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Coletivo de judeus defende Lula e diz que presidente falou ‘o que está no imaginário’

Para o grupo, as falas de Lula "são de grande importância"
20/02/2024 | 09h00

O coletivo Vozes Judaicas por Libertação saiu em defesa, por meio de nota, do presidente Lula (PT) após fala em que compara o massacre promovido pelas forças militares de Israel contra a população na faixa de Gaza ao genocídio promovido por Adolf Hitler contra os judeus na Segunda Guerra Mundial.

“A contradição do povo judaico ser ora vítima e agora algoz é palpável, tenebrosa e desalentadora. Lula externou o que está no imaginário de muitos de nós”, afirma o coletivo Vozes Judaicas por Libertação.

Segundo o coletivo, “a comparação entre genocídios é sempre complicada” e “há como estabelecer qualquer hierarquia”. Para o grupo, as falas de Lula “são de grande importância”. A informação é da Folha de São Paulo.

O contexto da fala do presidente se deu após vir à tona, nesta semana, que cinco pacientes do hospital Nasser, em Gaza, morreram após a unidade ter o fornecimento de oxigênio cortado em meio aos ataques israelenses. A declaração do presidente Lula abriu uma crise diplomática entre os dois países.

O coletivo Vozes Judaicas por Libertação vai na contramão de outras entidades judaicas, que criticaram a fala de Lula. “Apoiamos as colocações do presidente Lula e cobramos que a radicalidade de suas palavras seja colocada em prática”, diz.

“Se a criação e fundação de um Estado judaico foi uma medida de sobrevivência num mundo sitiado, ela logo se tornou um pesadelo. O Estado de Israel não trouxe emancipação verdadeira aos judeus pois a sua existência é mantida às custas da negação da autodeterminação dos palestinos”, completa o grupo.

EMBAIXADOR

O presidente Lula pediu o retorno do embaixador brasileiro em Israel, Frederico Meyer. O diplomata foi chamado de volta para consultas. A medida é uma resposta à convocação do embaixador, feita por Israel, para uma reprimenda ao Brasil, após Lula comparar a situação na Faixa de Gaza ao Holocausto.

O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, afirmou, na última segunda-feira (19), que Lula é considerado uma “persona non grata” até que se retrate das declarações.

Veja a íntegra da nota do coletivo Vozes Judaicas por Libertação:

Dando um passo além nas contínuas denúncias dos crimes cometidos por Israel contra os palestinos, o presidente Lula causou furor ao fazer uma comparação entre o que ocorre hoje em Gaza e o que Hitler fez com os judeus durante o nazismo.

A comparação entre genocídios é sempre delicada pois a experiência vivenciada por cada povo afetado é inigualável. Cada um representa uma narrativa singular e dolorosa na história das comunidades vitimadas. Logo, não há como estabelecer qualquer hierarquia entre genocídios. É impossível estabelecer uma métrica objetiva para determinar o ‘pior’ genocídio da história. Categorizar historicamente vítimas maiores ou menores é uma perigosa armadilha de reprodução de racismo.

A contradição do povo judaico ser ora vítima e agora algoz é palpável, tenebrosa e desalentadora. Lula externou o que está no imaginário de muitos de nós. Uma comparação que causa muita dor a judias e judeus de todo mundo, que tiveram as suas vidas cindidas pelo genocídio dos judeus na Europa, e agora veem um crime similar sendo cometido, supostamente em seu nome. Enquanto coletivo de judias e judeus, temos antepassados que foram vítimas do Holocausto nazista, e entendemos que nosso imperativo ético é nos posicionarmos contra o genocídio do povo palestino e contra a utilização da nossa defesa como justificativa.

Se a criação e fundação de um Estado judaico foi uma medida de sobrevivência num mundo sitiado, ela logo se tornou um pesadelo. O Estado de Israel não trouxe emancipação verdadeira aos judeus pois a sua existência é mantida às custas da negação da autodeterminação dos palestinos. As lideranças israelenses seguem promovendo um massacre contra palestinos e ainda ameaçam a vida de judeus e judias em todo o mundo. Israel representa hoje a maior fonte de insegurança para todos os judeus do planeta ao usar nossa identidade como fachada e justificativa para sua campanha de terror.

Por isso, defendemos e acreditamos que as palavras de Lula são de grande importância pois levantam questões relacionadas à urgência da ação, como um chamado definitivo dirigido a todos para agir diante do que ocorre em Gaza neste momento. Frente à incapacidade da ONU e de várias organizações internacionais em conter a violência perpetrada por Israel em Gaza, destaca-se a importância vital da postura demonstrada por líderes internacionais como Lula, que levantam suas vozes contra o que é já considerado por incontáveis especialistas como um genocídio contra o povo palestino.

As palavras têm poder. Se a forma como Lula se expressou na ocasião foi pouco cuidadosa — tropeçando justamente neste ninho de comparações forçadas — sua fala tem o objetivo de atingir a imaginação e provocar uma crise moral sobre Israel. O pedido de impeachment protocolado pelos deputados bolsonaristas é uma medida descabida, assim como as acusações de antissemitismo — cujo real objetivo é deslegitimar o governo e a diplomacia brasileira. Não acreditamos que judeus brasileiros estão em risco por causa de sua declaração.

Apoiamos as colocações do presidente Lula e cobramos que a radicalidade de suas palavras seja colocada em prática. Seria um gesto diplomático de relevância gigantesca romper todas as relações entre o estado brasileiro e Israel, em especial as relações militares que também fortalecem a barbárie em terras brasileiras, com a compra de armas e tecnologias de controle social que são usadas para atingir a vida do povo negro nas favelas. Convocar o embaixador brasileiro em Tel Aviv foi um passo ainda insuficiente nessa direção.

Por fim, convidamos a todas e todos, mas principalmente ao governo brasileiro a atender as demandas do movimento internacional de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS), liderado pelas bases da sociedade civil palestina. O povo palestino tem pressa e nossas ações têm poder.”

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