Coube ao novo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, que está há 10 dias no cargo, escrever a tradicional carta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, explicando o porquê de a inflação ter estourado o teto da meta em 2024. Galípolo afirmou que o principal motivo para o desvio da inflação em relação à meta de 3,0% em 2024 foi a depreciação cambial, ocasionada principalmente pelo cenário fiscal doméstico. O documento foi divulgado nesta sexta-feira (10), após o fechamento do mercado financeiro.
Hoje, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que a inflação oficial de 2024, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) fechou em 4,83%, acima, portanto, do teto da meta definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), fixado em 4,5%.
O real acumulou queda de 27,36% em relação ao dólar em 2024, e foi apontada como um dos principais fatores que impulsionaram os preços dos alimentos, ajudando a impulsionar a inflação.
Na carta, Galípolo também citou o ritmo forte de crescimento da atividade econômica brasileira e os eventos climáticos como razões que explicam o descumprimento da meta, assim como o aumento das expectativas de inflação.
“Os principais fatores que contribuíram para o desvio de 1,83 p.p. da inflação em relação à meta foram a inflação importada (contribuição de 0,72 p.p.), a inércia do ano anterior (0,52 p.p.), o hiato do produto (0,49 p.p.) e as expectativas de inflação (0,30 p.p.). Dentro do grupo inflação importada, a principal contribuição adveio da depreciação cambial (efeito de 1,21 p.p.), seguida das commodities em geral, medidas pelo Índice de Commodities – Brasil (IC-Br) (efeito de 0,10 p.p.), as quais mais que contrabalançaram os efeitos estimados da queda do preço internacional do petróleo (efeito de -0,59 p.p.)”, aponta Galípolo em trecho da carta.
Essa é a oitava vez que a meta é descumprida desde 1999. Nos últimos quatro anos, foram três estouros. Sempre que a meta é descumprida, o presidente do BC tem de prestar esclarecimentos ao ministro da Fazenda e citar os motivos pelos quais não teve êxito em sua principal missão institucional.
Lembrando que em três dos seis anos de seu mandato, o ex-presidente do BC, Roberto Campos Neto, descumpriu a meta, sendo o recordista. Ele deixou o cargo no fim de dezembro do ano passado, sendo substituído por Galípolo.
Carta de Galípolo destaca alta do dólar
A carta destaca ainda que a taxa de câmbio subiu de R$ 4,95 na média do último trimestre de 2023 para R$ 5,84 na média do mesmo período em 2024, uma variação de 18,0%. Considerando a média em dezembro de 2023 e de 2024, a taxa de câmbio aumentou de R$ 4,90 para R$ 6,10, uma variação de 24,5%, que corresponde a uma queda do real de 19,7%.
Ele aponta ainda que a depreciação cambial começou em abril e se intensificou ao longo do ano, principalmente por fatores domésticos, embora a valorização do dólar globalmente devido à perspectiva de um corte de juros mais lento nos Estados Unidos e à expectativa de mudança na economia com a eleição de Donald Trump também tenha influenciado.
Como vetor doméstico da alta do dólar, ele também citou a frustração de agentes econômicos com o cenário fiscal.
“O fato de o real ter sido a moeda de maior depreciação em 2024, considerando seus pares ao nível internacional e os países avançados, sugere que fatores domésticos e específicos do Brasil tiveram papel expressivo nesse movimento cambial. No âmbito doméstico, a percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio”, diz outro trecho da carta.
Sobre o tema fiscal, a Gavekal Research, uma das consultorias mais respeitadas por grandes investidores, divulgou uma análise com viés otimista sobre o Brasil. O analista Udith Simand reconhece que a relação entre dívida líquida e PIB de 85% realmente é alta para um país emergente e se assemelha mais a economias desenvolvidas como Reino Unido e Japão.
Porém, o autor do texto vê boas perspectivas para o país. “A boa notícia é que o atrito com o Banco Central deverá diminuir. Gabriel Galipolo — nomeado por Lula como novo dirigente — é bem-visto pelos mercados e já votou a favor de novas altas de juros”, disse, em referência às críticas contundentes, mas corretas, do presidente Lula (PT) a Campos Neto.
Clique aqui para ler a íntegra da carta de Gabriel Galípolo.
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