A ideia era publicar apenas informações positivas, em contraponto à onda de violência que vivia o país; naquele momento, a população estava chocada com o sequestro da filha de Silvio Santos e a invasão da casa do apresentador.
A intenção era das melhores, mas o “Dia da Boa Notícia” não durou nem mesmo até o final do café da manhã. A ideia surgiu como marketing do portal iG, em contraponto a uma escalada de violência urbana e insegurança pública, em 2001.
O noticiário estava dominado pelo horror. Patrícia Abravanel, filha de Silvio Santos, havia sido sequestrada. O país seguia o caso no maior suspense. Quando Patrícia foi liberada do cativeiro, em vez do alívio, mais tensão: o mentor do sequestro, Fernando Dutra Pinto, invadiu a mansão do dono do SBT. A vida do homem mais popular da televisão brasileira esteve sob risco.
Foi este massacre de notícias desagradáveis que motivou o publicitário Nizan Guanaes, um dos acionistas do iG, a idealizar a ação. A data foi escolhida aleatoriamente, com base num prazo estabelecido em uma reunião de editores — cerca de um mês antes, para que a equipe produzisse reportagens em tom “alto astral”.
Na lista de pautas otimistas, matérias ecológicas sobre reciclagem de lixo, soluções sustentáveis para as grandes metrópoles e acervos de filmes antigos, por exemplo. Tudo muito romântico, para contrapor o festival de horrores.
A diretoria do portal, no entanto, deu azar ao escolher o 11 de Setembro de 2001 para o “Dia da Boa Notícia”.
Como adivinhar que justamente naquela data o mundo viveria o pesadelo dos atentados contra as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova Iorque, e contra o Pentágono, em Washington?!
Pouco antes da meia-noite do 11/09, o portal manteve-se firme na sua ação publicitária ao não incluir na primeira página uma notícia bombástica: o assassinato do prefeito de Campinas, Toninho do PT.
O caso, com imensa repercussão política, foi manchete principal em todos os portais e jornais do Brasil. Menos no iG, que segurava a sua onda de otimismo.
O “Dia da Boa Notícia” ainda se manteve em pé mesmo depois da primeira colisão contra as Torres Gêmeas, às 9h46 de Brasília.
Às 10h03, quando o segundo edifício foi alvejado, a editora Carina Martins, responsável pela página, decidiu contrariar o projeto e publicar o acontecimento. Era impossível segurar o “otimismo” sobre o universo em desencanto.
Entre 1991 e 2006, a Folha de S. Paulo manteve seção “Boa Notícia”, com a obrigação de publicar diariamente uma nota positiva na capa do jornal. Era uma missão duríssima para os editores cumprir essa cota de esperança na humanidade.
Como sofriam meus colegas de redação com essa tarefa digna da Pollyanna (moça) e o seu jogo do contente. Recordo, especialmente, do esforço de reportagem do amigo Mauricio Stycer. Torcer pelo Botafogo (seu destino) exigia muito menos àquela altura.
Notícia boa não vende jornal. Vale a velha máxima criada desde a primeira tiragem da prensa de Gutenberg. Noves fora os triunfos de times populares, como Flamengo e Corinthians, alegria não dá ibope.
O tema nos leva aos piores tempos do país. Era uma vez um ditador sanguinário que amava as suavidades televisivas. No auge da censura e da tortura no Brasil, o general-presidente Emílio Garrastazu Médici (de 1969 a 1974 no poder) fazia uma louvação ao jornalismo da TV Globo:
“Me sinto feliz todas as noites quando ligo a televisão para assistir o Jornal Nacional. Enquanto o noticiário fala em greves, atentados, conflitos e tumultos em vários países do mundo, o Brasil marcha em paz rumo ao desenvolvimento. É como se eu tomasse um tranquilizante após um dia de trabalho”.
Boa noite (com voz ainda de Cid Moreira). Cronicamente inviável, até a próxima.
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