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Juliana Dal Piva

Formada pela UFSC com mestrado no CPDOC da FGV-Rio. Foi repórter especial do jornal O Globo e colunista do portal UOL. É apresentadora do podcast "A vida secreta do Jair" e autora do livro "O negócio do Jair: a história proibida do clã Bolsonaro", da editora Zahar, finalista do prêmio Jabuti de 2023.

‘Gabinete do ódio’ faturou quase R$ 100 mil com deputados do PL e do PP em 2023

Ramagem pagou R$49 mil por serviços, quase metade do faturamento da empresa
19/02/2024 | 15h01

Matheus “Zuero”, integrante do que ficou conhecido como “gabinete do ódio”, com o deputado federal Carlos Jordy (PL–RJ) e o deputado estadual Gil Diniz (PL–SP)

Com colaboração de Laura Kotscho

A agência Mellon Comunicação e Marketing Ltda., criada por fundadores do chamado “gabinete do ódio”, recebeu R$ 93.301,74 em pagamentos por “serviços de assessoria” prestados a três deputados do PL (Partido Liberal) e um do PP na Câmara dos Deputados.

Fundada em maio do ano passado por José Matheus Sales Gomes, Leonardo Augusto Matedi Amorim e Mateus Matos Diniz, a Mellon Comunicação teve como principal cliente o deputado federal Alexandre Ramagem (PL–RJ). Investigado pela Polícia Federal por monitoramentos ilegais realizados pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no período em que era diretor-geral, Ramagem pagou R$ 49 mil pelos serviços contratados em 2023 — quase metade do faturamento da empresa no ano passado.

Antes de abrir a agência, José Matheus, conhecido como “Zuero”, chegou a ser assessor de gabinete de Ramagem entre 13 de março e 14 maio de 2023. Na sequência, no dia 17 de maio do ano passado, fundou com Matheus Diniz a empresa Mellon Comunicação.

Matheus Diniz é conhecido como “Matheuzinho”. Os dois, junto com Tércio Arnaud Thomaz, formavam o “gabinete do ódio” no período em que foram assessores especiais da Presidência da República durante o governo Bolsonaro.

O bolsonarista Robinson Faria (PL–RN) é o segundo deputado mais lucrativo para a Mellon, gastou R$ 27 mil com a empresa no ano passado. Logo atrás estão os deputados Marco Feliciano (PL–SP) e Dr. Allan Garcês (PP-MA), que repassaram respectivamente R$ 9.400 e R$ 7.901,74 para a empresa dos fundadores do gabinete do ódio.

José Mateus Sales Gomes

Natural de Caucaia, na região metropolitana de Fortaleza, no Ceará, ele caiu nas graças de Carlos Bolsonaro em 2013 quando criou uma página no Facebook chamada “Bolsonaro Zuero”. No início, aos 21 anos, com ensino médio completo, conhecidos contam que não havia nada de política e intenção era imitar outras páginas de comediantes locais, como o “Suricate Seboso”, que se transformou em uma fonte de renda para os seus criadores. Mas depois que Carlos viu a página e o recrutou ele também ganhou o apelido de “Mateus Zuero”.

Em 1 de fevereiro de 2014, foi nomeado assessor dele na Câmara de Vereadores e tornou-se até companheiro nos jogos do Botafogo. Sem nunca ter assessorado um parlamentar, chegou a ter um salário bruto de R$ 9 mil. Ao mesmo tempo em que passou a assessorar Carlos, a página “Bolsonaro Zuero” passou a crescer com exaltação do nome da família Bolsonaro, mas também com ataques a políticos de esquerda, sobretudo Dilma Rousseff e Jean Wyllys. O Facebook chegou a derrubar a página duas vezes, mas ele retomou. Hoje ela se chama “Direita Vive 3.0” e tem 620 mil fãs. Quando Bolsonaro tomou posse, foi um dos primeiros a ser escalado por Carlos para integrar o gabinete do pai. Aos 27 anos, foi nomeado assessor especial da Presidência da República em 4 de janeiro de 2019, com um salário bruto de R$ 13,6 mil e auxílios de R$ 3,3 mil.

Tércio Arnaud Thomaz

Natural de Campina Grande, na Paraíba, Tércio também conquistou Carlos Bolsonaro por meio de uma página no Facebook. Ele criou a página “Bolsonaro Opressor”. Formado em Biomedicina em uma faculdade de Campina Grande, Tercio trabalhava como recepcionista em um hotel antes de atuar nos gabinetes da família Bolsonaro. Como tinha “Matheus Zuero”, Carlos o recrutou pensando em um assessor com perfil semelhante para o pai. Antes de ser nomeado, quando foi conhecer Bolsonaro, Tércio chegou a dormir no apartamento em que Jair Bolsonaro vivia em Brasília.

Nomeado em 26 de abril de 2017, Tércio passou a viver no Rio em um apartamento alugado por Jair Bolsonaro próximo ao condomínio onde o presidente possui residência. No fim de 2017, foi nomeado no gabinete de Carlos, mas seguiu viajando o Brasil com Jair Bolsonaro. Uma reportagem desta colunista, junto com os repórteres Igor Mello e Bruno Abbud no jornal O Globo, revelou durante a campanha de 2018 que Tércio não trabalhava na Câmara de Vereadores. A página “Bolsonaro Opressor 2.0” chegou a ter mais de 1 milhão de seguidores no Facebook, mas está desativada. Ele também foi um dos primeiros a ser nomeados como assessor especial da presidência com um salário de R$ 13 mil.

Matheus Matos Diniz

Natural de Fortaleza, no Ceará, o “Matheuszinho” como ficou conhecido entre o clã bolsonarista por ser “mais franzino”, nas palavras de quem o conhece. Formado há cerca de dois anos em Engenharia Elétrica na Universidade Federal do Ceará, ele ficou mais conhecido no círculo presidencial por ter se tornado aluno de Olavo de Carvalho, depois que foi fazer um intercâmbio acadêmico na Universidade de Missouri, em Kansas City, nos EUA, entre 2014 e 2015. Antes disso, era um jovem que postava mensagens de apoio ao combate ao racismo e críticas à construção da usina de Belo Monte.

Ao mesmo tempo em que se aproximou do “guru” Bolsonarista, ele também participava de grupos católicos. Ao retornar dos EUA, passou a dar palestras de cunho religioso e com as teorias de Olavo de Carvalho. Nesse período, também se aproximou de Carlos Bolsonaro, que conheceu em novembro de  2017. Ele defende a castidade, inclusive recomenda em seu Instagram que: “todo dia use cinto apertado, para que ele te lembre do seu compromisso”. Também defende que “não existe sexo fora do casamento. O que existe fora é uma tentativa de emular o sexo imitando seus acidentes”. Consta como assessor do gabinete da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom), mas quem trabalha no Palácio diz que ele atua junto com “Matheus Zuero” e Tércio. Desde 30 de janeiro de 2019, recebe R$ 10,3 mil, além de R$ 3 mil em auxílios.

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