Se aprovado, o pacote do veneno que tramita no Senado pode liberar a aplicação de novos agrotóxicos no Brasil em larga escala. O PL (Projeto de Lei) 1.459/2022, defendido pelo lobby ruralista no Congresso, centralizaria apenas no Mapa (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) a decisão pela liberação de novas substâncias.
Hoje, a liberação de agrotóxicos passa também pelo crivo do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que passariam a ser órgãos apenas consultivos.
Um estudo realizado pela professora aposentada Sonia Hess, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mostra que os agrotóxicos cancerígenos e desreguladores endócrinos estão entre os mais vendidos no Brasil em 2020 e 2021. Engenheira química especialista no tema, ela partiu de dados dos relatórios de comercialização desses produtos referentes a 20 de março passado, fornecidos pelo Ibama.
Em dezembro do ano passado, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado já havia aprovado o PL que facilita a autorização de agrotóxicos. O colegiado também havia aprovado pedido para que o projeto fosse analisado com urgência pelo plenário da Casa. O texto passa agora por nova análise do Senado, após ter sido aprovado pela Câmara dos Deputados em fevereiro do ano passado.
Segundo levantamento do observatório “De olho nos ruralistas”, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, as multinacionais fizeram lobby para forçar o governo a flexibilizar regras para autorização de agrotóxicos.
Ruralistas reclamam que o trâmite de hoje é longo. Mas 2.182 novos agrotóxicos foram autorizados durante a gestão Bolsonaro, o maior número de registros em um mandato desde 2003.
Ambientalistas alertam que pacote do veneno libera produtos com substâncias cancerígenas, com graves riscos à saúde
De seu lado, ambientalistas criticam que o PL acaba com o veto a produtos que contenham substâncias cancerígenas. Caso a lei seja aprovada, essas substâncias seriam passíveis de autorização desde que não haja “risco inaceitável”.
“Se já foram 2 mil autorizações em quatro anos, com a atual política de aprovação, imagina modificando isso”, disse Tatiana da Silva Pereira, bióloga e ecotoxicologista da Universidade Federal do Pará (UFPA), ao jornal O Globo. “O que vejo como os maiores problemas são a centralização da liberação no Mapa, dando à Anvisa e ao Ibama apenas caráter consultivo, além da aprovação automática de um produto caso a análise ultrapasse o período de dois anos”, completou.
Pela lei atual, um novo agrotóxico só é liberado para comercialização e aplicação no Brasil após pedidos independentes feitos pela empresa à Anvisa, Ibama e Mapa. Cada órgão analisa separadamente de acordo com seu campo de competência. Porém, o novo texto diz que esses órgãos continuam com responsabilidade, mas não teriam mais poder decisório, pois a decisão final seria apenas do Mapa.
O PL também traz outros gatilhos que aceleram a autorização de agrotóxicos, como a liberação automática após dois anos de análise; a liberação de pesticidas para uso próprio em determinadas situações; e a permissão de um registro temporário desde que as substâncias sejam vendidas em pelo menos três países membros da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Para Marina Lacôrte, porta-voz de Agricultura do Greenpeace Brasil, o “texto não tem solução”. “Os artigos mais críticos são justamente os que a bancada ruralista mais quer. Permitir substância cancerígena vai aumentar a quantidade de produtos à venda, então é do interesse deles. Mesmo que a gente suprima alguns pontos, não vai adiantar, porque não tem como voltar a ser o original, o projeto já foi alterado e reconfigurado, está revogando toda uma lei”, disse ao O Globo.
O projeto foi criado em 1999, pelo então senador Blairo Maggi. O texto passou pela Comissão da Agricultura e agora está na Comissão do Meio Ambiente do Senado, com relatoria do senador governista Fabiano Contarato (PT), que prometeu um texto “equilibrado”.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, defensor do projeto, reuniu-se na terça-feira passada (30) com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). Após o encontro, ele disse que “excessos” acrescentados ao texto seriam ajustados e prometeu uma “análise técnica muito rigorosa”.
“Princípio básico: ninguém é a favor de produtos cancerígenos, ninguém é a favor da continuidade de produtos que afetem gravemente o meio ambiente”, afirmou após o encontro.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e O Globo
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