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Deputada dos EUA critica massacre na Palestina: Onde está nossa humanidade coletiva?

Finkelstein a Bernie Sanders: "Quando você diz que se opõe a um cessar-fogo você cruzou a linha vermelha. Você se tornou um monstro moral”
12/11/2023 | 05h50

Por Heloisa Villela

A deputada Cori Bush, do Missouri, é uma voz quase isolada dentro do Congresso dos Estados Unidos. Não fosse por quatro ou cinco colegas que se juntaram a ela para exigir que o presidente Joe Biden pressione Israel por um cessar-fogo já, ela estaria mesmo sozinha. Nas mídias sociais, as postagens de Cori Bush transpiram  dor, preocupação e humanidade. Perto do fim do primeiro mandato, Cori foi eleita pelo Missouri, a primeira mulher negra a representar o estado no Congresso. E se tornou conhecida nos protestos de 2014, depois que a polícia matou o jovem Michael Brown, de 18 anos. Uma morte que sacudiu o país.

Cori faz a ligação fundamental entre a luta dos negros dos Estados Unidos e a dos palestinos. A desumanização de uns como dos outros também aproxima os brasileiros dessa briga. Ativista histórica do movimento negro no país, Angela Davis faz essa ligação há anos. Agora, na internet, vejo voltar à tona uma entrevista de três anos atrás em que ela ressalta o apoio que sempre recebeu dos palestinos, uma solidariedade que alimentava a coragem dela nos tempos de prisão.

Enquanto as manifestações nas ruas dos Estados Unidos aumentam e se multiplicam, deputados e senadores continuam quase unanimemente surdos ao genocídio em curso na Faixa de Gaza. A única palestina-americana eleita nos Estados Unidos sofreu uma censura no Congresso, no dia 7 de novembro, pelas declarações que fez a respeito da violência promovida pelo Estado de Israel. A censura foi aprovada por 234 votos contra 188, com o apoio de 22 democratas. O senador de Vermont, Bernie Sanders, criticou a medida. Mas ele mesmo deixou muito a desejar quando defendeu a destruição total do grupo Hamas e disse não a um cessar-fogo.

Enquanto Cori Bush organizou um grupo de deputados progressistas para pressionar Biden pelo fim da matança, ainda no dia 16 de outubro, Sanders rejeitou a ideia, publicamente, no dia 6 de novembro, quando o número de palestinos mortos já passava de 10.000. Ele falou em pausa humanitária e foi categórico: “o Hamas tem que acabar”, disse.

Norman Finkelstein, cientista político novaiorquino, filho de judeus que foram enviados aos campos de concentração, gravou uma resposta às declarações de Sanders. Ele fez campanha ativamente quando o senador de Vermont tentou ser o candidato a presidente do Partido Democrata. Um vídeo de Finkelstein, de 2008, voltou a viralizar nas redes agora. Em um debate acalorado com universitários ele lembrou que os pais participaram do Levante do gueto de Varsóvia. “E é por causa das lições deles, para mim e para meus dois irmãos, que não vou ficar em silêncio enquanto Israel comete seus crimes contra os palestinos”. Não podia ser mais atual.

Agora, na resposta que deu a Bernie Sanders, Finkelstein disse ter ficado furioso com o que ouviu a ponto de sentir as entranhas se retorcerem. E deu, em poucos minutos, uma aula de história. Destaco os pontos principais que ele salientou:

– Em 2006, os Estados Unidos impuseram aos palestinos uma eleição na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. O Hamas, que não participava desse teatro político, decidiu entrar na disputa e venceu o pleito. Jimmy Carter, o ex-presidente dos EUA, tem uma organização que monitora processos eleitorais e declarou que a eleição foi justa e honesta. Mas Estados Unidos e Israel não gostaram do resultado e imediatamente impuseram um bloqueio brutal a Gaza.

– A população de Gaza é predominantemente (70%) formada por refugiados. Palestinos que foram expulsos de suas casas em 1948 para dar lugar à criação do estado de Israel.

– Depois de eleito, o Hamas enviou diversas mensagens de paz para tentar resolver o conflito com Israel. Sugeriu a formação de dois estados, nos limites de 1967, o que é proposta de consenso internacional. E também exigia o total direito de retorno dos palestinos às casas de onde foram expulsos em 1948, ponto que certamente teria de ser negociado.

– Em junho de 2008 houve um cessar-fogo entre Israel e Hamas que durou até o dia 4 de novembro, data da eleição presidencial dos EUA quando Israel atacou Gaza, rompendo o cessar-fogo. Matou 1.400 pessoas, das quais, 350 eram crianças.

– Em 2012 Israel assassinou um alto funcionário do Hamas chamado Ahmed Jabari que era o principal interlocutor do grupo junto a Israel e estava negociando um cessar-fogo de longo prazo.

– Uma nova investida militar de Israel contra Gaza, em 2014, terminou com 2.200 palestinos mortos, 550 deles crianças, e a demolição de 18 mil casas.

Finkelstein, sempre se dirigindo a Bernie Sanders, acusa: “quando você diz que se opõe a um cessar-fogo você cruzou a linha vermelha. Você se tornou um monstro moral”.

São declarações fortes, mas a matança em Gaza é ainda pior. Cori Bush sente parecido e deixou uma mensagem na internet no último sábado:

“Minha alma dói. Nós não podemos ouvir os gritos dos feridos ou das crianças chorando por suas mães. Não podemos ouvir os ossos e crânios se quebrando quando os prédios desabam. Mas podemos ouvir o silênciso dos nossos amigos, a cumplicidade de nossos governos e mídia, a manipulação dos que nos rotulam rapidamente de “simpatizantes de terroristas” por estarmos ultrajados com o assassinato de milhares de homens, mulheres e crianças palestinos inocentes. Mas também podemos ouvir o grito dos pacifistas, o lamento dos que rezam, e os pedidos dos que clamam por um cessar-fogo no mundo. Os médicos não deveriam implorar por um cessar-fogo. Os enfermeiros não deveriam implorar por um cessar-fogo. Como enfermeira, não posso imaginar a dificuldade de cuidar de pacientes enquanto sou bombardeada. Não tem que ser assim. Onde está nossa humanidade coletiva?”

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