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Direção do Instituto Federal de SP quer ceder área estudantil e sindical para a GCM

Em greve, comunidade acadêmica tenta impedir que área de 5 mil m² passe para guardas civis, que já circulam no campus
01/05/2024 | 05h00

Por Gabriela Moncau — Brasil de Fato

De forma inédita na educação federal brasileira, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFSP) da capital paulista está prestes a ceder parte de seu terreno para que a Guarda Civil Metropolitana (GCM) estabeleça ali uma base.

A iniciativa encontra resistência da comunidade acadêmica do campus São Paulo, que afirma sequer ter sido informada ou consultada. Sob o mote “o bosque é nosso”, esta é uma das pautas locais da paralisação deflagrada no IFSP desde o último 8 de abril, aderindo à greve nacional de servidores. Na semana seguinte, em 15 de abril, os estudantes também aderiram à paralisação.

Apelidada de bosque, a arborizada área em disputa tem quase cinco mil metros quadrados e é historicamente usada por estudantes e trabalhadores para convivência. Uma parte do espaço também estava em vias de abrigar a nova sede do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe). Acordada com a direção da unidade, a construção foi iniciada. Pouco tempo depois, no entanto, a obra foi paralisada.

Localizado no bairro do Canindé, o campus está em um imóvel da prefeitura de São Paulo, concedido à instituição para fins exclusivamente educacionais desde 1996 pelo prazo de 90 anos, conforme a lei n.º 11.974/96. A iniciativa de destinar um pedaço do terreno para forças de segurança está, no entanto, alinhada entre a direção do campus, atualmente a cargo de Alberto Akio Shiga, e a gestão municipal do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Em um vídeo postado nas redes sociais, Shiga diz que buscou “reforço da segurança na região” por conta de assaltos e que, entre muitos contatos, “a que nos acolheu mais rapidamente foi a GCM”. O diretor caracteriza o início da obra da sede do sindicato como “intempestiva” e fora das condições permitidas.

“Como esse terreno já estava nessa condição irregular, a gente já estava com esse problema da criminalidade e a GCM com uma vontade de estar na região, a prefeitura resolveu retirar essa parte do terreno da concessão e passar isso para a GCM”, afirma Alberto Shiga.

Ofícios publicados no Diário Oficial indicam, no entanto, que a iniciativa não é unilateral da prefeitura. Um documento emitido pela direção do IFSP em outubro de 2022 agradece o inspetor da GCM Wagner Tavares pelo “apoio” para coibir furtos e assaltos e apresenta a proposta do uso do espaço para a corporação.

Procurada pelo Brasil de Fato, a Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU) informa que “o terreno foi oferecido pelo próprio Instituto Federal de São Paulo”. De acordo com a pasta o terreno está agora sob sua gestão “para instalação de uma base operacional da GCM, que já realiza patrulhamento no local. O processo seguiu todos os trâmites administrativos”.

Guardas abordam estudantes dentro do campus

De fato, os guardas já estão fazendo patrulha no local e, inclusive, dentro do campus. Segundo a presidenta do Diretório Central dos Estudantes (DCE), Carla Albuquerque, um estudante foi abordado por um agente. “Falaram que o estudante tinha característica de suspeito. O que seria característica de suspeito?”, questiona.

Em nota, a direção do campus disse à reportagem que não soube da abordagem, mas que a GCM entrou na instituição “para verificar uma denúncia de que pessoas externas estavam pulando o muro e entrando nos fundos da escola”.

Na manhã da última quarta-feira (24), como parte da mobilização em defesa do bosque, estudantes fizeram um mutirão de limpeza do local. Foram abordados por três guardas municipais de moto.

“A GCM não vai resolver nossos problemas. Por que não investe em uma guarda universitária? Em mais iluminação?”, propõe Albuquerque. “Sem resolver as questões de segurança, hoje a militarização dentro dos institutos federais vai trazer ainda outros problemas”, avalia.

“Da pandemia para cá estamos vivendo uma perda muito grande dos espaços estudantis. O bosque é um espaço que os estudantes usavam para fazer confraternizações, conversar, ter aula ao ar livre”, relata a presidenta do DCE. Estava sendo ventilada a ideia, ainda, de estabelecer ali um restaurante estudantil. “O que a gente vê é que, mais uma vez, a gente não tem, de fato, a opinião dos estudantes sendo ouvida”, constata.

Presidenta do Grêmio Livre Charlie Chaplin do IFSP e diretora da Federação Nacional dos Estudantes de Ensino Técnico (Fenet), Júlia Cristina diz que “os estudantes estão revoltados”.

“É um espaço nosso doado sem nos consultar. Os blocos da construção ali foram construídos pelos estudantes e professores. E agora é jogado assim, né? De maneira alguma fariam isso com a sala da direção. Agora como é do sindicato, é dos estudantes, tudo bem”, critica Júlia.

Disputa em aberto

Estudantes se mobilizam contra entrega de terreno do IFSP à GCM. Foto: Ana Carmona

O professor Márcio Alves de Oliveira, membro do comitê de greve dos servidores, afirma que a situação faz parte de “uma tentativa de expulsão do sindicato de dentro da área educacional”.

Depois que a instituição manifestou a necessidade de construir a nova reitoria no espaço onde por 39 anos esteve o sindicato, um termo administrativo de acordo entre a entidade, o reitor Silmário Batista dos Santos e o diretor Shiga firmou que a nova sede seria em um espaço de 700 m² dentro do bosque.

O documento é de agosto de 2022. Dois meses depois, a direção encaminhou o ofício à prefeitura oferecendo a área inteira para a GCM. “Existe aí um elemento de má fé”, opina o docente.

Além disso, em abril de 2023, o diretor do campus Alberto Shiga enviou uma manifestação ao Ministério Público, dizendo que a obra da construção da sede do sindicato — cuja permissão para acontecer foi firmada por ele mesmo oito meses antes — era “irregular”.

Argumentando que “a obra é uma instituição sindical com ideologias políticas”, o diretor pediu, neste documento, que sua identidade fosse mantida sob sigilo durante a tramitação da manifestação. A solicitação não foi acatada.

“Além de não ter tido transparência na discussão, ao invés de ampliar o aparelho público de educação, o que se faz é transformar este espaço em um aparelho policial. Traz a polícia para o campus no mesmo momento em que tenta expulsar o sindicato de dentro dele”, descreve Oliveira.

“E é isso que a comunidade está se mobilizando nesse momento para não deixar acontecer. Fora toda a pressão para que o diretor dê explicações de algo que descaradamente ele está dizendo que é uma solicitação da prefeitura, quando na verdade foi uma articulação dele e têm os documentos que mostram isso”, afirma o docente.

A paralisação, assim como a mobilização pela manutenção do bosque como espaço da comunidade acadêmica, segue no IFSP. Na quarta-feira (24), estudantes fizeram uma colagem de lambes pela instituição. Entre os dizeres, “é greve porque é grave”, “o bosque é nosso” e “fora GCM do campus”.

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