O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, já anunciou tarifas contra México, Canadá e China, e o próximo alvo pode ser o Brasil. Mais de uma vez, o republicano de extrema direita reclamou das altas tarifas brasileiras, e essa pode ser a justificativa para que os produtos brasileiros sejam os próximos alvos do tarifaço de Trump.
Se isso ocorrer, o presidente Lula (PT) promete devolver na mesma moeda. Porém, a tarefa não é tão simples assim.
Segundo informações do blog da jornalista Míriam Leitão, em O Globo, nos últimos 20 anos, nada indica que as tarifas brasileiras tenham sido entrave para entrada de produtos americanos. Isso porque, desde 2009, a balança é deficitária para o lado brasileiro. No acumulado de 2004 a 2024, o Brasil tem um saldo negativo de US$ 52,73 bilhões em relação aos Estados Unidos, o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China.
No mesmo período, ainda de acordo com a coluna, o Brasil registra um superávit de US$ 315,21 bilhões com a China. Talvez esteja aqui uma das explicações.
“É complicado falar, pois o critério de Trump não só a questão comercial, como ficou claro no acordo firmado para suspensão da elevação de tarifas com Canadá e México. Para o Brasil, com quem tem uma relação deficitária, pode haver uma atuação pontual em setores nos quais há um forte lobby, como o da siderurgia, o de carnes, que recentemente se queixou de concorrência desleal dos fabricantes brasileiros”, disse à coluna Lia Valls, pesquisadora associada do FGV Ibre e professora da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
“Há o risco até de ressuscitar a polêmica com os estados produtores de laranja que mantinham uma pressão contra a entrada do suco brasileiro. O petróleo, principal produto da exportação brasileira para os EUA, deve ter tratamento diferenciado, assim como aconteceu no projeto de elevação de tarifas relativas ao Canadá”, completou.
Conforme mostraram os desdobramentos desde que a sobretaxação de produtos canadenses e mexicanos, Trump dobra a aposta para retirar do oponente o que quer. No caso, obteve dos dois países o compromisso de tomarem medidas para controlar a imigração irregular, no caso do México, e combate ao tráfico de drogas do Canadá para os EUA.
Mas, para a professora da Uerj, a estratégia de Trump pode ser um “tiro no pé”. “Essa política pode se tornar, no entanto, um tiro no pé, levando seus principais parceiros, como México e Canadá, por exemplo, a buscar ampliar acordos comerciais com a União Europeia. Os aliados podem entender que diversificar é a melhor opção, afinal a política tarifária de Trump tem sido errática até aqui e, diante de tanta incerteza, a tendência é de paralisação dos negócios”, observou. Contudo, como ela mesma disse, diversificar, além de ser um caminho longo, não é fácil.
Brasil deve evitar acirrar os ânimos contra Trump
Como o Brasil tem na China seu principal parceiro comercial, o país deve evitar acirrar os ânimos de Trump.
“A diplomacia vem atuando nesse sentido. Não à toa, o embaixador Mauro Vieira já deu entrevista falando que não há projeto de criação de moeda dos Brics [bloco que originalmente reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul]”, disse. “O fato é que a incerteza instalada por Trump dificulta, trava o comércio exterior. Se não se sabe o que vai acontecer, a primeira reação é suspender os negócios. Nesse contexto, o Brasil precisa esperar para entender o que vai acontecer”, aconselhou.
Por sua vez, o presidente Lula reiterou mais uma vez, na quarta-feira (4), que vai haver reciprocidade se Trump decidir taxar os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos.
“É o mínimo de defesa, o governo merece utilizar a lei da reciprocidade. Você tem na Organização Mundial do Comércio [OMC] uma permissão para que possa taxar qualquer produto até 35%. Para nós, o que seria importante seria os EUA baixarem a taxação e nós baixarmos a taxação. Mas se ele e qualquer país aumentar a taxação do Brasil, nós iremos taxá-los também. Isso é simples e muito democrático”, disse Lula, ao ser questionado sobre o tema em entrevista às rádios mineiras.
Na semana passada, o petista lembrou que já governo o Brasil com presidente republicano. “Eu já governei o Brasil com presidente republicano, já governei com presidente democrata. E a minha relação é sempre a mesma, a relação é de um Estado soberano com outro Estado soberano. O Trump foi eleito para governar os Estados Unidos e eu fui eleito para governar o Brasil”, afirmou Lula.
Um dos alvos de Trump tem sido o Brics, mais especificamente a ideia, defendida por Lula, de criação de uma moeda substituta ao dólar. O presidente dos EUA ameaçou dizendo que, se a proposta for concretizada, os países do bloco enfrentarão “tarifas de 100%”.
“Não há chance de que o BRICS substitua o dólar dos EUA no comércio internacional, ou em qualquer outro lugar, e qualquer país que tentar deve dizer olá para as tarifas e adeus para a América”, escreveu o presidente republicano na rede Truth Social.