Um grupo com mais de 250 artistas, cientistas e pensadores se uniu em apoio ao escritor Jeferson Tenório, que foi censurado numa cidade do Rio Grande do Sul neste fim de semana.
Seu aclamado romance “O avesso da pele” foi alvo de veto por parte da diretora de uma escola em Santa Cruz do Sul. Em uma mensagem nas redes sociais, ela alegou que a obra tem palavras de baixo calão e descrição de atos sexuais.
Vencedor do Prêmio Jabuti, maior honraria das letras brasileiras, “O avesso da pele”, lançado em 2020, conta uma história sobre racismo, violência e identidade. É a “história de uma ferida”, segundo o próprio narrador, Pedro, que busca recriar a vida dos pais, Martha e Henrique, professor de uma escola na periferia de Porto Alegre que é vítima de uma abordagem policial criminosa.
Em vídeo, Janaína Venzon, diretora da escola Ernesto Alves, disse que devolveria os 200 exemplares enviados para a escola pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD). “Prezamos pela educação dos nossos estudantes e não pela vulgaridade”, disse a diretora.
A lista de apoio tem nomes como Chico Buarque, Amyr Klink, Ailton Krenak, Afonso Borges, Conceição Evaristo, Bruno Lombardi, Carla Madeira, Denise Fraga, Sueli Carneiro, Valter Hugo Mãe, Djamila Ribeiro, Tom Farias, Zélia Duncan e Zuenir Ventura.
Eles dizem ser preocupante “quando setores reacionários resolvem perseguir um escritor, tentar proibir seu livro, impedir que seja adotado nas escolas”.
“Quando a censura é permitida, toda a cultura de um país é agredida. Ferem de morte a democracia, o direito de um autor se expressar, tiram a oportunidade de alunos entrarem em contato com textos escritos que foram observados e selecionados por comissões especializadas e preparadas para levar qualidade ao ensino”, afirma o grupo, que também conta com Lilia Schwarz, Malu Mader, Maria Homem, Mia Couto, Milton Hatoum, Pilar Del Rio e Silvio Almeida.
“O avesso da pele é um grande livro, aborda temas relevantes, critica o racismo e tem o poder de proporcionar ao jovem leitor reflexão e crescimento a partir de sua leitura”, diz o grupo.
“Estamos engajados na luta favorável ao grande Jeferson Tenório. Viva o enorme romance ‘O avesso da pele’.”
O documento está aberto a novas assinaturas.
TENÓRIO FALOU SOBRE CENSURA
Em seu Instagram, Tenório falou sobre a censura no sábado (2):
“As distorções e fake news são estratégias de uma extrema-direita que promove a desinformação. O mais curioso é que as palavras de ‘baixo calão’ e os atos sexuais do livro causam mais incômodo do que o racismo, a violência policial e a morte de pessoas negras”.
A historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz também usou as redes sociais para criticar a censura:
“Antes, foi uma escola privada em Salvador, agora em Santa Cruz do Sul, no estado do Rio Grande do Sul. Vale destacar que foi a própria diretora acusante quem selecionou o livro. Por que mudou de ideia, então? Não será pelos motivos elencados, mas por conta da crítica forte que o autor faz ao racismo vigente no Brasil e, que como mostra o romance, estrutura a nossa vida e nossa linguagem. O próprio tratamento que tem sido dado à obra é prova cabal disto. Vergonha. Toda minha solidariedade ao Jeferson Tenório”, escreveu a antropóloga em sua conta no Instagram.
Este é o terceiro romance de Tenório. Os dois anteriores já haviam sido bem recebidos pela crítica. “O beijo na parede”, de 2013, foi premiado pela Associação Gaúcha de Escritores, selecionado para o Plano Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) e distribuído em escolas de todo o país, com mais de 80 mil cópias vendidas. “Estela sem Deus”, de 2018, também ganhou elogios, como do autor Tom Farias, no jornal O Globo: “o autor transborda talento ao narrar a experiência de uma adolescente em busca de sua identidade”, escreveu.
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