Na contramão do discurso otimista da equipe econômica e do próprio presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, de que a economia brasileira está “bombando”, o fato é que a atual gestão vai deixar o Brasil mais endividado para o próximo governo, além de um estoque represado de despesas, o que deve piorar a situação das contas públicas em 2023.
No próprio Orçamento do ano que vem, encaminhado ao Congresso no fim de agosto, a peça orçamentária já vem sendo considerada “obra de ficção” por não conter as despesas já dadas como certas para o ano que vem, além de ter ainda uma previsão de déficit de R$ 64 bilhões.
Ademais, o presidente Bolsonaro abriu os cofres públicos para cobrir seu pacote eleitoreiro e tentar impulsionar seu nome nas pesquisas de intenções de votos, nas quais tem aparecido em segundo lugar, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Aliás, todas as medidas que o governo tem tomada desde que assumiu o poder, em 2019, são eleitoreiras, pois Bolsonaro nunca saiu da campanha eleitoral, embora já tenha se posicionado no passado contra a reeleição.
Reportagem publicada na edição de ontem (18) da Folha de S.Paulo mostra que a atual administração abortou parte dos esforços que poderiam acelerar o processo de ajuste e ajudar na estabilização do quadro fiscal do Brasil. O ministro da Economia, Paulo Guedes, segundo a reportagem, manteve uma série de benefícios tributários e ampliou desonerações, medidas que drenam receitas do governo e acabam aumentando a necessidade de emitir dívidas.
O próprio presidente, diz o jornal, interditou o debate de revisão de despesas ao dizer que não iria “tirar de pobres para dar a paupérrimos”. A partir daí, ele abriu os cofres para além do teto de gasto, regra que limita o crescimento das despesas à variação da inflação, para dar cabo às suas medidas eleitoreiras.
Com Brasil mais endividado sob Bolsonaro, dívida bruta do governo deve encerrar o ano em 78,6% do PIB
De acordo com a reportagem da Folha de S.Paulo, quando Bolsonaro venceu as eleições no Brasil, em 2018, a dívida bruta do governo brasileiro estava em 75,3% do PIB (Produto Interno Bruto), nível àquela época já considerado elevado para países emergentes. Em 2019, o indicador baixou, mas voltou a subir na pandemia de Covid-19, atingindo 88,6% em dezembro de 2020.
Em 2021, o percentual voltou a cair com a maior arrecadação e as devoluções de recursos do Tesouro Nacional pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Mas, em julho deste ano, a dívida alcançou 77,6% do PIB e deve fechar 2022 em 78,6%. As projeções constam no último Boletim Focus, do Banco Central. O valor é maior do que no início do mandato de Bolsonaro.
O mesmo ocorreu com a dívida líquida do setor público, que desconta os ativos como reservas internacionais. O indicador estava em 52,8% do PIB no fim de 2018 e deve terminar o ano em 59% do PIB, segundo as estimativas de mercado.
Apesar de o governo tentar manter uma narrativa otimista de que as contas públicas estão no azul, o fato é que os gastos do Executivo federal com o pagamento de juros da dívida pública têm crescido nos últimos meses. Uma equação que envolve taxa básica de juros (Selic), inflação e dólar altos resultou em uma conta de R$ 500 bilhões nos 12 meses encerrados em maio passado, a título de despesas do governo federal com o pagamento dos juros da dívida pública. Trata-se do maior patamar em seis anos. Esse valor representa 5,51% do PIB, sendo a relação mais alta desde novembro de 2018, quando atingiu 5,52%.
De acordo com o Banco Central, o recorde atingido pelo Brasil com o pagamento de juros da dívida ocorreu em janeiro de 2016, quando esses gastos chegaram a R$ 540 bilhões ou 9% do PIB à época. Mas vale salientar que, naquele ano, o Brasil enfrentava uma das crises financeiras mais agudas em décadas. Agora, analistas esperam que o custo da dívida pública encerre o ano de 2022 em um patamar recorde.
A expectativa era de que Paulo Guedes, quando assumiu a pasta da Economia, comandasse um grande esforço para reduzir a dívida de forma mais contundente. Mas, quase quatro anos depois, o ministro, que tem sido usado como cabo eleitoral de Bolsonaro, centrou-se na defesa de medidas pontuais para derrubar a dívida, como privatizações, e desperdiçou a chance de enviar uma proposta de Orçamento 2023 com superávit primário, algo inédito desde 2014.
Ao contrário disso, Guedes manteve R$ 80,2 bilhões em desonerações, das quais R$ 52,9 bilhões correspondem ao corte de tributos federais sobre diesel e gasolina, adotado em ano eleitoral após a disparada de preços de combustíveis.
Para o economista Marcos Mendes, pesquisador do Insper, a fatura adicional nas contas públicas será de R$ 124,6 bilhões, elevando o déficit a R$ 188 bilhões (1,8% do PIB). Ele disse que esse resultado é muito distante do superávit de ao menos 1% do PIB que seria necessário para estabilizar a dívida pública, se forem consideradas as premissas otimistas de avanço de 2,5% da economia em 2023 e taxa real de juros de 4% (abaixo do praticado hoje).
“Se a hipótese da melhoria temporária [nas receitas] for prevalecer, estamos em uma emboscada. Não temos tranquilidade fiscal para o futuro”, disse Mendes em seminário na UnB (Universidade de Brasília) na última sexta-feira (16).
Redação ICL Economia
Com informações da Folha de S.Paulo
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