Em carta a clientes, Ian Bremmer, cientista político norte-americano que é o fundador e presidente do Eurasia Group, uma das maiores empresas de consultoria de risco do mundo, fez uma análise bastante crítica do “tarifaço” promovido pelo presidente Donald Trump e suas consequências planetárias.
Trump aumentou drasticamente as tarifas médias dos EUA para mais de 22%, afetando severamente o comércio internacional, especialmente com a Ásia. A medida, batizada de “Dia da Libertação”, visa reposicionar os EUA como uma economia protegida, forçando outros países a aceitar suas condições comerciais.
Bremer critica a forma caótica como as decisões foram tomadas, sem base em análises econômicas sólidas, com forte impacto nos mercados financeiros e risco de recessão. Trump adotou uma fórmula de tarifas baseada no déficit comercial com cada país, penalizando inclusive nações pobres e aliadas próximas, mas poupando países como Rússia, Belarus e Coreia do Norte.
“Estamos testemunhando o componente econômico do mundo G-zero. Os Estados Unidos não querem mais ser o líder global de um sistema multilateral de comércio livre ou o principal motor da globalização — os dois componentes econômicos fundamentais da antiga ordem que os americanos construíram ao longo dos últimos 80 anos. Em vez disso, o presidente Trump se tornou o principal disruptor do consenso de Washington, remodelando a ordem econômica em um sistema onde os Estados Unidos podem usar seu tamanho de mercado, o status de moeda de reserva global e o poder econômico coercitivo para forçar outros países a se submeterem às suas exigências, reduzindo suas próprias tarifas e redirecionando seus investimentos para os Estados Unidos”, escreveu..
O documento também antecipa possíveis reações: países pequenos tenderão a ceder, enquanto grandes economias buscarão negociar. A União Europeia pode retaliar, e a China já respondeu com tarifas recíprocas, dando início a uma guerra comercial total.
Bremmer alerta que essa mudança marca uma nova era de fragmentação econômica global, com mais protecionismo e menos integração, dificultando previsões de crescimento mundial. Ele argumenta que os EUA estão repetindo um “Brexit global”, corroendo sua credibilidade e influência ao agirem unilateralmente.
Por fim, comenta a frustração de Trump com Putin após um cessar-fogo falhado entre Rússia e Ucrânia. Com Putin se recusando a negociar com Zelensky, há chances de o acordo colapsar. Nesse caso, a China poderia emergir como mediadora, sendo o único país com real influência sobre Putin.

Ian Bremer
Os principais pontos da análise sobre as medidas de Trump:
1. Nova política tarifária dos EUA e “Dia da Libertação”:
O presidente Trump anunciou um aumento massivo nas tarifas de importação, elevando a média para 22%, a maior em mais de um século. A medida foi apresentada como um esforço para “libertar” a economia americana da globalização, atingindo especialmente países da Ásia, como a China. A decisão surpreendeu o mercado, gerando uma das maiores quedas em dois dias desde a crise de 2008.
2. Processo caótico e sem base técnica:
Bremmer destaca a falta de análise ou lógica econômica na decisão. A fórmula utilizada impôs tarifas altas a países com superávit comercial com os EUA, independentemente de contexto ou reciprocidade. Países aliados como Israel, Argentina e Hungria foram penalizados, enquanto adversários como Rússia e Coreia do Norte foram poupados por razões estratégicas.
3. Reação global e tensões diplomáticas:
A expectativa é que países menores capitulem rapidamente, buscando acordos diretos com Trump. Já grandes potências como Canadá, Japão e Índia tentarão negociar. A União Europeia pode retaliar com tarifas próprias, e a China já iniciou uma guerra comercial em resposta, igualando as tarifas impostas pelos EUA.
4. Reconfiguração do comércio internacional:
Segundo Bremmer, essa política marca um ponto de inflexão na globalização. A fragmentação econômica aumentará, com países adotando políticas “nacionalistas” para se proteger de retaliações indiretas. A confiança no mercado americano caiu drasticamente, afetando investimentos e a imagem global dos EUA como líder econômico confiável.
5. Impasse entre Rússia e Ucrânia e papel da China:
Trump enfrentou frustração com Putin após o fracasso do cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia. A recusa de Putin em negociar com Zelensky, aliada a exigências inaceitáveis para a Europa, ameaça desfazer o acordo. Caso isso ocorra, a China pode assumir o protagonismo como mediadora, sendo o único ator com influência sobre Moscou — algo com implicações geopolíticas relevantes para o equilíbrio de poder global.
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