Por Isabel Palhares
(Folhapress) — O desembargador Figueiredo Gonçalves determinou a suspensão da lei que criou as escolas cívico-militares em São Paulo. O programa foi criado e sancionado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) em maio deste ano.
A decisão liminar atende um pedido da Apeoesp (sindicato dos professores da rede estadual de São Paulo). Segundo o desembargador, que é relator do caso, a lei deve ficar suspensa até que o STF (Supremo Tribunal Federal) julgue ação que questiona constitucionalidade do modelo.
A reportagem procurou a Secretaria Estadual de Educação para comentar a decisão, mas não teve resposta.
Assim que a lei foi sancionada por Tarcísio, o Psol ingressou com uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no STF contra o modelo. O partido defende que o programa do governo paulista fere as constituições federal e estadual, além da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Desembargador: suspensão
Na decisão proferida nesta terça-feira (6), Gonçalves determinou que a lei fique suspensa até o julgamento no STF. O ministro Gilmar Mendes é o relator da ação.
“Não se cuida, desde já, de se impor a interpretação acerca da inconstitucionalidade da lei estadual que se questiona nesta ADI. Contudo, inegavelmente, há a controvérsias sobre o bom direito, que justifica a cautela neste instante, para que se defira a liminar reclamada, até decisão definitiva sobre o tema”, diz o desembargador na decisão.
Ainda de acordo com a decisão, a suspensão é necessária para “evitar eventuais prejuízos pela instituição do programa”.
Em cerca de 300 escolas estaduais paulistas, os diretores manifestaram interesse prévio ao modelo. Pelo cronograma da Secretaria Estadual de Educação, as unidades têm até o próximo dia 15 para promover uma consulta a alunos, pais e professores sobre a adesão.
Polêmicas
Uma série de polêmicas têm ocorrido nas escolas estaduais desde que o governo Tarcísio abriu o processo para a seleção das unidades que serão as primeiras a receber o modelo.
Em ao menos duas unidades os alunos se mobilizaram para que fosse retirada a intenção de adesão. É o caso das escolas estaduais Vladimir Herzog, em São Bernardo do Campo, e da escola Conceição Neves, em Cotia. Os estudantes argumentaram que os diretores não explicaram o motivo de terem demonstrado interesse sem consultar a comunidade escolar.
O diretor de uma escola na capital paulista também foi afastado do cargo após enviar um comunicado aos professores orientando que eles não podem expressar publicamente seu ponto de vista sobre a adesão ao modelo. No documento, a direção da escola Guiomar Rocha Rinaldi diz que os profissionais devem apenas reproduzir as informações oficiais repassadas pela pasta.
Professores e especialistas também têm criticado as regras definidas pela secretaria para a consulta. Eles afirmam que não é possível auditar a votação. Dizem ainda que a maioria dos alunos que serão afetados com o modelo não terá direito ao voto direto, que são os menores de idade.
Ação de inconstitucionalidade
Além da ADI que questiona o modelo cívico -militar em São Paulo, o STF também analisa outra ação contra a militarização de escolas públicas no país. Impetrada em 2021 por PT, PSOL e PCdoB, a ação questiona a legalidade da lei estadual paranaense que criou essas escolas. A ação segue sem uma decisão há quase três anos.
O ponto considerado inconstitucional por aqueles que questionam o modelo tanto no Paraná como em São Paulo é de que a militarização de uma escola civil não está prevista na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) ou em qualquer outra legislação federal. Por isso, estados e municípios não teriam autonomia para criar seus próprios modelos.
Esse foi o entendimento dos ministros do STF ao definir a inconstitucionalidade de iniciativas locais sobre o homeschooling. O Supremo não considerou que a modalidade de ensino domiciliar é inconstitucional, mas que sua aplicação é de competência legislativa exclusiva da União assim propostas municipais e estaduais acabaram barradas.
Outro ponto que tem sua constitucionalidade questionada é de que o modelo fere o artigo 206 da Constituição Federal, que prevê que o ensino seja ministrado com base nos princípios da “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.”
O programa de escolas cívico-militares é uma das apostas de Tarcísio para manter e ampliar o apoio da base bolsonarista. O governador só passou a prometer o modelo em São Paulo após o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciar o fim do programa nacional de fomento a escolas cívico-militares criado por Jair Bolsonaro (PL).
O governo pretende selecionar 45 escolas para serem as primeiras a adotar o modelo a partir do próximo ano. Essas unidades vão receber policiais militares aposentados que vão desenvolver projetos para trabalhar assuntos como “direitos e deveres do cidadão” e civismo.
Conforme mostrou a Folha de S.Paulo, os PMs aposentados vão receber um adicional de até R$ 6.034 — valor que é 13% superior ao piso salarial dos docentes em São Paulo.
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