Amanda Miranda — Newsletter Passando a Limpo
A 2ª Turma Recursal do juizado especial de Santa Catarina censurou uma postagem do jornalista Leonel Camasão sobre um caminhão com drogas apreendido pela Polícia Federal, que à época seria de propriedade da família do senador bolsonarista Jorge Seif (PL-SC). O conteúdo foi publicado em abril de 2023, repercutindo uma notícia de um veículo local que não chegou a ser processado pelo senador. A publicação ainda está no ar, pois cabe recurso.
Camasão, que hoje é candidato a vereador em Florianópolis pelo PSOL, também foi condenado a pagar R$ 6 mil a Seif. Sua defesa irá recorrer.
Em dezembro do ano passado, o juiz substituto Yves Luan Carvalho Guachala havia negado tanto o pedido de censura quanto a indenização de R$ 10 mil solicitada pelo senador. Na sentença, o magistrado dizia que “a liberdade de expressão em sentido amplo é um direito fundamental” e considerava que a informação repercutida pelo jornalista é “proveniente tanto do meio jornalístico como de ato de autoridade pública, o que afasta um intuito deliberado de ofender despropositadamente”.
No acórdão da 2ª Turma Recursal, no entanto, assinado no dia 27 de agosto, a magistrada Margani de Mello destaca que a liberdade de expressão não isenta cidadãos de responderem pelos seus atos se demonstrada “vontade deliberada de expor e ofender a intimidade, a honra, a vida privada e/ou a imagem do ofendido”.
No voto, ela afirma que a notícia que baseou a postagem de Camasão “tem estrito conteúdo informativo”, mas que a interpretação e difusão pelo jornalista “evidencia já pelo título o nítido caráter sensacionalista, buscando induzir seus seguidores a associar a prática do crime de tráfico à pessoa do postulante”.
Postagem reproduziu notícia sobre veículo que seria da família de Seif
Na postagem, o jornalista descreve o conteúdo da notícia, inclusive destacando a defesa do próprio senador, que negou ser proprietário do caminhão apreendido e afirmou que o veículo teria sido vendido no ano anterior.
“Eu não sou o autor da reportagem e a notícia saiu em todos os portais locais e nacionais. Estranhamente, só eu fui processado, talvez por ser militante do PSOL e alvo de assédio judicial de diversos bolsonaristas”, afirmou o jornalista na rede X. Ele é processado pelos bolsonaristas Luciano Hang e Julia Zanatta por outras postagens.
“Em nosso entendimento, a decisão vai contra precedentes do Supremo Tribunal Federal sobre as liberdades de expressão e de comunicação jornalística, viola tratados internacionais que o Brasil é signatário e viola, ainda, precedentes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, afirma,
Camasão se refere a discussões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que apontam que não se deve responsabilizar quem reproduz, de boa-fé, informações já publicadas por outros veículos e que sejam de interesse público.
Na década de 1990, após a condenação de um jornalista que repercutiu no seu país informações sobre condutas ilegais de um diplomata que estavam sendo veiculadas na imprensa europeia, a corte definiu que a prática era incompatível com a liberdade de expressão, pois a ele não cabia provar a verdade daquilo que já era divulgado por outros.
Nas suas redes sociais, o senador Jorge Seif costuma tratar da pauta da liberdade de expressão como uma bandeira do seu mandato. Em novembro de 2023, registrou vídeo na Rede X dizendo estar nos Estados Unidos para denunciar “violação da nossa liberdade de expressão”, consideradas por ele “ameaça real” à democracia e Constituição Federal. Além disso, chamou de censura um pedido de investigação da Advocacia Geral da União com base em declarações de Alexandre Garcia durante as enchentes do Rio Grande do Sul.
“Iremos acionar todas as instâncias possíveis para reverter o que consideramos um erro e uma injustiça não apenas contra mim, mas contra todos os jornalistas do país”, finalizou Camasão.
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