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Chefe da Marinha critica título de herói a João Cândido e fala em ‘reprovável exemplo’

Olsen disse que insurgentes buscavam vantagens corporativistas e ilegítimas
25/04/2024 | 17h26

Por Matheus Tupina

(Folhapress) — O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, criticou na segunda-feira (22) o projeto de lei que inscreve João Cândido Felisberto, líder da Revolta da Chibata, de 1910, no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, alegando que o reconhecimento do militar qualificaria “reprovável exemplo de conduta” para os brasileiros.

A proposta tramita atualmente na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, presidida pelo deputado Aliel Machado (PV-PR) com relatoria da deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

Ele chamou os marinheiros envolvidos na revolta, como Cândido, de abjetos, e disse que os enaltecer significa exaltar atributos que não contribuem para “o pleno estabelecimento e manutenção do verdadeiro Estado democrático de Direito”, chamando o episódio de vergonhoso e deplorável.

“Aponto, por conseguinte, que incluir, no Livro de Heróis da Pátria, João Cândido Felisberto ou qualquer outro participante daquela deplorável página da história nacional […] seria o mesmo que transmitir à sociedade, em particular, aos militares de hoje, que é lícito recorrer às armas que lhes foram confiadas para reivindicar suposto direito individual ou de classe.”

Ainda sobre o episódio de 1910, Olsen disse que os insurgentes buscavam, para além do fim dos castigos físicos nas embarcações militares brasileiras, o que ele chamou de vantagens corporativistas e ilegítimas, citando aumento de salários, regime de trabalho menos exigente e exclusão de oficiais considerados, por eles, indignos de servir a Marinha.

Comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, critica João Cândido

Comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, critica João Cândido

Ressaltou, por fim, que os castigos físicos nos navios são inaceitáveis e incompatíveis com os preceitos morais da sociedade contemporânea, e foram reconhecidos como tais. Entretanto, disse existir diferença entre reconhecer um erro e “enaltecer um heroísmo infundado”.

A nota da Marinha também cita argumentos de uma posição expressa há anos: a quebra de hierarquia e disciplina, além das ameaças de bombardeio à cidade do Rio de Janeiro, afirmando que vidas foram sacrificadas, incluindo duas crianças, atingidas por projétil.

A Força, então, não considera o movimento — que teve cerca de 2.300 marinheiros amotinados pelo fim do castigo físico — “ato de bravura” ou de “caráter humanitário”.

João Cândido, herói nacional

Projetos para reconhecer João Cândido como herói nacional tramitam no Parlamento desde 2007, um ano antes de o então presidente Lula (PT) sancionar o texto de Marina Silva (na época senadora pelo PT-AC), concedendo anistia póstuma a ele e aos outros militares da revolta.

O trecho garantindo todos os efeitos da anistia, citando promoções que teriam tido direito caso tivessem seguido no serviço ativo e pensão por morte, foi vetado, sob a justificativa de significativo impacto orçamentário.

Na época da revolta, a anistia foi aprovada por unanimidade no Congresso Nacional, mesmo assim, marinheiros foram presos, outros expulsos da corporação, alguns fuzilados.

O próprio Cândido, conhecido como “almirante negro” por seu protagonismo na revolta e pela liderança de outros fardados negros, foi expulso, preso e morreu pobre em 1969. Ele nunca chegou a ser de fato promovido a almirante, apesar de ter sido chamado assim pela imprensa e pela população da época.

Longe do Legislativo, ele é reconhecido como herói estadual no Rio de Janeiro, e municipal em São João do Meriti, na Baixada Fluminense, onde morou a maior parte da vida, e, desde agosto, em Encruzilhada do Sul (RS), sua terra natal.

 

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