O programa Fantástico, da TV Globo, mostrou, neste domingo (23), áudios inéditos que revelam detalhes para um golpe de Estado no Brasil. As gravações foram extraídas de celulares e computadores apreendidos pela Polícia Federal. Nos arquivos, conversas entre militares e civis envolvidos no plano de romper a ordem democrática.
Os áudios mostrados na reportagem de Paulo Renato Soares e Mahomed Saigg também não deixam dúvidas quanto ao vínculo da cúpula do ex-presidente Jair Bolsonaro com os acampamentos na frente dos quartéis em vários pontos do país e a invasão e depredação do 8 de janeiro de 2023 em Brasília.
Ao todo, a PGR denunciou ao STF 34 pessoas pela tentativa de golpe de Estado, incluindo Bolsonaro e 24 militares.
Oficiais do alto escalão das Forças Armadas mantinham contato direto com manifestantes contrários ao resultado das eleições e buscavam apoio para pressionar o governo.
Em um dos áudios, o tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida, então lotado no Comando de Operações Terrestres (COTER) do Exército, sugere que os militares teriam que “sair das quatro linhas” da Constituição para retomar o controle da situação.
O mesmo oficial diz em uma gravação: “Eu acho que o pessoal poderia fazer essa descida aí, né? E ir atravancando mesmo. Porque, pô, a massa humana chegando lá não tem PM que segure. Porra, vai atropelar a grade e vai invadir. Depois não tira mais, né?”

Tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida
Em outro trecho, o tenente-coronel Guilherme Marques de Almeida fala: “Se tu tiver alguma possibilidade de influenciar alguém dos movimentos, eu tô tentando plantar isso nas redes onde eles estão. Tô participando de vários grupos civis”.
Ele revela em outra conversa a utilidade dos manifestantes para o plano golpista: “Não adianta protestar na frente do QG do Exército. Tem que ir para o Congresso. E as Forças Armadas vão agir por iniciativa de algum Poder. Porque, assim, todo mundo quer as Forças Armadas por quê? Quer um mecanismo de pressão chamado arma, né? Para apaziguar, a gente resolve destituir, invalidar a eleição. Colocar voto impresso, e fazer uma nova eleição. Com ou sem Bolsonaro”.
Em fevereiro de 2024, o Exército exonerou o tenente-coronel de cargo de comando. Alvo de operação da PF três meses depois, Almeida desmaiou ao ser abordado pelos agentes.
Outro que aparece nos áudios é o general de brigada Mário Fernandes, que seria um dos idealizadores do plano “Punhal Verde Amarelo”, que tinha como objetivo matar o presidente Lula, o vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.
Diz Mário Fernandes ao tenente-coronel Mauro Cid: “Parece que existe um mandado de busca e apreensão do TSE [Tribunal Superior Eleitoral] ou do Supremo, em relação aos caminhões que estão lá. Já houve prisão realizada ali, pela Polícia Federal. Se o presidente pudesse dar um input ali para o Ministério da Justiça, para segurar a PF…”
Segundo a PF, a estratégia do grupo era manter indefinidamente os protestos nas ruas e fomentar a contestação das urnas eletrônicas, tentando criar um ambiente favorável à intervenção militar. Quando não tinham autoridade para atender às demandas dos manifestantes, os militares recorriam a aliados dentro do governo para que as reivindicações chegassem ao então presidente Jair Bolsonaro.
A Polícia Federal apreendeu cerca de 1,2 mil equipamentos eletrônicos e conseguiu extrair um total de 255 milhões de mensagens, incluindo áudios e vídeos.
A perícia já elaborou 1.214 laudos que, segundo os investigadores, comprovam a articulação golpista e demonstram que integrantes do governo Bolsonaro tentaram influenciar os comandantes militares para aderirem ao movimento.
Relacionados
Ofícios mostram que Exército pediu apoio logístico ao acampamento golpista desde os primeiros dias
Documentos, ofícios e e-mails mostram como o Exército coordenou, tolerou e até organizou serviços no acampamento de 8/1
Coronel da PM quer reabrir instrução penal com provas de ação contra Bolsonaro
Advogados afirmam que processo contra alto escalão do governo reúne elementos novos
Sete de nove convênios envolvidos na fraude do INSS foram assinados sob Bolsonaro
Levantamento junto ao Diário Oficial revelou os acordos de descontos que mais lesaram aposentados e pensionistas