovação no âmbito da Lei Rouanet”, ressaltam.

Em nota, o Ministério da Cultura informou que apenas 20% não foram pagos, mas serão quitados até o final de novembro. “Os pareceres elaborados a partir de abril de 2023 estão sendo pagos em prazos menores. Mensalmente, o MinC está realizando pagamentos a 190 pareceristas, envolvendo em média 2.800 pareceres, totalizando R$ 108 mil”

PRECARIZAÇÃO COM BOLSONARO

O desabafo dos pareceristas é motivado por um histórico de descasos com a categoria. Eles reclamam, principalmente, de receber “pouca ou nenhuma atenção por parte dos gestores da Cultura”, em diferentes governos.

Entretanto, a situação se deteriorou principalmente durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Foi quando houve a extinção do Ministério da Cultura, que causou um “apagão” administrativo e, claro, também prejudicou os pareceristas.

(Foram tomadas) Medidas de implosão do próprio MinC, com redução de secretarias, com a concentração de poder, na época [de Bolsonaro], com o Mario Frias [ex-secretário de Cultura] e, finalizando esse processo que nós estamos hoje, o mais grave, o final do CNIC [Comissão Nacional de Incentivo à Cultura], que é o conselho nacional de cultura, que é o responsável pela aprovação dos projetos analisados”, afirmou ao ICL Notícias o parecerista Marcus Gatto.

Segundo Gatto, na época de Frias à frente da Cultura também houve retaliações de profissionais que apresentavam queixas ou pleiteavam alguma melhoria para a categoria. “Essa atitude gerou um medo generalizado. Porque, afinal de contas, já estávamos entrando no processo pandêmico. E era uma forma de garantir algum recurso. Todo mundo ficou muito temeroso de ser vetado”, acrescentou.

Fachada do Ministério da Cultura. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

VOLTA DO MINC E FRUSTRAÇÃO

“A volta do MinC trouxe a esperança de melhorias, mas, lamentavelmente, continuamos a constatar a completa falta de respeito e reconhecimento para com os profissionais envolvidos nesta atividade”, diz a carta aberta da categoria.

Os profissionais afirmam que, mesmo com a mudança de governo, na maioria dos casos eles trabalham “no escuro completo”. São, ao menos, seis as queixas referentes à falta de informações que segundo os pareceristas deveriam ser prestadas pelo MinC:

  • pagamentos;
  • tramitação de projetos;
  • instruções sobre questões legais e procedimentos administrativos;
  • distribuição de análises;
  • capacitação;
  • e modelos de pareceres.

Segundo a categoria, também não há qualquer resposta do MinC quando eles tentam contato com a pasta. Eles classificam como “crítico” o tema dos pagamentos atrasados, argumentando que profissionais estão anos à espera de receberem as remunerações devidas.

“Centenas de profissionais aguardam por anos para receber pelos serviços realizados. E não se trata apenas de pendências herdadas do governo anterior, há uma considerável quantidade de pareceres emitidos desde o início deste ano sem previsão de pagamento, vários meses após sua emissão.”

POUCOS AVANÇOS APÓS REUNIÃO

Segundo a carta e relato do parecerista Marcus Gatto ao ICL Notícias, os problemas foram apresentados ao secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural do MinC, Henilton Menezes, em maio deste ano. Os profissionais afirmam que na reunião ouviram várias promessas e um apelo para que eles tivessem “paciência”. Ainda assim, meses depois, segundo eles, pouco avançou.

“A comunicação com este ministério, suas secretarias e entidades vinculadas continua deficiente e permanecem sem solução as questões levadas ao secretário de Fomento. Muitos de nós já consideram o descredenciamento ou a recusa de novas análises, o que pode prejudicar diretamente o mecanismo de fomento à cultura”, diz o comunicado.

O texto também alerta que os riscos de o ministério ficar sem pareceristas não afetam só os projetos ligados à Lei Rouanet, mas também outros mecanismos de fomento à cultura em todo o Brasil. Atualmente, dizem os profissionais, os editais têm remunerações “irrisórias” para um volume “significativo” de trabalho.

SECRETÁRIO RESPONDE EM REDE SOCIAL

Na rede social LinkedIn, o secretário Henilton Menezes respondeu a publicação do parecirista Marcus Gatto. Menezes disse que o atual governo herdou um “programa caótico” e “semi-destruído”. Ainda segundo o secretário, o edital referente à contratação dos pareceristas estava vencido e havia atrasos “injustificáveis de pagamentos”.

O secretário também confirma que na gestão anterior houve “desligamentos aleatórios”, peritos sem treinamento e “entre outros problemas”. “Nossas soluções podem não chegarem no tempo que os senhores e senhoras desejam, mas estamos fazendo o possível, dentro da segurança que nos é necessária”, disse Menezes.

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