Por Gabriela Moncau — Brasil de Fato
O governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), é alvo de críticas de movimentos populares com os quais historicamente tinha uma boa relação após defender a liberação da pulverização de agrotóxicos por drones. A fala aconteceu em um evento com empresários e agropecuaristas no Hotel Gran Marquise, no último 6 de dezembro em Fortaleza (CE).
Quando deputado, Elmano foi coautor da Lei Zé Maria do Tomé (nº 16.820/19), que fez do Ceará o primeiro e único estado do país a proibir a aplicação de agrotóxico por aviões. A restrição teve a sua constitucionalidade confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio do ano passado, quando a Corte negou a ação impetrada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), por entender que a norma é “protetiva à saúde e ao meio ambiente”.
Na última semana, durante o evento Cresce Ceará — promovido pelo Diário do Nordeste, o Banco do Nordeste e a Enel –, Elmano defendeu a aplicação de veneno nas plantações do estado. Afirmou, sob aplausos, que a Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) deve aprovar a aplicação de agrotóxicos por drones ainda em 2024. Ano este que, segundo relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), teve um aumento de 950% nos registros de contaminação por agrotóxicos.
“Quero dizer aos colegas do agronegócio que aqui estão que, pelo que tenho de informação, a Assembleia, até o final do ano, vota e resolve esse problema, para termos condição de, com um drone, utilizar herbicida na produção de frutas e outras produções necessárias”, declarou o governador cearense.
“Não consigo conceber que a legislação permita que um trabalhador pode encostar [com o equipamento] nas costas e vá usar herbicida, e não permita que o trabalhador com o drone o faça”, defendeu Elmano de Freitas. Em sua fala, considerou “muito mais digno” com a saúde do trabalhador que ele aplique o veneno pilotando um drone e, assim, defendeu que se faça “esse avanço no agronegócio”.
Reação a fala do governador
Em nota, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do qual Freitas foi assessor jurídico antes de se alçar a governador, classificou a postura como “contraditória para alguém que sempre acompanhou as lutas populares no combate ao uso de agrotóxicos”.
Para o MST, a medida representa “um grave retrocesso nas políticas de proteção ao meio ambiente e à saúde pública”, já que a pulverização aérea, “aumenta os riscos de contaminação do solo, das águas e da biodiversidade, além de comprometer a saúde das pessoas”. A prática, segue o movimento, também “causa conflitos nos territórios, incluindo o assassinato de trabalhadores”.
A própria lei escrita anos atrás por Elmano de Freitas, Renato Roseno (PSOL) e Joaquim Noronha (PRP) homenageia, no seu nome, um camponês, ambientalista e líder comunitário executado por sua luta contra o que chamava de “chuva de veneno”.
José Maria, conhecido como Zé Maria do Tomé, foi uma das vozes mais influentes da Chapada do Apodi em uma luta que culminou, em 2009, em uma lei municipal que proibiu o despejo aéreo de agrotóxicos na cidade de Limoeiro do Norte (CE). No ano seguinte, sofreu uma emboscada e foi morto com 19 tiros.
“É nosso entendimento que essa prática deve ser combatida e não regulamentada”, segue o MST, ao “exigir” que “o governo do Ceará reconsidere essa proposta e priorize políticas que garantam a soberania alimentar, por meio da produção de alimentos saudáveis nos territórios camponeses”.
O governador petista também foi criticado por pesquisadores, pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Fórum Cearense pela Vida no Semiárido, a Articulação Cearense de Agroecologia e PSTU.
“Causa-nos profunda perplexidade”, diz a CUT do Ceará em nota, que o governador “defenda uma proposta que desvirtua os pilares dessa legislação histórica” da qual foi coautor.
Se aprovada a liberação do uso de drones, avalia a central sindical, haverá “um grave retrocesso ambiental, social e sanitário, contrariando princípios e conquistas que têm colocado o Ceará como referência nacional e internacional em defesa da vida e do meio ambiente”.
O Brasil de Fato entrou em contato com o governo do Ceará e não teve resposta até o fechamento desta matéria. Caso venha o posicionamento, o texto será atualizado.
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