Por Catarina Duarte – Ponte Jornalismo
A auxiliar de limpeza Rosemeire Aparecida Fidelis dos Santos de Brito, de 45 anos, soube por uma vizinha que o filho Vinícius Fidelis Santos de Brito, 24, tinha sido baleado. Ela conta à reportagem da “Ponte” que o jovem, com um ferimento no braço, tinha corrido para a casa da vizinha pedindo ajuda. Na sequência, chegaram os policiais militares (PMs).
“Fizeram a minha vizinha sair de dentro de casa para executar ele lá”, conta Rosemeire. Vinicius foi morto no último domingo (8/12) na comunidade Sambaiatuba, em São Vicente, no litoral paulista. A mãe se colocou diante dos policiais implorando pela vida do caçula de três filhos.
“Vocês mataram meu filho? O que isso? Vocês vão matar meu filho”, grita a mulher nas imagens que chocaram o país. A súplica foi registrada em um vídeo que rodou as redes sociais.
O registro feito por uma testemunha, no entanto, não mostra a violência que se seguiu. “Eles atiraram uma bomba em cima de mim e apontaram uma arma me ameaçando”, diz Rosemeire.
Vinicius foi cercado na casa da vizinha pelo tenente Carlos Augusto Pereira Andrade e pelo soldado Gustavo Riceti Guimarães da PM paulista. Carlos disparou duas vezes com uma pistola glock e Gustavo, uma, com o mesmo armamento.
A prefeitura de São Vicente confirmou à Ponte que o Serviço de Atendimento Móvel de Emergência (Samu) foi chamado para socorrer Vinicius. A versão da prefeitura é que ele morreu no caminho até um pronto-socorro, mas Rosemeire fala que o filho morreu no local, após esperar muito pelo socorro. “Quando o Samu chegou, não veio com maca, só veio com lona para pegar meu filho”, afirma ela.
Testemunhas contaram para a mãe que Vinicius estava a caminho de casa quando foi abordado. O tiro que teria atingido o braço veio na sequência, momento em que Vinicius correu. No boletim de ocorrência consta que o cabo Edson de Oliveira Silva atirou contra o jovem com um fuzil. “Meu filho não estava armado”, afirma Rosemeire.
Vinícius é descrito pela mãe como “uma pessoa muito do bem”. Ela admite que o filho publicava fotos nas redes sociais segurando armas, mas diz que o jovem nunca teve um armamento.
Rosemeire relata que o enterro do filho foi mais uma humilhação. Ela conta que a liberação do corpo pelo Instituto Médico Legal (IML) demorou e o enterro teve que ser feito com o caixão lacrado diante do estado de decomposição.
A última vez que Rosemeire viu o filho foi na tarde de domingo. Ela conta que saiu de casa por volta das 15h para ajudar em um trabalho na igreja que frequenta. Vinicius estava doente e não vinha se alimentando bem. A mãe pediu que ele ficasse em casa, mas foi desobedecida.
Vinicius era viciado em K2 — um tipo de droga sintética. Testemunhas contaram à mãe que, no momento da abordagem, o jovem parecia estar sob efeito da droga.
Local da morte não foi periciado
A Ponte revelou na terça-feira (10/12) que não foi feita perícia no local onde Vinícius foi morto. O boletim de ocorrência registra que após a morte houve “revolta dos moradores”, sendo preciso usar munição química para dispersar quem protestava. Tal fato teria justificado a não preservação do local e a ausência de perícia pela Polícia Científica.
A morte de Vinicius foi registrada como morte decorrente de intervenção policial no 2º Departamento de Polícia de São Vicente, pela equipe do delegado Dimas Rodaski Leão. Os PMs envolvidos na ocorrência pertencem ao 39º BPM/I, batalhão em que os agentes não têm câmeras corporais acopladas às fardas.
Para a Polícia Civil, os policiais militares contaram estarem fazendo uma operação na comunidade de Sambaiatuba, quando viram cinco homens em uma viela. Conforme o relato, três deles estavam armados e atiraram ao verem os policiais. Os PMs, então, teriam revidado. O tenente Carlos disparou duas vezes com uma pistola glock. Já o sargento Bruno da Silva Rodrigues disparou seis vezes e o cabo Armando Barbosa de Souza, quatro. Ambos usaram fuzis.
Ainda conforme o relato dos agentes, o grupo correu para a comunidade abandonando uma sacola com o que aparentava ser lança-perfume, maconha e crack. Um simulacro de arma de fogo, um rádio transmissor e um caderno também foram localizados pelos agentes.
O boletim registra que uma “arma de fogo-similar”, um revólver calibre 38, e drogas — 104 pedras de crack, 59 porções de maconha e sete tubos de lança perfume — foram apreendidas e atribuídas a Vinicius.
As armas de todos os policiais militares envolvidos foram apreendidas. Os PMs e Vinicius também foram submetidos a exame residuográfico.
O que diz a Secretaria da Segurança Pública
A Ponte solicitou à Secretaria da Segurança Pública (SSP-SP) entrevista com os policiais envolvidos na ocorrência, com o delegado que registrou o caso e com um porta-voz da instituição. Também foi questionada a demora relatada pela mãe no atendimento feito pelo IML. Em nota, a SSP, afirma que:
“A Polícia Militar instaurou inquérito policial militar — IPM para apurar todas as circunstâncias referente ao caso, inclusive, com análise das imagens divulgadas A DIG de Praia Grande também investiga os fatos. O policiamento no local foi reforçado, visando exclusivamente identificar e prender os outros envolvidos.”
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