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Por Lucas Rocha*

Ninguém sabe o que vai acontecer na Argentina na eleição do próximo domingo. Javier Milei, Sergio Massa e Patricia Bullrich medem forças neste final de semana na disputa pela Casa Rosada.

Com um clima de desilusão e cansaço, parte dos argentinos parece disposta a embarcar em uma aventura extremista que não se sabe onde pode levá-los. Por outro lado, essa incerteza assusta uma outra parcela da sociedade que quer impedir que o país siga numa mesma rota que o Brasil com o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Quando Bolsonaro foi eleito no Brasil em 2018, o choque na Argentina foi grande. Declarações absurdas do ex-presidente começaram a circular nos principais portais de notícias do país. A visita de Bolsonaro ao ex-presidente argentino Mauricio Macri, já em 2019, foi criticada pela sociedade e alvo de protestos de alguns grupos. O bolsonarismo representava uma espécie de antítese da cultura política de um país que condenou generais responsáveis pela ditadura que promoveu um terrorismo de Estado e de um país que deu passos importantes na direção da democratização da comunicação.

No próximo domingo, a Argentina pode eleger o seu “Bolsonaro”. Milei, um comentarista caricato de programas de TV, é quem desponta como favorito nas pesquisas eleitorais e pode até mesmo se sagrar eleito em primeiro turno. Uma vitória de uma extrema direita que se aproveita de uma desilusão total em um país movido por paixões vorazes, mas que parece anestesiado.

Nada está definido. As pesquisas eleitorais mostram um cenário bastante aberto, com oscilações tão significativas que torna muito difícil cravar qualquer resultado.

Com a promessa tresloucada de dolarizar de vez a Argentina — com o fechamento do Banco Central — e um discurso de ódio extremado que não poupa nem o Papa Francisco, Milei conquista uma parcela da população desiludida com o sistema político depois dos trágicos governos de Alberto Fernández e Macri, que levaram o país a uma crise econômica catastrófica.

Apesar de ter Macri por perto e sinalizar que pode ter o ex-presidente no seu gabinete, Milei se coloca como um herói da antipolítica. Critica as “castas” e o Estado argentino com uma visão neoliberal tão extremada que não foca apenas na privatização da petrolífera YPF, mas também normaliza a venda de órgãos e fala em um mercado livre de bebês.

No cenário mais provável, Milei avança para um segundo turno contra Massa, que é ministro de economia do atual governo e tenta mobilizar a base peronista com uma autocrítica e promessas de fazer diferente de Fernandez. Mas em um outro cenário, o “libertário” pode vencer em primeiro turno. Na Argentina, não é necessário 50% dos votos para ser eleito, basta ultrapassar 40% com uma vantagem de 10 pontos para o segundo colocado.

Para evitar o triunfo do extremista, que foi o candidato mais votado nas prévias de agosto, Massa anunciou medidas populares nos últimos meses, como o fim do imposto de renda para uma parcela da população, e agora se ancora na força que tem o peronismo nas bases. Algumas pesquisas colocam o ministro, que já foi chefe de gabinete de Cristina Kirchner e presidente da Câmara dos Deputados, na liderança.

Ainda que nenhuma sondagem aponte para isso, o ministro dos Transportes da Argentina, Jorge D’Onofrio, disse em entrevista a uma rádio que crê em uma reviravolta que garanta uma vitória dramática do peronista em primeiro turno. Algo que seria bem argentino. Onofrio se baseia tanto na força do peronismo quanto em declarações recentes de Milei em que o candidato estimulou as pessoas a venderem seus pesos e comprarem dólares, o que pode ter irritado parte da população.

Bullrich, que representa uma ala radical dos partidos de direita tradicionais, também luta por um lugar ao sol. A coligação Juntos Pela Mudança foi a segunda mais votada nas prévias, mas todas as pesquisas colocam a candidata em terceiro lugar. Apesar de fazer parte da chamada “direita tradicional” e ter um perfil de eleitor consolidado, Bullrich traz consigo um discurso extremado que se assemelha em certos pontos com o de Milei.

Essas semelhanças fizeram a ex-parlamentar ser alvo de ferrenhos ataques de Milei, que está de olho em uma migração de voto útil dela para ele para tentar encerrar o pleito já no primeiro turno.

A incerteza sobre o que vai acontecer no domingo na Argentina é, sem dúvidas, algo que surpreende os brasileiros que se mobilizaram contra a reeleição de um governo que fez o país atravessar uma crise social gigantesca, com a explosão do trabalho informal o crescimento da insegurança alimentar, e que deixou de legado 700 mil mortes durante a pandemia da Covid-19 por sua má-gestão.

Mas é algo que, com certeza, aterroriza parte do eleitorado argentino que se chocou com Bolsonaro e não sabe qual caminho o país vai trilhar daqui pra frente.

*Lucas Rocha é jornalista formado pela UFRJ e mestre em Estado, Governo e Políticas Públicas pela FLACSO Brasil. Faz parte da equipe de redes do ICL Notícias, e tem passagens por Revista Fórum, Jornal do Brasil e Sputnik Brasil.

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