Por Ayam Fonseca*
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) determinou na última quinta-feira (12) que o município altere o nome de 11 ruas da cidade, pondo em prática a lei nº 15.717/13 e o Programa Ruas de Memória.
A lei — estabelecida em abril de 2013 — tornou possível a mudança de nome de ruas e logradouros públicos com referência a pessoas, datas ou fatos atrelados à grave violação dos direitos humanos. O programa Ruas de Memória — de 2016 — é um decreto municipal que visa por em ação a mudança progressiva do nome desses lugares.
A decisão da Justiça surgiu de uma ação civil pública (ACP) na qual o Instituto Vladimir Herzog e a Defensoria Pública da União afirmam que, apesar de a lei ter sido criada há mais de 10 anos, e o programa municipal há oito, ambos não têm sido efetivos na prática.
Segundo dados da Comissão da Memória e Verdade e do programa Ruas de Memória, pelo menos 38 logradouros em São Paulo homenageiam pessoas vinculadas à ditadura militar, das quais 22 possuem envolvimento direto com a repressão.
Além disso, 17 equipamentos municipais, sendo eles 12 escolas e 5 ginásios também homenageiam colaboradores da ditadura.
O juiz autor da decisão, Luiz Manuel Fonseca Pires, da 3º Vara de Fazenda Pública do TJSP, destacou 11 casos considerados sensíveis e que devem ter o nome alterado. O juiz também deu o prazo de 60 dias para que seja apresentado um cronograma para a implementação da mudança.
“Apesar da ampla estrutura jurídica que lhe dá legitimidade, o direito à memória política de fato apresenta pouca ressonância nas políticas públicas. Vale lembrar, para exemplificar, a notória pesquisa nacional realizada em 2019 na qual cerca de 90% dos cidadãos brasileiros afirmaram desconhecer o que foi o ‘Ato Institucional nº 5’, simbolo maior da ditadura que dominou o país por 21 anos, de 1964 a 1985”, disse o juiz.
Veja as ruas e instituições que terão os nomes alterados:
- Crematório Municipal de Vila Alpina — homenageia diretor do Serviço Funerário do Município de São Paulo que dá nome ao crematório. Ele é uma pessoa controversa porque viajou à Europa para estudar sistemas de cremação em momento coincidente com o auge das práticas de desaparecimento forçado. Corpos exumados foram clandestinamente enterrados na vala de Perus no mesmo período de atuação do diretor no Departamento de Cemitérios da cidade.
- Centro Desportivo situado na Rua Servidão de São Marcos — Zona Sul de São Paulo: atribuído a general chefe do Centro de Informações do Exército (CIE) de novembro de 1969 a março de 1974. Ele liderou a Operação Marajoara que resultou no extermínio da Guerrilha do Araguaia.
- Marginal Tietê — Zona Norte/Centro: afirma-se que o marechal do Exército e ex-presidente do país (de 1964 a 1967) foi uma das lideranças do golpe de Estado de 1964 que instalou a ditadura militar e criou o Serviço Nacional de Informações (SNI), fundamentou perseguições políticas, torturas e execuções durante o período.
- Ponte das Bandeiras — Zona Norte/Centro: em 2017 a Câmara Municipal de São Paulo aprovou a mudança do nome da Ponte das Bandeiras em homenagem ao ex-senador e ex-diretor do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), órgão da repressão política durante a Ditadura Militar.
- Rua Alberi Vieira dos Santos — Zona Norte: trata-se de ex-sargento da Brigada Militar do Rio Grande do Sul e colaborador do Centro de Informações do Exército (CIE), com participação no massacre do Parque Nacional do Iguaçu e na armação de emboscadas e chacinas de resistentes, detenções ilegais, execuções, desaparecimento forçado de pessoas e ocultação de cadáveres.
- Rua Dr. Mario Santalucia — Zona Norte: foi médico-legista do Instituto Médico Legal e teve participação em caso de emissão de laudo necroscópico fraudulento.
- Praça Augusto Rademaker Grunewald — Zona Sul: vice-presidente durante a ditadura entre 1969-74, no governo Médici, o período mais intenso de repressão, censura e cassação de direitos civis e políticos.
- Rua Délio Jardim de Matos — Zona Sul: integrou o gabinete militar da Presidência da República do governo Castelo Branco e foi um dos principais articuladores do movimento que promoveu o golpe de Estado de 1964.
- Avenida General Enio Pimentel da Silveira — Zona Sul: segundo consta no pedido inicial, serviu no Destacamento de Operações de Informações — Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) do I Exército de abril de 1972 a junho de 1974. Teve participação comprovada em casos de tortura, execução e desaparecimento forçado.
- Rua Dr. Octavio Gongalves Moreira Junior — Zona Oeste: trata-se de Delegado de Polícia com participação em casos de tortura e ocultação de cadáveres.
- Rua Trinta e Um de Março — Zona Sul: dia do golpe civil-militar.
*Estagiário sob supervisão de Chico Alves
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