O presidente Lula (PT) sancionou, com vetos, a lei que cria um programa especial de renegociação da dívida dos estados, e governadores que seriam os mais beneficiados com a medida já começam a reagir negativamente aos pontos vetados.
A sanção foi publicada nesta terça-feira (14) no Diário Oficial da União. Na semana passada, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, havia informado que a equipe econômica e a Casa Civil recomendaram os vetos.
As dívidas estaduais somam atualmente mais de R$ 765 bilhões — a maior parte, cerca de 90%, diz respeito a quatro estados: Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
Agora, esses governadores já ameaçam não aderir ao programa, segundo reportagem da Folha de S.Paulo.
Segundo a reportagem, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul estão entre os que avaliam não aderir ao chamado Propag (Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados), pois consideram que as regras sancionadas por Lula são prejudiciais no curto prazo. Minas Gerais também pode sair perdendo no começo, mas ainda avalia aderir de olho em benefícios de longo prazo.
São Paulo, detentor da maior dívida com a União, paga suas prestações em dia, sem descontos ou alívios temporários, e se beneficiaria da redução dos encargos futuros da dívida.
Nas redes sociais, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, se manifestaram sobre o tema.
Leite disse em sua conta no X (ex-Twitter) que recebeu a notícia dos vetos com “extrema preocupação e indignação”. “Os vetos trazem um prejuízo inaceitável para o povo gaúcho, gerando uma perda de cerca de R$ 5 bilhões dos valores que deveriam ficar aqui para investimentos na reconstrução após as enchentes”, postou.
Zema, por sua vez, também criticou a decisão. Segundo ele, os vetos impõem uma fatura adicional de R$ 5 bilhões entre 2025 e 2026 para o pagamento da dívida. No entanto, simulações da Fazenda estadual indicam um alívio potencial de até R$ 288 bilhões em 30 anos, já considerando o abatimento de 20% do estoque original da dívida a partir da entrega de ativos à União.
Por sua vez, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), falou em “duro golpe”, afirmando que o veto ao uso do FNDR “mata o programa” e acusou o governo federal de “falta de compromisso com o diálogo institucional”.
Entenda os pontos vetados da renegociação da dívida dos estados
Chamada de Propag, a renegociação está aberta até 31 de dezembro deste ano para os estados que quiserem aderir. A principal novidade do programa é que os governos estaduais podem quitar parte da dívida com a União transferindo bens móveis ou imóveis, participações societárias, créditos com o setor privado e outros ativos com a União. Dessa forma, empresas estaduais podem passar para o controle da União em troca do abatimento dos débitos.
A lei permite que os entes paguem esses débitos em até 30 anos e com juros de 0% a 2% ao ano acima da inflação.
Pelo programa, as parcelas pagas pelos estados à União serão calculadas e corrigidas mensalmente, com possibilidade de amortizações extraordinárias e redução dos valores nos primeiros cinco anos. Porém, durante a vigência do contrato, o estado que aderir ao Propag não poderá contratar novas operações de crédito para o pagamento das parcelas refinanciadas, sob pena de desligamento do programa.
Dois vetos são considerados os mais críticos pelos estados. Um deles afeta estados que hoje estão no RRF (Regime de Recuperação Fiscal), programa de socorro criado em 2017 para entes em grave situação financeira. Lula derrubou a possibilidade de os estados que aderirem ao Propag continuarem tendo apoio da União para honrar dívidas com instituições financeiras e organismos multilaterais.
Hoje, o governo federal paga as prestações desses contratos e incorpora o valor ao estoque da dívida com a União, livrando os estados de um desembolso imediato. O Legislativo chegou a prever a manutenção dessa blindagem no texto do Propag, mas o trecho foi vetado por Lula sob recomendação da equipe econômica.
O segundo veto mais criticado derrubou a possibilidade de usar o FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional), criado na reforma tributária do consumo, para abater parte da dívida com a União.
O FNDR vai receber repasses bilionários do governo federal a partir de 2029, que serão usados pelos estados para promover incentivos à atividade produtiva em regiões menos desenvolvidas. O texto autorizava a entrega dos direitos sobre esses valores futuros para deduzir parte do saldo devedor e obter o desconto máximo nos encargos da dívida.
O governo federal considerou o artigo inconstitucional, mas entre secretários estaduais há desconfiança de que o veto buscou minimizar as vantagens para São Paulo, que possivelmente usaria o dispositivo para acessar o programa e obter um alívio de caixa bilionário.
Cerne do projeto foi mantido
Os pontos sancionados, contudo, mantêm o cerne do projeto apresentado no ano passado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e aprovado pelo Congresso no fim do ano passado.
A princípio, o governo tinha proposto que os estados que investissem em educação pagassem menos juros. O Congresso abandonou a proposta e votou o projeto de Pacheco, que permite que os estados que aderirem ao Propag deem prioridade a investimentos em educação, saneamento, infraestrutura e segurança com o dinheiro que economizarão no pagamento de juros.
O ministro da Fazenda disse que o governo concedeu mais do que os cinco principais governadores de oposição pediam.
“O projeto aprovado pelo Congresso é muito além do que eles me pediram nas reuniões que fizeram comigo. Faz parte da vida política criticar, mas acho que eles nem sonhavam que fosse possível um ato do Presidente da República tão republicano quanto o que foi tomado”, declarou o ministro.
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