Artigo de Deborah Magagna e André Campedelli *
Mais uma reunião do Copom foi realizada e nada mudou em relação ao discurso oficial do comitê. Palavras como “risco fiscal”, inflação de demanda, ancoragem das expectativas e possíveis pressões inflacionárias continuam no comunicado da entidade, que em quase nada mudou desde a última comunicação que foi feita há mais de 45 dias. Porém, o mundo e o país mudaram bastante, mas pelo visto, nada disso fez mudar a análise de Roberto Campos Neto e sua turma.
Desde a última reunião, as exigências feitas pelo Banco Central foram quase todas acatadas pelo Ministério da Fazenda. Temos a volta dos impostos sobre combustíveis e já foi apresentado e amplamente debatido o novo modelo de condução da política monetária brasileira, o chamado novo arcabouço fiscal. Ocorreu até mesmo um elogio da medida por parte de Campos Neto, mas em diversas entrevistas recentes ele deixou claro que não é só o fato de o país ter uma regra fiscal boa que a taxa de juros cairá.
Além disso, o cenário econômico mudou consideravelmente. Pelo terceiro mês seguido, o país apresentou alta no desemprego, que está chegando agora próximo de 9%. A inflação vem caindo consideravelmente, com o acumulado em 12 meses chegando dentro da meta estipulada pelo Comitê Monetário Nacional, que tem na sua banda superior o valor de 4,5%. Mesmo com a alta considerável da atividade econômica de fevereiro, temos ainda uma economia que demora para acelerar de fato, e as pesquisas mensais mostram isso, já que boa parte do crescimento brasileiro está na agropecuária, setor com menor impacto que o de serviços e o industrial.
Então tudo isso deveria servir de aviso e sinalizar, pelo menos, que a taxa Selic vai cair em breve chegou, mas nem isso ocorreu na última comunicação do Copom. Ainda nem é cogitada para a próxima reunião uma alteração da taxa Selic, que deve completar aniversário de um ano com o patamar em que se encontra agora, de 13,75%. Mesmo com a inflação em baixa no Brasil e no resto do mundo, mesmo com a sinalização do Fed dos Estados Unidos que a política de aumento de juros deve cessar por lá, mesmo com o Brasil mostrando graves problemas de crescimento econômico e no nível de investimento que está.
Então, quando vai ser a hora de reduzir a taxa de juros? O que mais é necessário para que Roberto Campos Neto veja a realidade de que não lidamos com uma inflação de demanda, e que mesmo assim essa inflação está claramente desacelerando? Quando o Banco Central vai parar de observar somente o controle inflacionário e começar a cumprir sua nova atribuição que veio junto com sua “independência”, de buscar sempre manter o crescimento econômico alinhado à queda inflacionária?
A teimosia de Campos Neto tem respaldo em boa parte da imprensa e da análise econômica do mercado financeiro. Mas é importante lembrar: não existe análise meramente técnica, toda opinião, todo cálculo econômico, toda análise feita carrega a ideologia do autor que está escrevendo e, nesse caso, eles carregam a ideologia liberal econômica, que acreditam, com muita falta de humildade, ser a única ciência econômica verdadeira. Mas para além disso, essa análise é o que garante o modelo que permite a Faria Lima abocanhar boa parte dos recursos financeiros do país. Então Campos Neto não é um mero tecnocrata, ele está defendendo sua ideologia. Nos resta agora apenas saber quanto tempo devemos esperar para que a taxa Selic caia, ou quem sabe, que o próprio Campos Neto caia do cargo.
*Deborah Magagna é economista do ICL, graduada pela PUC-SP, com pós-graduação em Finanças Avançadas pelo INSPER. Especialista em investimentos e mercados de capitais
*André Campedelli é economista do ICL e professor de Economia. Doutorando pela Unicamp, mestre e graduado em Ciências Econômicas pela PUC-SP, com trabalhos focados em conjuntura macroeconômica brasileira
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