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Juliana Dal Piva

Formada pela UFSC com mestrado no CPDOC da FGV-Rio. Foi repórter especial do jornal O Globo e colunista do portal UOL. É apresentadora do podcast "A vida secreta do Jair" e autora do livro "O negócio do Jair: a história proibida do clã Bolsonaro", da editora Zahar, finalista do prêmio Jabuti de 2023.

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Carlos foi a cofre antes de Bolsonaro e Eduardo comprarem imóveis em casos suspeitos

Ex-presidente comprou imóveis no Vivendas da Barra por valores abaixo da avaliação oficial da prefeitura
17/07/2024 | 18h50

Igor Mello e Juliana Dal Piva

O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) acessou um cofre que mantinha com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), seu irmão mais velho, nos dias em que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ), pai do “02”, registrou as compras de duas casas no condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca.

Os dados foram descobertos pela coluna a partir de um cruzamento de informações entre os documentos dos cartórios onde foram registradas as aquisições com as informações dos registros de acesso ao cofre que foram entregues pelo Banco do Brasil ao MP-RJ (Ministério Público do Rio) e obtidas pela coluna com exclusividade.

Carlos também esteve no cofre no dia em que seu irmão Eduardo Bolsonaro (PL-SP), hoje deputado federal, comprou um apartamento em Copacabana. Neste caso, Eduardo declarou em cartório ter pago R$ 160 mil no imóvel, dos quais R$ 50 mil em dinheiro vivo.

Procurados, Jair, Carlos e Eduardo Bolsonaro não responderam os questionamentos enviados pela reportagem.

Desde o dia 3 de julho, a coluna vem revelando em uma série de reportagens como Carlos e Flávio Bolsonaro acessaram um cofre alugado pelos dois dentro de uma agência do BB, no centro do Rio, antes de comprar imóveis que estão sob investigação devido às suspeitas de lavagem de dinheiro. A coluna já identificou outros dois casos semelhantes envolvendo compras realizadas por Carlos e Flávio Bolsonaro.

Desde a última quinta-feira (11), a coluna procura assessores e advogados da família Bolsonaro para obter um posicionamento sobre as informações contidas nesta reportagem. Nem Jair Bolsonaro, nem Eduardo quiseram se manifestar.

Vivendas da Barra

A primeira casa no Vivendas da Barra foi comprada por Bolsonaro em 21 de janeiro de 2009. Nesta data, foi registrado um acesso de Carlos ao cofre em uma agência do Banco do Brasil no Centro do Rio às 11h36 — ele deixou o banco ao meio-dia. Carlos Bolsonaro já tinha ido ao cofre dois dias antes, em 19 de janeiro, quando passou quase duas horas no local.

Bolsonaro não declarou o uso de dinheiro em espécie na compra, mas a negociação do imóvel tem uma série de pontos controversos. Em cartório, Bolsonaro declarou ter pago R$ 409 mil pelo imóvel à empresa Comunicativa-2003 Eventos, Promoções e Participações.

O valor ficou abaixo do valor avaliado para o imóvel para fins de cobrança de impostos. A prefeitura do Rio avaliou a casa em R$ 1,06 milhão para a cobrança de ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis), muito acima da transação registrada oficialmente.

Localizada em um condomínio de alto padrão em frente à praia da Barra da Tijuca, na Zona Oeste, um dos endereços mais valorizados do Rio, a negociação entre Bolsonaro e o vendedor fez com que os antigos proprietários ficassem com um prejuízo de mais de R$ 170 mil com a casa. Quatro meses antes da compra feita por Bolsonaro, o mesmo imóvel foi comprado pela Comunicativa por R$ 580 mil em setembro de 2008.

Pelos critérios do Coaf, o que ficou registrado em cartório para o negócio aponta indícios de lavagem de dinheiro. Os detalhes sobre a compra foram revelados pelo jornal Folha de S. Paulo, em 2018. Antes disso, em 2015, a PGR (Procuradoria-Geral da República) chegou a receber uma denúncia sobre a aquisição de Bolsonaro, mas arquivou a apuração preliminar após ouvir a defesa apresentada pelo agora ex-presidente sem maiores investigações como quebras de sigilo, por exemplo.

Até hoje a casa é o endereço de Jair Bolsonaro no Rio de Janeiro. Após vencer a eleição presidencial, em 2018, ele usou o endereço para receber altas autoridades, como o então assessor de Segurança Nacional dos Estados Unidos, John Bolton. O então juiz federal Sérgio Moro, hoje senador, também foi até o local para acertar sua entrada no governo como ministro da Justiça.

Carlos Bolsonaro visitou cofre nos dias em que pai comprou casas no Vivendas da Barra

Carlos Bolsonaro visitou cofre nos dias em que pai comprou casas no Vivendas da Barra

Casa onde mora Carlos Bolsonaro

A segunda casa no Vivendas da Barra foi comprada por Bolsonaro em 13 de dezembro de 2012. O valor declarado foi de R$ 500 mil. No mesmo dia, Carlos Bolsonaro esteve no cofre entre 10h17 e 10h30. Até hoje, o imóvel é a residência do vereador, embora esteja no nome de seu pai.

Assim como ocorreu na compra da primeira casa, o valor registrado em cartório ficou muito abaixo da avaliação da prefeitura do Rio. Neste caso, o valor de referência para o pagamento de ITBI foi estipulado em R$ 2,23 milhões.

Documento do Banco do Brasil mostra que Carlos e Flávio alugaram cofre em 2004

Documento do Banco do Brasil obtido pelo MP mostra que Carlos e Flávio alugaram cofre em 2004

Uma pesquisa em sites de vendas de imóveis mostra que uma casa no condomínio Vivendas da Barra não custa menos de R$ 2 milhões — dependendo do tamanho e da estrutura, uma propriedade no local chegar a R$ 4,5 milhões.

Carlos foi a cofre antes de Eduardo comprar imóvel com R$ 50 mil em espécie

Em 3 de fevereiro de 2011, o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) passou 24 minutos dentro de um cofre alugado por ele em uma agência do Banco do Brasil, no centro do Rio. Na mesma data, Eduardo Bolsonaro, seu irmão mais novo, registrou em cartório a compra de um apartamento, em Copacabana, na Zona Sul do Rio. Na época, recém-empossado como escrivão da Polícia Federal, Eduardo declarou ter pago R$ 160 mil pelo imóvel, dos quais R$ 50 mil foram pagos em dinheiro vivo.

Carlos Bolsonaro foi a cofre na mesma data que Eduardo pagou R$ 50 mil em dinheiro vivo por apartamento

Carlos Bolsonaro foi a cofre na mesma data que Eduardo pagou R$ 50 mil em dinheiro vivo por apartamento

O filho “03” de Bolsonaro registrou a compra do apartamento no 24º Ofício de Notas do Rio. No documento, constou que o apartamento foi vendido por R$ 160 mil.

Na escritura de compra e venda, Eduardo declarou que o pagamento ocorreu de duas maneiras: por meio de um cheque administrativo de R$ 110 mil e o restante do valor foi descrito pelo escrivão como: “R$ 50 mil através de moeda corrente do país, tudo conferido, contado e achado certo”.

O apartamento também foi adquirido abaixo do valor avaliado para fins de cobrança de impostos. No documento, está descrito que a “Secretaria Municipal de Fazenda, para efeitos fiscais, avaliou o imóvel em R$ 228.223,64”. Desse modo, Eduardo recebeu um desconto de 30% no imóvel. Após esta colunista revelar o uso de dinheiro vivo nesta negociação, a PGR instaurou uma apuração preliminar que é mantida em sigilo.

Em um vídeo, em setembro de 2022, Eduardo chegou a admitir o uso de dinheiro vivo durante essa negociação. “O apartamento custou R$ 160 mil e nem um terço dele foi pago com dinheiro vivo. Tudo totalmente condizente com o meu salário, e a Folha/UOL só sabe disso por que? Primeiro, porque nós não usamos laranjas, e, segundo, eu detalhei a forma de pagamento na escritura”, afirmou Eduardo Bolsonaro, no vídeo.

Eduardo gravou o vídeo após esta colunista revelar junto com o jornalista Thiago Herdy a prática sistemática do uso de dinheiro vivo nas compras de imóveis da família Bolsonaro. Ao todo, ao menos 51 tiveram pagamentos com uso de dinheiro em espécie.

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