Juliana Dal Piva e Igor Mello
O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) informou à Receita Federal que fez duas doações que somam R$ 130 mil para o irmão Flávio Bolsonaro (PL-RJ), hoje senador. Contudo, em ao menos um dos casos um total de R$ 70 mil não passou pelas contas bancárias de Flávio, nem foi declarado por ele no Imposto de Renda.
Segundo laudo do MP sobre o esquema de rachadinha no gabinete de Carlos Bolsonaro, obtido com exclusividade pela coluna, o vereador doou em dinheiro vivo ao irmão R$ 60 mil em 2005 e outros R$ 70 mil em 2010. No segundo repasse, Carlos não tinha lastro em sua renda formal para dar o dinheiro para Flávio.
A coluna apurou os dados do vereador em um relatório produzido pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) e cruzou as informações com as declarações de Imposto de Renda de Flávio e os dados de sua quebra de sigilo bancária autorizada pelo TJ-RJ em 2019.
O laudo dos peritos do MP sobre as finanças de Carlos Bolsonaro em 2010 informa que “o aumento de seu patrimônio não teve respaldo nos rendimentos recebidos, tampouco em outras fontes que justificariam o referido aumento, considera-se que, nesse ano, houve evidências de patrimônio a descoberto, fato que é reforçado pelo comprometimento de 153,37% da renda líquida declarada em decorrência do aumento patrimonial”.
O patrimônio a descoberto é configurado quando a renda líquida do contribuinte não é suficiente para lastrear o aumento de patrimônio. Segundo relatório publicado pela Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA) em 2023, a prática de patrimônio a descoberto por agentes públicos pode configurar improbidade administrativa e enriquecimento ilícito.
A coluna cruzou os repasses feitos por Carlos Bolsonaro com dados contidos na investigação da rachadinha de Flávio Bolsonaro, na qual houve a quebra dos sigilos fiscal e bancário do senador. Flávio nunca declarou no Imposto de Renda ter recebido os R$ 70 mil do irmão em 2010. Assim, foi possível verificar que o dinheiro também nunca passou por suas contas bancárias.
Como as quebras contra Flávio não abrangem o ano de 2005, não é possível saber se o mesmo ocorreu com os outros R$ 60 mil.
A 1ª Vara Criminal Especializada do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio) autorizou a quebra de sigilos fiscal e bancário de Carlos Bolsonaro e de seus assessores entre 2005 e 2021. A 3ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada apura peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no gabinete de Carlos e pediu uma análise dos dados obtidos. O relatório obtido pela coluna é de 22 de agosto de 2023.
Doação coincide com período de aumento de patrimônio de Flávio
A falta de registros bancários de empréstimos e doações entre integrantes da família Bolsonaro já havia sido identificada na investigação da rachadinha de Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro). Na ocasião, o MP destacou que o senador declarou ter pegado emprestado R$ 230 mil de parentes e assessores, mas que não havia registro da passagem desses valores por suas contas.
“Como não consta qualquer crédito correspondente aos empréstimos na conta bancária do ex-Deputado Estadual e conforme alegado pelo próprio Parlamentar em seu interrogatório, tais valores teriam sido entregues em dinheiro vivo”, diz a denúncia do MP contra Flávio Bolsonaro.
Em 2010, ano da doação de Carlos que não consta em suas informações fiscais e bancárias, Flávio Bolsonaro teve um aumento expressivo em seu patrimônio, com a quitação e posterior venda de 12 salas comerciais que ele havia financiado em 2008, na Barra da Tijuca, área nobre da Zona Oeste do Rio.
Além de ter quitado as salas, Flávio também desembolsou um total de R$ 33.969,20 com o imposto de transmissão dos imóveis. Contudo, o MP constatou que não houve nenhuma movimentação em suas contas bancárias ou nas de sua esposa que comprovassem o pagamento dessas despesas, o que indica que também foram quitadas em dinheiro vivo.
No caso de Flávio, a quebra dos sigilos foi autorizada pela 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro em 2019, no que ficou conhecido como o Caso Queiroz. Posteriormente, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou todas as decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana, titular da vara, no caso, afetando a tramitação da denúncia contra o senador, que já havia sido feita pelo MP-RJ.
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