Por Luiz Augusto Erthal — Toda Palavra
Em estudo inédito acerca do chamado “efeito milícia” sobre os resultados eleitorais na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, baseado nos dados apurados pelo TSE e pelo TRE-RJ nas eleições de 2022, pesquisadores do Observatório das Metrópoles concluíram que as chapas encabeçadas pelo então presidente Jair Bolsonaro e pelo ainda hoje governador Cláudio Castro, ambos candidatos à reeleição naquele momento, obtiveram votações significativamente mais expressivas nos territórios controlados por facções milicianas, em relação às outras áreas da capital fluminense.
Mesmo perdendo a faixa presidencial para o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, sobretudo diante das votações maciças do petista nos estados do Nordeste, Bolsonaro obteve, no primeiro turno, 53,1% dos votos nas regiões controladas pelas milícias cariocas (3,2% a mais do que a sua média de votos em todo território metropolitano). Os pesquisadores também dividiram as regiões por níveis de controle exercido pelos milicianos e estabeleceram uma tendência de crescimento de desempenho de Bolsonaro dentro de uma escala que apurou suas votações nas áreas de baixo controle (51,4%), médio controle (52,4%) e alto controle (53,1%) dos criminosos.
Cláudio Castro, cujo atual governo enfrenta possivelmente a maior crise da segurança pública no Estado do Rio, foi ainda mais longe: chegou a ter 59,3% dos votos em áreas de milícias (4,3% a mais do que na média). As constantes trocas no comando da segurança pública do estado e atentados milicianos como o que recentemente incendiou mais de 30 ônibus na Zona Oeste da cidade, demonstram, em contrapartida, a flagrante impotência e incapacidade do governador em combater as milícias que dominam as regiões onde ele obteve suas votações mais importantes.
Conduzido pelos professores Orlando Alves dos Santos Junior, Filipe Souza Corrêa e Juciano Martins Rodrigues, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ), o estudo cruzou os dados do TSE/TRE com os levantamentos dos mapas das milícias feitos pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (GENI) e pelo Instituto Fogo Cruzado e constatou, ainda, a mesma tendência preferencial pelos candidatos de direita e conservadores a senador e deputados federal/estadual nas áreas sob ocupação miliciana.
De acordo com os pesquisadores, o estudo, realizado ainda no ano passado, “permite dizer que as áreas controladas por esses grupos apresentaram certas tendências políticas diferenciando-se do restante da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Nessas áreas, os candidatos conservadores e suas coalizões políticas, liderados pelo atual [ex] presidente Jair Bolsonaro, receberam proporcionalmente mais votos do que nas demais áreas da metrópole”. A pesquisa completa pode ser lida em https://www.observatoriodasmetropoles.net.br/voto-e-milicia-as-eleicoes-de-2022-na-regiao-metropolitana-do-rio-de-janeiro/.
REPRISE DE 2018
Estudo semelhante foi publicado pelo Toda Palavra em fevereiro de 2019, dois meses após a posse do então presidente Jair Bolsonaro, que obteve, da mesma forma que seu filho 01, o também eleito senador Flávio Bolsonaro, as suas maiores votações em metade das 20 zonas eleitorais que haviam sido mapeadas pela Polícia Civil, a pedido do TRE, por estarem localizadas em regiões sob influência política das milícias.O levantamento foi feito pelo cientista social e jornalista – especializado em jornalismo de dados – Fábio Vasconcellos.
A matéria do jornal também registra que, a dois meses das eleições de 2019, o coordenador da fiscalização de propaganda do TRE-RJ, juiz Mauro Nicolau Júnior, manifestara a sua preocupação com a participação do crime organizado no pleito. Falando a jornalistas no dia 2 de agosto daquele ano, ele disse que cerca de 2 milhões de eleitores votam em áreas consideradas de risco na região metropolitana fluminense. São locais cujas zonas eleitorais têm algum tipo de ameaça à segurança pública, como a atuação de milícias e outras organizações criminosas.
“É um número bastante significativo e que decide qualquer eleição”, declarou o magistrado, deixando claro que a atividade criminosa eleitoral se dava em todos os níveis de cargos eletivos.
O então ministro da Justiça, Torquato Jardim, também havia confirmado essa ameaça à democracia brasileira um ano antes das eleições, ao participar do seminário “Eleições 2018: a democracia em debate”, organizado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Segundo anunciou àquela época, a força do crime organizado em comunidades e favelas do Rio de Janeiro, incluindo o tráfico de drogas e milícias, seria um desafio a ser enfrentado no pleito que se aproximava.
“No Rio de Janeiro, o crime organizado está livre para eleger quem quiser. Já está mapeado no TRE daqui, nas 850 zonas de conflito dentro das comunidades cariocas, quais são as seções eleitorais e quem ganha mais votos naquelas seções. Isto está documentado, é desafio para os serviços de segurança, para as eleições no ano que vem, no Brasil e no Rio de Janeiro em particular”, afirmou o ministro em seminário realizado no dia 6 de outubro de 2017, no Rio.
Procurado na época pelo Toda Palavra, o TRE-RJ confirmou, através de sua assessoria de comunicação, a existência do levantamento, mas negou acesso às informações, alegando serem de caráter sigiloso.
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