No comando do Ministério da Justiça, Flávio Dino iniciou um eficiente trabalho de combate ao crime organizado com o rastreio e bloqueio da grana das quadrilhas.
Agora no STF, Dino conseguiu, com uma só canetada, brecar as “emendas PIX”, uma farra sob o comando de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, que pode levar, inclusive, ao enriquecimento ilícito de parlamentares. Fora do planejamento da União, essa dinheirama não tem menor controle, voa ao deus-dará.
O breque de Flávio Dino foi aprovado no Supremo por 11×0. Obrigou a um paralisação imediata na derrama das emendas impositivas.
Um acordo entre o STF, Congresso e governo federal decidiu que, daqui pra frente, as emendas deverão respeitar critérios de transparência, rastreabilidade e correção. Caiu o modelo “imoral, ilegal ou engorda” criado por Eduardo Cunha e turbinado por Arthur Lira.
Um modelo que lembrava os tempos do escândalo d´Os Anões do Orçamento. Ah, isso daria uma série extraordinária na tv. Um dos chefes do esquema mandou matar a própria mulher e sumir com o corpo. Para explicar uma montanha de US$ 50 milhões, o deputado João Alves disse que era “um homem de sorte” que ganhou 200 vezes na loteria. Sentiu o drama?
Como dizia o velho repórter e contador de histórias Goulart de Andrade, vem comigo.
Enterrada viva, depois de um sequestro forjado pelo próprio marido, a morte da funcionária pública Ana Elizabeth Lofrano acabaria revelando um dos maiores escândalos de corrupção de Brasília. José Carlos Alves dos Santos, assessor especial da Comissão de Orçamento do Congresso, contratou dois bandidos para a matar a própria mulher, no dia 19 de novembro de 1992, depois de jantar romântico em um restaurante na Asa Norte da capital federal.
Ana Elizabeth havia descoberto que o marido escondia cerca de US$ 1 milhão em casa, dinheiro dos Anões do Orçamento, um esquema de desvio dos recursos públicos por intermédio de parlamentares, prefeitos e organizações sociais.
O desaparecimento da funcionária do Ministério da Educação seguiu como mistério até novembro de 1993, quando a polícia do DF encontrou uma ossada na cidade satélite de Planaltina. O detetive particular Lindauro da Silva e o mecânico José dos Santos confessaram a autoria do crime por encomenda.
Preso, Alves dos Santos culpou os deputados do esquema de fraudes pela morte da mulher. Não conseguiu, porém, se livrar da condenação — a sentença a 20 anos de cadeia aconteceu em 1997. Nesse período, a polícia revelou até as orgias do assessor do Congresso, detalhes da relação com a amante e toda a luxúria bancada com dinheiro da corrupção.
Entre os deputados, o comandante do esquema dos Anões do Orçamento foi o baiano João Alves, na época da legenda PPR. Ao ser flagrado na roubalheira, disse que era milionário por ter acertado 200 vezes em loterias — 53 vezes apenas em 1992. “Deus me ajudou e eu ganhei muito dinheiro”, afirmou. Por causa do “milagre”, ganhou o apelido de João de Deus.
As desculpas do homem mais sortudo do Brasil não impediram a instalação da CPI do Orçamento, a segunda comissão parlamentar de inquérito da Nova República – a primeira foi a CPI de PC, que em 1992 investigou Paulo César Farias, o ex-tesoureiro de campanha do então presidente Fernando Collor de Mello, alvo de impeachment por causa destas investigações.
João Alves, o homem que acumulou US$ 50 milhões, foi parlamentar federal desde 1963. O esquema de fraudes com emendas do orçamento começou a ser articulado ainda 1972, durante a Ditadura Militar. Os outros seis anões do grupo eram os deputados Genebaldo Correia (PMDB-BA), Manoel Moreira (PMDB-BA), Ubiratan Aguiar (PMDB-SP), José Carlos Vasconcellos (PRN-PE), José Geraldo Ribeiro (PMDB-MG) e Cid Carvalho (PMDB-MA) – embora a participação de Vasconcellos e Aguiar tenha sido refutada durante as investigações.
O rótulo de anões devia-se ao time pertencer ao “baixo clero”, divisão da Câmara que abriga os políticos de menor expressão ou importância nos debates em plenário. Uma reportagem da “Folha”, porém, mostrou que o grupo ficou assim conhecido porque nenhum dos sete integrantes tinha mais de 1,62 de altura.
Em 2006, a morte de Ana Elizabeth Lofrano, que desencadeou o caso dos anões do orçamento, serviu de inspiração para o filme Brasília 18%, de Nelson Pereira dos Santos. Vale agora, em tempos de Netflix, um seriado policial para recontar essa saga.
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