ICL Notícias

Por André Uzêda

Fora da lista de empresas autorizadas a operar no Brasil, alguns sites de apostas estão pirateando contas oficiais de órgãos públicos para promover jogos online na internet. A prática é chamada de cloaking e é considerada extremamente nociva em meios digitais.

O cloaking acontece quando programadores desviam os usuários de suas buscas originais para levá-los a conteúdos indesejados. Em casos assim, ao digitar um tema no buscador do Google, o usuário encontra um determinado link que ele acredita estar relacionado ao assunto pesquisado. Mas, ao clicar, acaba sendo levado para páginas falsas, muito usadas em anúncios de publicidade agressiva ou tentativas de golpe.

As casas de apostas têm usado sites como do Governo do Acre, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), o site oficial do Governo de Minas Gerais, da Secretaria da Agricultura de São Paulo, além de portais de diversas prefeituras e Câmaras Municipais para divulgar jogos online.

Boa parte deste conteúdo é de cassinos online ou de diferentes modalidades de slot games, como o popular ‘Jogo do Tigrinho’ (Fortune Tiger), por exemplo. O slot game está proibido pelo governo brasileiro, que só autorizou a regulamentação de jogos de cota fixa — aquelas em que o jogador entra sabendo quanto pode ganhar ao realizar cada aposta.

No ‘Jogo do Tigrinho’ e outros similares, o valor final da aposta não é definido previamente. E é justamente a imprevisibilidade do formato que acaba sendo um dos maiores atrativos para esta modalidade. Hoje, mesmo ilegal, o Tigrinho é uma enorme febre no país.

Planilha com sites pirateados

Um webempresário e programador que não quis se identificar notou que, desde março deste ano, a prática do cloaking tem sido constante nas páginas do Google. Ele dese ao ICL Notícias que, desde que a plataforma começou a utilizar Inteligência Artificial para resolver problemas de navegação, esse tipo problema se tornou mais recorrente.

O programador elaborou uma planilha com links de quase 200 páginas que estão sendo ou foram pirateadas por casas de apostas nos mais diversos temas buscados no Google. Além de órgãos públicos, há também site de veículos de imprensa e ONGs pirateados. Na maior parte das vezes, os administradores dos portais não sabem que suas páginas estão sendo usadas para outras finalidades.

“Eu acredito que eles usem portais de órgãos públicos porque são considerados mais confiáveis pelo Google. Desta forma, aproveitam que são bem ranqueados nas páginas da plataforma, para enganar o usuário e vender o produto que desejam”, pontua.

Algumas das empresas que mais aparecem na prática do coakling são a BrasCasino e a Bet6K. Nenhuma das duas consta na lista oficial do Ministério da Fazenda como empresas autorizadas para operar no Brasil. O ICL Notícias tentou contato com as duas bets, mas não conseguiu.

O empresário conta que, por diversas vezes, mandou mensagem para o Google para alertar sobre o problema e pedir a exclusão das páginas, mas não obteve resposta da plataforma.

A reportagem conseguiu contato com a empresa que representa o Google no Brasil e alertou para a prática de cloaking envolvendo órgãos públicos. Em nota, o Google disse que tem usado “sistemas avançados de combate a spam” que permitem “manter a busca 99% livre de spams”.

Informou ainda que estão “melhorando de forma contínua esses sistemas para combater o crescente volume de conteúdo com esse tipo de ameaça, incluindo spam hackeado que pode aparecer quando há vulnerabilidades na segurança de um site”.

Também garantiu que tem trabalhado para notificar os sites quando os sistemas detectam que eles podem ter sido invadidos, fornecendo “dicas para ajudar os proprietários a garantir e melhorar a segurança de suas páginas.”

A reportagem enviou a planilha para o Google e, na última consulta feita antes da publicação desta reportagem, notou que muitas páginas já haviam recuperado seus domínios originais, após dias exibindo conteúdo pirateado.

Alguns domínios públicos do serviço público continuavam enviando tráfego para sites de apostas até à noite de segunda-feira (21). O vídeo abaixo mostra dois exemplos: primeiro, o que acontece quando alguém acessa determinados links da Fundação de Cultura Elias Mansour, órgão da Secretaria de Cultura do Estado do Acre, e também o que acontece com alguns links do Portal de Dados Abertos, do Ministério do Desenvolvimento Regional:

‘Jogo do Tigrinho’ tem marketing agressivo

A prática do cloaking não é a primeira estratégia agressiva adotada pelos administradores do ‘Jogo do Tigrinho’ no Brasil. A plataforma tem contratado influenciadores digitais com muitos seguidores para estimular seu público a realizar as apostas, com o argumento de que há técnicas especiais para obter renda extra — o que pode ser considerado crime contra a economia popular, previsto na Lei nº 1.521/51.

A lógica do jogo é desafiar o apostador a conseguir combinar três figuras iguais na diagonal para ganhar um prêmio em dinheiro. Cada figura tem um valor diferente. Ainda há uma rodada bônus, multiplicando o valor final em 10 vezes.

De acordo com dados da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), o Tigrinho é mais utilizado entre jovens, na faixa etária de 25 a 34 anos. A maior parte dos jogadores (64%) disse usar a principal fonte de renda para fazer as apostas on-line.

A Polícia Civil de diversos estados têm realizado operações para prender grupos que usam o ‘Jogo do Tigrinho’ para lavagem de dinheiro e organização criminosa.

 

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