ouça este conteúdo
|
readme
|
Uma equipe internacional de pesquisadores desenvolveu uma ferramenta baseada em Inteligência Artificial (IA) capaz de identificar lesões cerebrais associadas à displasia cortical focal, uma das principais causas de epilepsia refratária a medicamentos. O estudo foi publicado na revista JAMA Neurology.
A displasia cortical focal é uma malformação do córtex cerebral que pode dificultar o controle das crises epilépticas com medicamentos, tornando a cirurgia uma das principais opções de tratamento. No entanto, essas lesões costumam ser sutis e difíceis de identificar por exames convencionais, o que torna o diagnóstico e o tratamento um grande desafio.
A nova ferramenta, chamada MELD Graph, utiliza aprendizado de máquina para analisar imagens de ressonância magnética. Em um estudo com 1.185 participantes — 703 com displasia cortical focal e 482 controles —, a IA conseguiu detectar 64% das anormalidades que passaram despercebidas por médicos radiologistas. O algoritmo da MELD Graph está disponível publicamente e pode beneficiar mais de 4 milhões de pessoas no mundo que convivem com essa condição.

MELD Graph, utiliza aprendizado de máquina para analisar imagens de ressonância magnética (Foto: Reprodução)
Colaboração global para neurologia
O projeto foi desenvolvido no âmbito do Consórcio Enigma, uma rede internacional que reúne especialistas em neurologia, psiquiatria e genômica de imagem. O objetivo do grupo é aprofundar o conhecimento sobre o funcionamento do cérebro por meio da análise de ressonâncias magnéticas de alta resolução e dados genéticos de pacientes com epilepsia, Parkinson, Alzheimer, autismo, esquizofrenia e outras condições neurológicas.
A ferramenta foi criada por pesquisadores do King’s College London e do University College London, no Reino Unido. Já as imagens de ressonância magnética foram fornecidas por 23 centros de pesquisa em epilepsia de diversos países, incluindo o Instituto Brasileiro de Neurociência e Neurotecnologia (BRAINN), vinculado à Unicamp.
A professora Clarissa Yasuda, do Departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e integrante do BRAINN, destaca o impacto da nova tecnologia no tratamento de pacientes com epilepsia grave. “Nesses casos, adultos e crianças podem ter de 30 a 50 crises epilépticas por dia, sem resposta a medicamentos. A cirurgia pode ser a única solução, mas é um procedimento complexo. Essa ferramenta pode acelerar o diagnóstico, facilitar o planejamento cirúrgico e melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias”, explica.
Um avanço no tratamento da epilepsia
Além de auxiliar no diagnóstico e no planejamento de cirurgias, o MELD Graph pode contribuir para um maior entendimento da displasia cortical focal. Segundo o professor Fernando Cendes, coordenador do BRAINN, ainda há muito a ser descoberto sobre essa condição. “A inteligência artificial nos permite identificar padrões que seriam impossíveis de perceber sem essa tecnologia. Isso pode nos ajudar a responder perguntas fundamentais sobre a origem e o desenvolvimento dessa malformação cerebral”, afirma.
O impacto da ferramenta já pode ser visto na prática clínica. Luca Palma, pesquisador do Bambino Gesù Children’s Hospital, na Itália, relata que o MELD Graph conseguiu identificar uma lesão cerebral imperceptível em um menino de 12 anos que sofria crises epilépticas diárias e já havia tentado nove medicamentos sem sucesso. “Essa tecnologia pode ajudar a definir quais pacientes são candidatos à cirurgia e melhorar o planejamento do procedimento, reduzindo riscos, custos e otimizando os resultados”, destaca.
Com potencial para transformar o diagnóstico e o tratamento da epilepsia, a MELD Graph representa um avanço significativo para a neurologia e a neurocirurgia, oferecendo novas perspectivas para milhões de pacientes ao redor do mundo.
Relacionados
Uso da Inteligência Artificial cresce no Brasil, mas desigualdade de acesso persiste
Jovens impulsionam adoção da ferramenta, mas barreiras sociais limitam alcance
IA e saúde mental disparam como prioridade no mercado de trabalho, aponta pesquisa
66% dos profissionais já utilizaram ou utilizam ferramentas de inteligência artificial para suporte ou orientação no mercado de trabalho
Câmara aprova pena para quem divulgar imagens de nudez geradas por IA
Crime pode ser punido com reclusão de dois a seis anos