O senador Renan Calheiros (MDB-AL) solicitou uma reunião de emergência com o presidente Lula (PT) para tentar fazer com que a comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre o desastre socioambiental provocado pela Braskem em Maceió saia do papel. Mas uma manobra nos bastidores pode esvaziar os objetivos da CPI – e até mesmo retardar o prazo para que ela entre em funcionamento.
Até o fim da semana passada, Renan era o senador mais antigo da Casa indicado para fazer parte da comissão. Com isso, o senador tinha a prerrogativa de convocar a primeira reunião do grupo. Ele marcou a data para iniciar os trabalhos amanhã, terça-feira (12).
Porém, o líder do PSD, Otto Alencar, se autoindicou para participar da CPI, na noite de sexta-feira (8). Ele é mais velho do que Renan e, por isso, passa a ter a prerrogativa de convocar ou não a sessão. Durante a fase de coleta de assinaturas para criar a CPI, Otto orientou a bancada do PSD a não assinar o pedido. O líder do PT no senado, o baiano Jaques Vagner, fez o mesmo.
Pressão de acionista majoritária
A Novonor, antiga Odebrecht e acionista majoritária da Braskem, também estaria pressionando fortemente os senadores a não permitirem que a comissão entre em funcionamento. A justificativa da base governista para se distanciar da comissão é de que a CPI pode acabar sendo ruim para a Petrobras, hoje detentora de 47% das ações ordinárias da Braskem.
A empresa estava tentando vender parte dos negócios para empresas estrangeiras, mas o desastre em Maceió torna cada vez mais difícil essa venda.
O PT tem uma vaga a ser preenchida na CPI, mas reluta em indicar um nome. O PSD tem duas vagas e, depois de muita negociação, indicou o senador Omar Aziz (PSD-AM). Mas com a manobra da autoindicação, Otto Alencar muda as regras do jogo e pode passar a controlar o processo para impedir que ele siga adiante.
Dessa forma, PT e PSD se uniriam ao PP de Arthur Lira para impedir a investigação do maior desastre sócio-ambiental em solo urbano do mundo.
Ontem, domingo (10), o colapso da mina 18 – que possivelmente se uniu a outras duas minas sob as águas da Lagoa Mundaú – é mais um passo nesse desastre. A água da lagoa pode entrar em contato com o sal-gema e isso pode transformar as características da água, impactando a fauna e a flora do local (veja o vídeo abaixo).
Às 13h15 de hoje, a mina 18 sofreu um rompimento, no trecho da lagoa próximo ao Mutange. Estarei em instantes sobrevoando a área com os nossos técnicos. A Defesa Civil de Maceió ressalta que a mina e todo o seu entorno estão desocupados e não há qualquer risco para as pessoas.… pic.twitter.com/7sCZmYsRFB
— JHC (@jhcdopovo) December 10, 2023
Futuro incerto
Gardênia Nascimento, diretora de Planejamento Urbano, foi moradora do bairro Pinheiro, hoje uma área fantasma de casas abandonadas, muitas muradas pela Braskem, outras pichadas com acusações contra a empresa. Ela disse ao ICL Notícias que ninguém sabe o que vai acontecer daqui para frente, qual é a situação das outras minas sob o solo das regiões afetadas, porque não existem dados concretos e transparência na divulgação de estudos do desastre em curso.
Ela tem preocupação especial com os moradores que ainda estão na região dos Flexais, na beira da lagoa Mundaú. Uma região que nunca foi declarada como área de emergência, apesar de as casas dos moradores estarem rachadas e muitas terem vazamentos que brotam por baixo do piso das residências.
Sequestro de CPI
A exemplo do que aconteceu na CPI da tentiva de golpe do 8 de janeiro, essa comissão de inquérito sobre a Braskem corre o risco de ser sequestrada pelas forças que não querem investigar o crime que a empresa cometeu. Nesse caso, uma conjunção de interesses que coloca lado a lado Arthur Lira e parte da base governista no senado.
Mas uma CPI poderia esclarecer o que aconteceu, quem são os responsáveis pelo desastre em Maceió e até mesmo forçar a revisão de contratos que a população considera, no mínimo, duvidosos. Um deles é a indenização assinada, este ano, pela prefeitura de Maceió com a Braskem.
O prefeito João Henrique Caldas (PL), aliado de Artur Lira, assinou um contrato no valor de R$ 1,7 bilhão, que os movimentos de moradores afetados pela Braskem questionam e exigem que seja revisto. Ele entrega à empresa responsável pelo desastre todas as ruas, praças e logradouros da região.
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