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Há chances consideráveis de a Câmara dos Deputados votar em plenário, ainda hoje, o projeto de lei que revisa a reforma do ensino médio, empreendida em 2017, no governo de Michel Temer. As mudanças feitas há seis anos foram batante criticadas por vários setores da sociedade, de estudiosos no tema a estudantes.

Ironicamente, o texto que será analisado é de autoria do deputado Mendonça Filho (União-PE), que era ministro da Educação quando o chamado Novo Ensino Médio (NEM) foi aprovado. A redação do parlamentar também tem sido muito criticada por especialistas.

A reforma criada no governo Temer tinha como objetivo a chamada “flexibilização” do ensino, em que a grade curricular passou a ter uma parte comum, voltada para disciplinas básicas (como português e matemática), e uma parte diversificada, com áreas de aprofundamento que seriam escolhidas pelos estudantes.

Na prática, no entanto, a tal “flexibilização” se mostrou caótica, já que estudantes e professores reclamam, por exemplo:

  • Da supressão de aulas das disciplinas tradicionais;
  • Dos chamados “itinerários”, que geram conteúdos desconectados do currículo;
  • E de escolas que não oferecem um leque de opções desses “itinerários”, com casos até de sorteio entre alunos.

O professor Salomão Ximenes, estudioso do assunto chegou a classificar o NEM de “rebaixada profissionalização da juventude pobre”.

Sala de aula. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Fracasso reconhecido

Diante do fracasso amplamente reconhecido desse modelo, o governo federal enviou ao Congresso um projeto de lei que aumenta a carga horária de disciplinas tradicionais, limita a oferta dos itinerários e faz outras mudanças.

Mas os deputados acabaram apresentando um substitutivo ao texto do governo, com Mendonça como relator. Entre outras coisas, essa nova proposta amplia a carga horária da formação geral básica, mas abaixo do que foi proposto pelo governo Lula.

Apesar de apoiado por entidades como o “Todos pela educação”, que tem participação do empresariado, o texto que poderá ser votado hoje tem sido muito criticado pelos especialistas, que divulgaram nas redes sociais a hashtag #RevogaNEM. O movimento estudantil também convocou para hoje uma mobilização para se opor à aprovação do substitutivo.

A seguir, algumas das críticas dos estudiosos:

Lindener Pareto, historiador, Curador Acadêmico e Pedagógico no ICL (Instituto Conhecimento Liberta)

“Não nos iludamos, o ‘Novo Ensino Médio’ é um tiro de morte em qualquer projeto minimamente sério de educação para o país. O Congresso, mesmo diante das mudanças propostas pelo novo Governo Lula, quer implantar o projeto neoliberal de 2017, de Temer e Bolsonaro. Projeto que dá a falsa ilusão de autonomia aos estudantes, mas que no fim das contas elitiza o ensino diante do lobby de empresas privadas que lucram com a educação. A frase de efeito de Darcy Ribeiro, infelizmente, nunca envelhece: ‘A crise da educação no Brasil não é uma crise, é um projeto!'”

Iago Gomes, professor de escola pública e pesquisador em Educação

“Com Michel Temer, o Novo Ensino Médio nasceu por medida provisória, sem debate público, somente como imposição. Agora o Congresso quer seguir a mesma cartilha para manter a mesma configuração, indo na contramão do que especialistas da educação têm apontado.”

Daniel Cara, cientista polítiico e professor da USP

“Mendonça Filho, com apoio das fundações empresariais e do Consed, protocolou mais um substituto ao PL 5230/2023. Mais uma provocação: agora quer impor os itinerários formativos nos processos seletivos da educação superior. Ou seja, vai prejudicar ainda mais os estudantes de escolas públicas, sem qualquer constrangimento, diante do que tem sido a caótica implementação do NEM. Diante desse tipo de provocação, contrária ao processo de negociação, os líderes da Câmara dos Deputados precisam cancelar a votação do Ensino Médio marcada para esta terça-feira (19).”

Salomão Ximenes, professor da Universidade Federal do ABC

“Por ironia ou retaliação, ou ambas, a relatoria do PL foi entregue ao mesmo Mendonça Filho, hoje deputado. Este, sem surpresa, no texto substitutivo apresentado (…) desconsiderou todas as evidências, preservando a estrutura básica da MP de 2016. Será constrangedor para o governo e trágico para a escola pública se o resultado fora manutenção do NEM, com a vitória dos atores que o conceberam na gestão Temer.” (Jornal O Povo, 16/12)

Fernando Cássio, pesquisador e professor da USP

“Mendonça Filho defende um texto piorado para a reforma do ensino médio usando um dado de pesquisa encomendada por fundações empresariais. Contudo, o relator do PL5230/23 não mostra que apenas 27% dos entrevistados se consideram bem informados sobre o NEM.”

Tarcísio Motta, professor e deputado federal (PSOL-RJ)

“Aqueles que defendem a votação do relatório do Mendonça Filho dizem que ele melhora o NEM. Não há melhoria possível em um projeto estruturalmente fracassado. As ‘mudancinhas do Mendoncinha’ não resolvem nada.”

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