O real é a moeda que mais se desvalorizou frente ao dólar em 2024, mas não está sozinho. Das 20 moedas mais negociadas no mundo, apenas três não se desvalorizaram diante da divisa norte-americana até a quarta-feira (18/12), dia em que a moeda subiu 2,82% no Brasil, sendo vendida a inéditos R$ 6,267, maior valor nominal da história.
Neste ano até ontem, o dólar acumula alta de 25,62% sobre o real, impulsionado pelos receios sobre a inflação, enquanto as expectativas têm piorado.
Nesta manhã de quinta-feira (19), a divisa norte-americana está em R$ 6,31. Mas o que está fazendo com que a moeda atinja patamares tão elevados no Brasil?
Antes de explicar as razões, importante abordar a evolução da moeda. Segundo reportagem da BBC Brasil, em 1º de janeiro de 2024, um dólar valia R$ 4,85. Na quarta-feira (18/12) de manhã, um dólar valia R$ 6,12, uma desvalorização de quase 21%.
Apenas quatro outras moedas desvalorizaram em dois dígitos contra o dólar este ano: o peso mexicano (16%), a lira turca (16%), o rublo russo (15%) e o won sul-coreano (10%). Além dessas, também se desvalorizaram o iene japonês (8%), o dólar canadense (8%), o dólar australiano (7%), o franco suíço (6%) e o euro (5%).
As únicas que não sofreram diante do dólar americano foram o dólar de Hong Kong (que se valorizou 0,6%), o rand sul-africano (que se valorizou 1%) e a libra esterlina britânica (que chega nas últimas semanas do ano com cotação praticamente igual).
Não existe apenas uma razão para a valorização do dólar por aqui. Mas importante destacar que a moeda tem se valorizado no mundo todo.
Isso porque, após a pandemia de Covid-19, o Fed (Federal Reserve, banco central estadunidense) elevou os juros básicos de sua economia, para controlar a inflação alta. Os preços haviam subido por conta de conflitos internacionais e um desalinhamento de cadeias internacionais de produção por causa da crise sanitária.
Como os ativos norte-americanos são os mais cobiçados do mundo, por serem considerados seguros, juros mais altos por lá atrai o capital estrangeiro. Investidores são atraídos pela perspectiva de bons retornos em papéis com relativamente baixo risco — no caso, títulos do governo dos EUA.
Nesse cenário, perdem mais países emergentes, como o Brasil, embora os juros pagos pelo país estejam entre os mais altos do mundo. A taxa Selic está em 12,25% ao ano, após a alta de 1 ponto percentual realizada na semana passada pelo Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central.
Esse movimento de saída do capital de uns países faz com que haja uma grande demanda nos mercados por dólares e uma oferta grande de moeda estrangeira. A consequência desse movimento é a valorização do dólar e a desvalorização das demais – como o real brasileiro.
Ao longo de 2024, havia a expectativa no mercado de que o banco central norte-americano fosse cortar os juros da economia do país. Esse movimento “empurraria” capital internacional para os mercados estrangeiros. Mas o Fed demorou a começar a reduzir os juros, porque a inflação do país continuava resiliente apesar dos juros altos para tentar freá-la.
O corte de juros por lá só só começou a acontecer em setembro e em ritmo mais lento que o esperado.
Por isso, o dólar seguiu com cotações altas ao longo do ano.
Principais variações do dólar frente ao real
- Em 27 de novembro, antes mesmo do pronunciamento de Haddad em rede nacional, o dólar saltou 1,80%, para R$ 5,91. No dia anterior, tinha fechado a R$ 5,80. A alta ocorreu após notícias de que o governo anunciaria isenção de IR (Imposto de Renda) para quem ganha até R$ 5 mil.
- Em 9 de dezembro, a divisa subiu a R$ 6,08, com receios do mercado de que o pacote de corte de gastos poderia enfrentar maior resistência no Congresso Nacional. No dia anterior, tinha encerrado a R$ 6,07.
- Em 16 de dezembro, o dólar avançou a R$ 6,09, um novo recorde, com investidores ainda insatisfeitos com a política fiscal do governo e receosos em relação ao pacote de corte de gastos. No dia anterior, havia fechado a R$ 6,03.
Inflação e pacote fiscal estão entre as razões para a alta do dólar
Em 2023, a moeda norte-americana recuou 8,06% no ano, no início da gestão Lula, que havia apresentado uma nova regra de contenção dos gastos públicos e a reforma tributária. O dólar em queda foi fundamental para o controle da inflação e o início do ciclo de corte de juros. Em 2024, o caminho se inverteu.
A desvalorização do real diante do dólar foi constante ao longo do ano. Somente nos meses de agosto e setembro o real terminou valorizado em relação ao dólar. Em todos os outros meses de 2024 houve depreciação.
Mas isso não aconteceu somente aqui. A lira turca e o peso mexicano também perderam muito valor este ano. Mas, no caso do real, a desvalorização se acelerou desde novembro, mês em que o governo de Lula (PT) anunciou seu pacote fiscal.
Somente no período de 7 de novembro e 18 de dezembro, o real se desvalorizou 7,3% — com o câmbio subindo de R$ 5,67 para R$ 6,12.
A inflação é considerada um problema. A expectativa é de que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) feche acima do teto da meta de 4,5%, definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional).
A última medição do IPCA mostra que a inflação estava em 4,87% nos 12 meses até novembro. Neste caso, inflação alta não é ruim, pois reflete a economia brasileira aquecida e o baixo desemprego. Por outro lado, há uma pressão do mercado financeiro em relação às contas públicas, o que fez com que o governo enviasse ao Congresso um pacote fiscal para cortar gastos.
O nervosismo de ontem do mercado financeiro é atribuído ao pacote, que tramita na Câmara e está sendo desidratado pelos deputados.
Devido às pressões inflacionárias, o Copom pisou no acelerador para elevar a taxa básica de juros, a Selic, em um momento em que os EUA estão cortando seus juros. Ontem, o Fed cortou em 0,25 ponto percentual os juros e anunciou ao menos mais dois cortes no próximo ano.
O comunicado do Copom cita a preocupação das autoridades monetárias brasileiras com o risco de alta da inflação: “A inflação cheia e as medidas subjacentes têm se situado acima da meta para a inflação e apresentaram elevação nas divulgações mais recentes”.
Perspectivas futuras
O presidente eleito dos Estados Unidos, o republicano Donald Trump, tem um desejo de que o dólar se desvalorize. Ao longo de sua campanha eleitoral, ele prometeu um dólar mais fraco durante sua gestão, que começará em 20 de janeiro de 2025.
A ideia de Trump é travar uma guerra comercial, a exemplo do que fez na gestão anterior, fortalecendo a balança comercial norte-americana.
A razão é que um dólar desvalorizado encarece o valor de produtos importados dentro dos Estados Unidos — dando a produtos americanos uma vantagem competitiva em relação aos estrangeiros. Por outro lado, os produtos americanos ficam mais baratos e competitivos no exterior.
Mas não é o que está acontecendo com a moeda desde que ele foi eleito. Os mercados internacionais acreditam que muitas das políticas sinalizadas por Trump até agora vão acabar provocando o efeito contrário ao desejado por ele.
*Com informações do g1
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