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Tudo sobre o AI-5: criação, impactos políticos e consequências históricas

História, contexto político e como aconteceu a criação do ato institucional mais violento do país
08/05/2025 | 15h08
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O Ato Institucional nº 5, ou simplesmente AI-5, é considerado um dos momentos mais sombrios da história política brasileira.

Criado durante a ditadura militar, esse “instrumento” deu poderes anormais ao regime, aumentando a repressão, suspendendo garantias individuais e abrindo o caminho para o que veio a ser um dos períodos mais violentos e autoritários do país.

Aqui vamos entender o que foi o AI-5, por que ele foi criado, quais foram suas consequências diretas e como ele ainda ecoa na política brasileira contemporânea.

O que é o AI-5?

Durante a ditadura militar brasileira (1964–1985), os Atos Institucionais foram normas criadas pelos próprios militares com o objetivo de assegurar e ampliar o poder do regime após o golpe de 1964.

O AI-5 recebeu esse nome porque foi o quinto ato institucional editado desde o início da ditadura. Antes dele, outros quatro atos já haviam sido decretados.

O primeiro deles, o AI-1, foi publicado em abril de 1964, logo após o golpe militar, e autorizava a cassação de mandatos parlamentares, a suspensão de direitos políticos por até dez anos e a intervenção no Poder Judiciário.

Em outubro de 1965, o AI-2 extinguiu os partidos políticos existentes e instituiu o sistema bipartidário, com a criação da ARENA (partido da base governista) e do MDB (partido de oposição permitido).

Esse ato também transferiu a eleição presidencial para o Congresso Nacional, eliminando o voto direto.

Já o AI-3, decretado em fevereiro de 1966, determinava que as eleições para governadores e prefeitos das capitais seriam realizadas de forma indireta – ou seja, decididas por colégios eleitorais controlados pelo regime.

Por fim, o AI-4, editado em dezembro de 1966, convocou o Congresso Nacional para aprovar uma nova Constituição, que foi promulgada em 1967 e consolidou legalmente os fundamentos da ditadura militar no Brasil.

E em 1968, o AI-5 é criado.

Manchete do jornal Última Hora no dia seguinte à decretação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968. Imagem: reprodução

Manchete do jornal Última Hora no dia seguinte à decretação do AI-5, em 13 de dezembro de 1968. Imagem: reprodução

A criação do AI-5

O AI-5 foi uma medida imposta pelos militares no dia 13 de dezembro de 1968, durante o governo do presidente Artur da Costa e Silva. Ele foi criado em um momento em que muitos brasileiros estavam indo às ruas para protestar contra a ditadura militar, exigindo mais liberdade e justiça.

Na verdade, o estopim para a criação do AI-5 foi a recusa da Câmara dos Deputados em permitir que o governo processasse um deputado que havia feito críticas fortes ao regime.

Foi então que o Ato Institucional nº 5 deu ao presidente poderes praticamente ilimitados. Ele passou a ter autoridade para fechar o Congresso, tirar políticos eleitos de seus cargos, intervir nos governos de estados e cidades e suspender direitos básicos das pessoas — como, por exemplo, o direito ao habeas corpus, que protege os cidadãos de prisões injustas.

Não só isso, o AI-5 também oficializou a censura à imprensa e a perseguição política. Com isso, a ditadura se tornou ainda mais dura e autoritária porque acabou com os Três Poderes e transformou o governo militar em um regime sem espaço para questionamentos ou oposição. Foi o marco mais violento e repressor da história recente do Brasil.

O presidente Artur da Costa e Silva em cerimônia militar meses antes de decretar o AI-5. Imagem: reprodução

O presidente Artur da Costa e Silva em cerimônia militar meses antes de decretar o AI-5. Imagem: reprodução

AI-5 e a censura à imprensa

Com a edição do AI-5, a censura se tornou um instrumento permanente de controle do Estado sobre a mídia e as artes. Jornais, revistas, programas de televisão, peças de teatro e canções passaram a ser submetidos à aprovação dos censores oficiais antes de serem lançados para o público.

A censura afetou diretamente o desenvolvimento da cultura brasileira, restringindo a liberdade de expressão de artistas, escritores e jornalistas.

Obras de autores como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil foram censuradas ou modificadas para chegar ao público, mas não parava por aí: a repressão também se estendia aos jornalistas, que podiam ser presos e processados por publicarem matérias consideradas “subversivas”.

Um dos casos mais emblemáticos foi o assassinato do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, dentro das instalações do DOI-CODI em São Paulo, após ter se apresentado voluntariamente para prestar depoimento.

Sua morte foi inicialmente apresentada como suicídio, mas a versão oficial foi amplamente contestada e denunciada como consequência do sistema de tortura e repressão do regime.

Mais de oito mil pessoas compareceram ao ato inter-religoso em memória de Vladimir Herzog em 1975, marcando a primeira grande manifestação popular após o AI-5. Foto: reprodução

Mais de oito mil pessoas compareceram ao ato inter-religoso em memória de Vladimir Herzog em 1975, marcando a primeira grande manifestação popular após o AI-5. Foto: reprodução

O caso deu origem ao uso simbólico da expressão “suicidado”, usada para se referir a pessoas que, na verdade, foram assassinadas pelas forças de repressão, mas cujas mortes foram forjadas como suicídio pelo regime militar.

Esse ambiente de censura e perseguição fez com que muitos artistas, intelectuais e políticos fossem forçados a deixar o país, como forma de garantir sua segurança e continuar sua atuação.

Exílios políticos durante o AI-5

Diversas lideranças políticas, culturais e intelectuais brasileiras foram forçadas ao exílio durante o período do AI-5. Entre os nomes mais emblemáticos estão Leonel Brizola, Miguel Arraes, Darcy Ribeiro, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Estes dois últimos foram presos e, posteriormente, exilados em Londres.

O exílio era uma estratégia do regime para neutralizar vozes dissonantes e eliminar o debate político. Muitos desses exilados continuaram suas atividades no exterior, denunciando os abusos da ditadura em organismos internacionais. O exílio também simbolizava o cerceamento do direito de opinião e movimento dos cidadãos.

Em 1969, antes de embarcar para o exílio no México, 13 dos 15 presos políticos libertados pelo regime militar foram fotografados na base aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Foto: divulgação

Em 1969, antes de embarcar para o exílio no México, 13 dos 15 presos políticos libertados pelo regime militar foram fotografados na base aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Foto: divulgação

As consequências do AI-5 e da ditadura militar brasileira

O AI-5 teve consequências devastadoras para a sociedade brasileira. Ao eliminar as garantias democráticas, ele criou um vácuo institucional que permitiu a perpetuação da violência e da impunidade. Não só isso, mas o fechamento do Congresso e a suspensão dos direitos civis contribuíram para uma geração pautada no medo e silenciamento político.

Do ponto de vista burocrático, o AI-5 não só enfraqueceu profundamente a credibilidade do Judiciário e do Legislativo, mas também começou uma perseguição contra professores, artistas, jornalistas e líderes comunitários que resultou em um atraso cultural, educacional e democrático que levou décadas para ser superado.

Inclusive, essas profissões, historicamente associadas à crítica social e à defesa de direitos humanos, passaram a ser frequentemente rotuladas como “subversivas” ou “comunistas” — uma narrativa que se perpetua até os dias atuais.

Durante o governo Bolsonaro, por exemplo, houve uma retomada desse imaginário autoritário: pais incentivaram filhos a filmar aulas de professores sob a justificativa de vigiar supostas “ideologias comunistas” em sala de aula.

Esse tipo de ação reflete uma herança direta do período do AI-5, quando o controle sobre o pensamento crítico e a livre expressão era visto como essencial para a manutenção da ordem imposta pelo regime.

A ditadura militar no Brasil foi marcada por censura, tortura, prisões arbitrárias e desaparecimentos forçados. Imagem: Arquivo Nacional 

A ditadura militar no Brasil foi marcada por censura, tortura, prisões arbitrárias e desaparecimentos forçados. Imagem: Arquivo Nacional

As consequências do AI-5 no Brasil pós-ditadura

Mesmo depois do fim da ditadura, em 1985, e da criação da Constituição de 1988, as marcas deixadas pelo AI-5 continuam presentes no Brasil.

A falta de justiça para as vítimas da ditadura, a permanência de práticas autoritárias nas estruturas de poder e a facilidade com que se naturalizam discursos antidemocráticos mostram que a transição para a democracia ainda está incompleta. Não basta viver em um país democrático na teoria — é preciso praticar, proteger e cultivar essa democracia todos os dias.

Nos últimos anos, alguns políticos chegaram a defender publicamente o retorno de medidas como o AI-5, mostrando que ainda há uma grande dificuldade em ensinar e valorizar a democracia no país.

Na prática, quando movimentos sociais são calados, protestos pacíficos são reprimidos com violência e professores ou jornalistas são atacados por suas opiniões, estamos vendo reflexos diretos daquele período de repressão que foram normalizados no dia a dia.

Afinal, a democracia no Brasil ainda é frágil porque o país não enfrentou de forma completa os crimes e abusos cometidos durante a ditadura. Até hoje, os torturadores do regime militar não foram punidos.

Para garantir que algo como o AI-5 nunca mais aconteça, é essencial lembrar a história do nosso país, proteger a liberdade de expressão e fortalecer todos os dias as instituições que defendem os direitos dos cidadãos como o STF e o Ministério Público.

Manifestantes direitistas pedem a volta do AI-5 durante ato pró-intervenção militar. Imagem: Sérgio Lima/AFP

Manifestantes direitistas pedem a volta do AI-5 durante ato pró-intervenção militar. Imagem: Sérgio Lima/AFP

Criado para silenciar a oposição, controlar a sociedade e manter o poder concentrado nas mãos do regime militar, ele institucionalizou a violência, legalizou a censura e normalizou a perseguição política. Suas consequências ultrapassaram os anos de chumbo e ainda se refletem no presente.

Lembrar o AI-5 é lembrar que a liberdade de expressão, o pensamento crítico e o direito à opinião não são privilégios, mas conquistas que custaram caro. E que podem ser perdidas se não forem constantemente defendidas.

Ainda que o tempo avance, o peso do AI-5 nos lembra que a nossa liberdade é frágil e exige cuidado diário. Cada voz calada e cada direito negligenciado durante o período nos recorda que é preciso garantir que a história não se repita — afinal, nossa história é nosso poder.

Lembrar para nunca esquecer e jamais repetir. Ditadura nunca mais!

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