ICL Notícias

Por Heloisa Villela

Dois incêndios movimentam todos os setores da vida nacional. Um físico, concreto, e outro político, resultado do primeiro. O presidente Lula viu as chamas de perto, na semana passada, quando sobrevoou a região amazônica e o Parque Nacional de Brasília. Mas também sai chamuscado nas pesquisas de opinião que mostram uma queda vertiginosa dos índices de avaliação da política ambiental do governo depois que os incêndios começaram.

Neste mês de setembro, o resultado da pesquisa Ipec (inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica) sobre o desempenho do governo mostra que 44% das pessoas consultadas acreditam que a atuação do Planalto na área de meio ambiente é ruim ou péssima. Em abril, essa avaliação negativa era bem menor: 33%. Enquanto isso, caiu de 33% para 27% a porcentagem de brasileiros que veem as ações do governo nesse tema como boas ou ótimas.

A crise ambiental, que alimenta a tensão política, precisa de respostas urgentes e de longo prazo. Mas também abre uma área de atuação para o governo. Pode talvez ser a oportunidade de isolar os mais radicais, a direita que, nem mesmo diante da realidade alarmante em todo o país, vê motivos para um combate sério ao aquecimento global. Ou pior, alimenta os incêndios como forma de desestabilizar o governo, como muitos afirmam, nos corredores do Planalto.

Lula deixou claro que vai agir nesse campo. Politicamente, parece ter enxergado, na crise, a possibilidade de dividir a coesa bancada ruralista. “Estou convencido de que nenhum empresário sério do agronegócio deseja queimadas. Sabe a importância que tem nas exportações brasileiras e as exigências internacionais colocadas para todos os países”, afirmou Lula em reunião do Planalto, na terça-feira (17).

Ele também disse que o setor precisa discutir o uso indiscriminado de agrotóxicos. “Não é possível que a gente não tome uma atitude contra o crescimento do uso de agrotóxicos nesse país, que 80% dos agrotóxicos proibidos na Alemanha possam ser vendidos aqui no Brasil. Como se fossemos uma republiqueta de banana. Me disponho a fazer uma reunião com a bancada ruralista para descobrir quem é sério e quem não é”, disse.

A demora em dar resposta à crise climática e, especificamente, às queimadas, gerou críticas ao governo. O Ministério do Meio Ambiente montou um gabinete de crise há três meses, por causa dos incêndios no Pantanal. Somente esta semana as atenções do Planalto se voltaram integralmente para a emergência. A seca, agora, atinge todos os estados do país, com exceção do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, e a fumaça das queimadas tomou conta do Distrito Federal.

Lula vai assinar uma medida provisória, com crédito extraordinário de R$ 514 milhões, dinheiro que será empregado em diferentes áreas como fiscalização, combate aos incêndios, compra de água e cestas básicas, defesa, entre outras. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, adiantou que uma segunda MP, com outro volume de crédito, será anunciada depois de mais um diagnóstico e de uma rodada de conversa com governadores, marcada para esta quinta-feira (19).

“Os orçamentos do IBAMA e do ICMBio serão recompostos e o Brasil vai comprar três helicópteros de combate ao fogo que vão para Porto Velho, Serra do Cachimbo e Ilha do Bananal”, adiantou ao ICL Notícias o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho. Ele acompanhou a visita do presidente Lula à Amazônia, e descreveu um pouco do que Lula viu de perto. Rios da Amazônia com peixes mortos, tudo seco, a margem direita do Amazonas toda seca e a esquerda começando a baixar.

“É inacreditável!”, disse Lula, na última terça-feira (17). “As imagens desses rios caudalosos que têm 15 metros de profundidade, agora estão com meio metro de água. As voadeiras nem podem passar. No domingo à tarde sobrevoei o fogo aqui no Parque Nacional. Parecia que tinha sido traçado com uma régua”, disse o presidente.

Durante o sobrevoo da Amazônia, ao lado da ministra Marina Silva, Lula teria tomado a decisão de criar a Autoridade Climática, uma promessa de campanha que continuava no papel. Ele anunciou a decisão na reunião de todos os poderes da República, na tarde de terça-feira (17), no Planalto.

O governo abriu a reunião com uma palestra científica de uma das maiores autoridades de clima no mundo: o professor de astrofísica atmosférica da Universidade de São Paulo, Paulo Artaxo. Assistiram a palestra, ao lado de Lula, ministros de estado, representantes do Tribunal de Contas, da Advocacia Geral da União, os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. “É o poder público ouvindo a ciência para fazer as políticas”, disse o presidente do Ibama ao deixar a reunião.

O professor Artaxo diz que o Brasil, por sua localização tropical, é um dos países mais vulneráveis às mudanças climáticas do mundo. Em artigo publicado no último dia 16, no site da Academia Brasileira de Ciências, ele alerta que 2024 será lembrado como o ano em que as queimadas superaram todos os limites. “A situação pode ser caracterizada como uma pandemia de incêndios florestais”.

Para os líderes dos 3 poderes da República ele disse, no Palácio do Planalto, que a Amazônia é responsável pelo aprisionamento de toneladas de carbono que são liberadas no ar quando a mata é queimada, o que só agrava o aquecimento global. Há três anos, relatou Artaxo, um artigo científico publicado na revista Nature mostrava que a Amazônia já estava liberando mais carbono do que absorvendo.

Lula destacou que o Rio de Janeiro teve 1.800 focos de incêndio e quase 20 pessoas já foram presas. Ele enxerga fortes indícios de que muitos dos incêndios são criminosos. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco também. “Há orquestração mais ou menos organizada, que busca incendiar o Brasil”, disse Pacheco, que defendeu a colaboração do Poder Legislativo para conter o fogo e apurar responsabilidades.

 

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