Depois de 20 dias conspirando contra a democracia brasileira nos Estados Unidos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) anunciou na segunda-feira (18) que abandonou o mandato, se dizendo perseguido por uma ditadura que não existe. Alegou que se continuasse aqui corria o risco de ter o passaporte apreendido por Alexandre de Moraes, a quem acusa de persegui-lo.
Como se viu, uma tese furada: Moraes negou o pedido de apreensão do passaporte do deputado.
Eduardo gasta o tempo nos EUA contando mentiras sobre o processo eleitoral de seu país, faz lobby contra Moraes e pede abertamente que o governo de Donald Trump dê um golpe no Brasil. A atitude de fugir para o território norte-americano foi criticada mesmo por bolsonaristas e até Jair Bolsonaro desaprovou a atitude e tentou fazê-lo desistir.
Apesar disso, um colunista da Folha de S. Paulo publicou neste sábado (22) que Eduardo foi o “grande vencedor da semana” (!). A justificativa é que o filho de Bolsonaro gerou “fato político” ao fugir para os EUA com o objetivo de denunciar suposta perseguição do STF.
Ou seja: mesmo aqueles personagens que geram manchetes pelos piores motivos podem ser considerados “vencedores da semana”. Um incentivo a mais para políticos mandarem às favas a ética e a civilidade.
No mesmo dia em que o filho 03 foi louvado pelo colunista, a Folha publicou notícia sobre o ataque massivo que uma repórter e uma fotógrafa do jornal estão sofrendo por parte de bolsonaristas, que as culpam pela prisão e condenação da golpista que escreveu em batom na estátua da Justiça “perdeu mané”. Obviamente, isso não é verdade. As duas apenas fizeram reportagem sobre a ação dos vândalos, essa é a profissão delas.
Elas tiveram fotos e dados pessoais divulgados nas redes, com acusações que podem servir de incentivo a extremistas para usar violência.
Esses fanáticos têm como um dos líderes justamente… Eduardo Bolsonaro.
Talvez o timing dos dois casos possa incentivar os jornalistas (especialmente os editores) a refletir sobre a maneira branda com que tratam o movimento de extrema direita cujo objetivo é atacar e subjugar as instituições democráticas. A imprensa é um dos alvos e os repórteres e fotógrafos são os que ficam mais expostos.
Gabriela Biló, Thaísa Oliveira, Thiago Herdy, Guilherme Amado, Natuza Nery e Juliana Dal Piva são alguns dos jornalistas que já foram objeto de ataques da tropa bolsonarista, mas a lista é bem mais extensa.
Não se pode ser isento diante dessa barbárie.
O colunista da Folha não é o único a tratar a fera com simpatia.
Difícil engolir entrevistas olímpicas de figuras como Ciro Nogueira, Silas Malafaia, Sóstenes Cavalcante, Rogério Marinho e outros sobre o cenário político brasileiro, sem que antes os jornalistas alertem o público de que se trata de integrantes do grupo que tentou dar golpe de Estado no país, que usa fake news como instrumento e o cinismo como estratégia.
A falta dessa contextualização equipara os pitacos de bolsonaristas à opinião de gente séria, que leva a política honestamente.
Dos tempos em que a imprensa se negava a tratar os seguidores de Jair Bolsonaro como movimento de extrema direita até os dias atuais se passou bastante tempo, já foi possível conhecer suas (más) intenções.
Pelo bem da democracia, o jornalismo não pode fingir ser isento e tratar feras como se fossem gatinhos.
A boca do bicho está aberta.
Ainda há tempo para evitar que sejamos engolidos.
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