O presidente Jair Bolsonaro (PL) foi o primeiro entrevistado da série que está sendo realizada pelo Jornal Nacional, da TV Globo, com os candidatos mais bem cotados nas pesquisas de intenções de votos. Na noite de ontem (22), panelaços ocorriam em várias partes do Brasil enquanto o presidente candidato à reeleição discorria uma série de mentiras e informações falsas em resposta às questões que lhe eram feitas pelos jornalistas William Bonner e Renata Vasconcellos.
Mesmo quando confrontado pelos jornalistas, Bolsonaro, na cara dura, mentiu sobre a pandemia de Covid-19, a integridade do processo eleitoral, distorceu dados sobre o meio ambiente e a respeito da economia do país.
A expressão corporal do presidente mostrava certa tensão diante de perguntas como a corrupção em seu governo e sua aliança com o Centrão. Quando questionado a respeito deste último tópico, ele virou para o apresentador Bonner dizendo que ele o estava forçando “a ser um ditador”, justificando depois que o chamado Centrão possui mais de “300 deputados” e que seria difícil governar sem eles.
De modo geral, Bolsonaro pareceu ter sido bem treinado por seus assessores para segurar sua personalidade bastante intempestiva, principalmente quando está próximo de seus apoiadores no cercadinho do Palácio do Planalto.
Ao ser confrontado com o fato de que havia xingado ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), Bolsonaro mentiu mais uma vez. Disse aos apresentadores que nunca os xingou. Ele foi lembrado de que, em mais de uma situação, desferiu impropérios contra o ministro Alexandre de Moraes, atual presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e que é responsável por inquéritos envolvendo o presidente e seus aliados, além de Luís Roberto Barroso, que presidiu o órgão até o primeiro semestre deste ano.
A equipe de checagem de fatos do jornal O Estado de S.Paulo avaliou a entrevista e lembrou também que, em uma manifestação no dia 7 de Setembro na Avenida Paulista, em São Paulo, Bolsonaro ameaçou não mais respeitar decisões do STF. Na ocasião, ele chamou Alexandre de Moraes de “canalha” e pediu que ele deixasse o cargo. No mesmo dia, chamou Barroso de “imbecil” por defender o sistema eleitoral eletrônico do país. A reportagem também mostra outras situações em que o presidente ofendeu os dois ministros.
Bolsonaro também mentiu, sem a menor vergonha, a respeito da compra de vacinas. Ele disse na entrevista que o governo federal comprou mais de 500 milhões de doses de vacinas contra a Covid-19 mais rápido do que outros países. Trata-se de mais uma informação enganosa do candidato à reeleição, que aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenções de votos, que tenta aumentar as suas chances para ao menos levar a eleição para o segundo turno.
O projeto Estadão Verifica investigou e concluiu que a declaração de Bolsonaro sobre as vacinas é totalmente enganosa. “Até o final de 2020, mais de 50 países já tinham iniciado a vacinação, enquanto o Brasil só aplicou a primeira dose em 17 de janeiro de 2021”, diz a reportagem, lembrando dos cerca de 53 e-mails da farmacêutica Pfizer, com ofertas de vacinas, foram enviados a representantes do governo brasileiro e que ficaram sem resposta.
Quando confrontado sobre a corrupção em seu governo, que culminou com a prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, preso pela Operação Acesso Pago, da Política Federal, que investigava pagamentos de propina a pastores ligados ao ministro para que fossem liberados recursos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) a municípios, o presidente desconversou.
Outros ministros de Bolsonaro também são alvos de investigações, como Ricardo Salles, que ocupou o Meio Ambiente, e foi acusado de participar de um grupo de exportação ilegal de madeira. As investigações da Polícia Federal apontaram para a existência de um “esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais”, que teria o envolvimento de Salles e de gestores do ministério e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais).
Mentiras sobre desemprego, inflação e Pix marcam entrevista de Jair Bolsonaro ao JN
Questionado sobre economia, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o Brasil vive uma deflação e que o país tem índices “fantásticos” em comparação com o resto do mundo.
“Vivemos em um país com uma deflação. A taxa de desemprego tem caído. Os números da economia são fantásticos, se comparados ao resto do mundo. Pretendemos continuar com a política tocada desde 2019, com reformas, como a da Previdência, e a lei da liberdade econômica. A grande reforma da economia foi feita em 2019. Em 2020 e 2021, tivemos saldo positivo de quase 3 milhões de empregos. É sinal da competência da equipe econômica”, disse o presidente da República.
A declaração foi em resposta a pergunta sobre indicadores como a taxa de inflação, que mais que dobrou durante a gestão de Bolsonaro, a taxa de juros, que dobrou, e a cotação do dólar, que passou de R$ 3,90 para mais de R$ 5.
Bolsonaro citou que o país registrou deflação de 0,68% em julho, como se a inflação negativa estivesse espraiada por todo o país ao longo do ano, esquecendo-se de que o indicador, no acumulado do ano até julho, está em 10,07%. É a quarta maior taxa do G20, grupo dos 19 países mais ricos do mundo e um bloco com integrantes da União Europeia. Isso sem falar que o Brasil tem também a maior taxa de juros reais entre 40 países.
Além disso, o presidente não mencionou que a inflação só baixou devido a uma medida artificial, de desoneração dos preços dos combustíveis, energia e transportes, com o teto baixado do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), prevista para durar apenas até o fim de seu mandato, e que a população mais pobre sequer sentiu o efeito dessa deflação, já que os alimentos continuam apresentando alta de preços.
O economista Eduardo Moreira afirmou no ICL Notícias de hoje (23) que durante os anos de 2020 e 2021 o Brasil teve a maior inflação do mundo: “Nosso país é o segundo maior produtor de alimentos e tinha capacidade de ter amortecido a inflação de alimentos”, disse Moreira, lembrando que hoje 33 milhões de brasileiros passam fome. “Agora, o governo está comprando crescimento”, afirmou o economista se referindo ao pacote eleitoreiro de Bolsonaro.
O presidente Jair Bolsonaro também mentiu na entrevista ao JN quando comparou dados do emprego de seu governo com o da ex-presidente Dilma Rousseff. O presidente disse que, em 2014 e 2015, houve perda de quase 3 milhões de empregos no Brasil.
A informação foi verificada pela equipe do Estadão Verifica, que concluiu ser falso o dado apresentado pelo presidente. “Dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), publicados pelo Ministério do Trabalho em 2015, apontam que o Brasil perdeu 1,5 milhão de vagas de emprego formal naquele ano, mas registrou um saldo positivo de 623 mil em 2014. O déficit entre os dois anos citados por Bolsonaro, portanto, foi de cerca de 877 mil empregos”, diz.
A reportagem cita ainda as informações do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) da época, apontando que, em 2014, o Brasil registrou um saldo positivo de 420 mil empregos, seguido por um fechamento de 1,54 milhão de vagas.
Sobre o Pix, Bolsonaro afirmou: “Fizemos o Pix, tirando dinheiro dos banqueiros”. Vale ressaltar que Bolsonaro não é o criador do Pix. O Banco Central iniciou o processo de criação da plataforma de transferência instantânea em 2018, durante o governo Michel Temer. O presidente do BC na época era o economista Ilan Goldfajn. Em maio de 2018, cinco meses antes de Bolsonaro ser eleito, o BC criou um Grupo de Trabalho denominado “Pagamentos Instantâneos” para produzir as especificações do sistema que viria a ser o Pix.
E é claro que os bancos não perderam dinheiro com o Pix. Aliás, o setor bancário é a favor do Pix. A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) afirmou que o Pix tem apoio e entusiasmo de todo o setor bancário. “Os números do Pix revelam o grande engajamento dos bancos: 21,5 bilhões de transações com R$11 trilhões de volume financeiro movimentado até julho de 2022 por mais de 131 milhões de pessoas físicas e jurídicas que já utilizaram o Pix por meio de 478 milhões de chaves cadastradas”, justifica a instituição.
Recentemente, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, desmentiu Bolsonaro e disse que não é verdade que os bancos perdem dinheiro com o Pix, e que, inclusive, a instituição, em algum momento, vai soltar um tipo de estudo sobre o assunto. “Você tem uma perda de receita em transferência, mas por outro lado novas contas são abertas, novos modelos de negócio são gerados, você retira dinheiro de circulação, que é um custo enorme para o banco, você aumenta a transação, o transacional aumenta”, disse Campos Neto, em evento da Febraban.
O economista Eduardo Moreira explicou no ICL Notícias de hoje que o Pix “é um projeto para os bancos”, já que acabou com a possibilidade de o cidadão transferir dinheiro por meio de outros aplicativos, como o WhatsApp, o que favoreceria uma competição saudável, de acordo com Moreira.
Mentiroso, o presidente também deu informações falsas a respeito da conclusão das obras de Transposição do Rio São Francisco, que estavam paradas desde 2012. Na verdade, ao menos 92,5% da execução física dos dois eixos estruturantes do projeto estavam prontos quando Bolsonaro assumiu o governo, em janeiro de 2019. Um deles, inclusive, foi inaugurado por seu antecessor, o ex-presidente Michel Temer.
A série de entrevistas realizada pelo Jornal Nacional terá Ciro Gomes (PDT), nesta terça-feira (23); Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na quinta (25); e Simone Tebet (MDB), na sexta (26).
Redação ICL Economia
Com informações de O Globo, O Estado de S.Paulo, Folha de S. Paulo e UOL
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