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No PR, gestão privada de escolas faz 2 anos com perda de concursados

Sindicato questiona custos, e educador demitido relata pressão para aprovar alunos
24/11/2024 | 11h34

(Folhapress) – No Paraná, o modelo de escola pública administrada por empresas privadas completa dois anos em dezembro. Implementado pela gestão do governador Ratinho Junior (PSD), a política funciona em caráter experimental em duas escolas da rede estadual, em Curitiba (Colégio Estadual Anibal Khury Neto) e São José dos Pinhais (Colégio Estadual Anita Canet), desde o início de 2023.

Tanto a Secretaria da Educação quanto as empresas afirmam que a parceria está dando certo. “O modelo de gestão trouxe melhorias em áreas como manutenção, logística e processos operacionais”, diz a pasta, que mantém a ideia de expandir a proposta para mais de 200 escolas no ano que vem.

Gestão privada de escolas

O programa Parceiros da Escola foi elaborado em 2022, quando Renato Feder era o secretário de Educação.

Em janeiro de 2023, quando o teste foi implementado nos dois colégios, Feder assumiu a mesma pasta em São Paulo. O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) deu largada neste ano ao seu projeto de parceria público-privada para administrar serviços de manutenção de 33 novas escolas estaduais.

Programa Parceiros da Escola foi elaborado em 2022, quando Renato Feder era o secretário de Educação

Para críticos da medida, porém, o Paraná não consegue comprovar uma melhoria que seja proporcional ao valor injetado. Também argumentam que a experiência mostrou a impossibilidade de separar as áreas administrativas (de responsabilidade das empresas) das pedagógicas (sob a tutela do estado).

No caso paranaense, os consórcios também são responsáveis pela contratação de professores. Para a APP-Sindicato, entidade que representa os trabalhadores da educação, as empresas preferem lidar com aqueles contratados via CLT do que com os concursados.

As empresas do projeto-piloto recebem R$ 800 por aluno, mensalmente. Para se chegar ao valor, o estado considerou, entre outras coisas, os custos com professor. “Quando um concursado pede para ser transferido, ela [a empresa] pode contratar quem ela quiser para o lugar dele, mas com um salário inicial mais baixo”, afirma a professora Walkiria Mazeto, presidente do sindicato.

Pelo levantamento da entidade, no início eram 26 professores concursados nas duas escolas para 76 contratados via CLT. Agora, seriam apenas 6 concursados e mais 90 contratados pelas empresas.

Balanço do governo é diferente, mas confirma a redução de concursados nas duas unidades. Segundo a secretaria, o colégio Anibal contava inicialmente com 15 professores concursados, mas 3 se desligaram da unidade, optando por trabalhar em outros setores. No colégio Anita, 12 professores concursados saíram de lá –8 profissionais em janeiro de 2023 e mais 4 em janeiro de 2024. Atualmente, a escola tem 7 professores concursados lecionando no local, conforme a estimativa oficial.

As empresas negam pressão para professores concursados pedirem transferência para outras unidades, como tem relatado o sindicato. “A gestão de professores concursados não está entre nossas atribuições. Mesmo os CLTs estão sujeitos à avaliação e decisões da liderança pedagógica”, diz Cesar Cunha, diretor-executivo da Tom Educação, que atua no Anibal.

“A movimentação dos concursados não está entre nossas atribuições, cabendo a nós apenas a parte burocrática”, diz Isaac de Paula Carvalho, diretor-executivo do APG Gov, que integra o consórcio do Anita.

Cunha enviou à reportagem uma lista com dezenas de serviços feitos nas escolas, desde troca de lâmpadas e bebedouros, instalação de bancos e pinturas de paredes até construção de estacionamento e instalação de câmeras de segurança. “Ainda para 2024, planejamos novas intervenções, incluindo a construção de novos banheiros e ampliação das áreas de convivência”, explica.

Carvalho também cita serviços de manutenção e intervenções no Anita. “Estamos aguardando a aprovação da construção de um auditório para as atividades da escola e duas novas salas, para promover atividades culturais e maior integração da comunidade.”

Como estão as notas

O contrato com as empresas também prevê o pagamento de um bônus por aluno, vinculado ao cumprimento de metas. Mas a escolha delas –algumas ligadas a frequência e desempenho– também é questionada.

A secretaria diz que as metas são pedagógicas porque há um “impacto indireto da administração eficiente no ambiente de aprendizado”. Diz ainda ter observado melhorias nos índices de matrículas, frequência e desempenho escolar dos estudantes das duas escolas entre 2023 e 2024.

No Anita, a pasta cita que a frequência subiu de 84% para 88%. No Prova Paraná, exame da rede estadual, a média de acertos dos alunos da escola aumentou de 41% em 2022 para 45% em 2023.

O governo não informa, contudo, se avanço semelhante também foi identificado nas demais escolas.

Considerando o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), do Ministério da Educação, há melhora nas notas entre 2021 e 2023. A mensuração do possível impacto da mudança no indicador federal, no entanto, é prejudicada pela falta de dados completos.

No Anita, a nota do ensino fundamental (anos finais) foi de 4,8 para 5,4. Na rede, a evolução foi de 5,2 para 5,4 –quando analisado o ensino médio, faltam os dados de 2021 para comparação. Já no colégio Anibal, a nota do ensino médio foi de 4,4 para 4,5 –mesma evolução média observada na rede, que aumentou de 4,6 para 4,7. Nesse caso, faltam dados do ensino fundamental.

Mas um dos professores que atuaram no colégio Anita no ano passado diz que educadores teriam sofrido pressão para alterar notas e faltas de alunos.

“No dia 19 de dezembro de 2023, fizemos um conselho de classe porque tinham 44 alunos reprovados e eles [direção da escola] foram claros em dizer que era preciso resolver isso, porque a escola era uma vitrine do projeto-piloto”, relata o professor de filosofia Edson Mosko à Folha.

O colégio diz que “o conselho de classe seguiu o mesmo padrão de sempre, sem qualquer intervenção da empresa”.

Já a gestão Ratinho Junior respondeu que a responsabilidade pelas notas e registro de frequência “é exclusivamente dos professores da rede estadual de ensino” e “qualquer manipulação de dados […] é considerada uma prática irregular”, sem citar eventual apuração do caso.

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