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Justiça de SC condena vereador do PL de Joinville por comentário homofóbico e sorofóbico

A postagem de Profeta usava expressões pejorativas, além de trazer aspectos da vida familiar e afetiva das vítimas
20/12/2024 | 05h21

Por Amanda Miranda — Newsletter Passando a Limpo

O juiz do 1º Juizado Especial Cível da Comarca da Capital, Luiz Claudio Broering, condenou o vereador de Joinville, Cleiton Profeta da Silva (PL), a indenizar o casal formado pelo vereador de Florianópolis, Leonel Camasão (PSOL), e seu marido Paulo Cordeiro Camasão, após divulgar, nas redes sociais, conteúdo homofóbico e sorofóbico — direcionado a pessoas que vivem com HIV.

O conteúdo chegou a ser alvo de uma publicação do Grupo de Apoio à Prevenção da Aids de Santa Catarina, destacando a Lei 12.984, de 2014, que pune condutas discriminatórias contra o portador do HIV e o doente de aids. “O fato de o réu ser vereador faz com que seus comentários públicos tomem grandes proporções, afinal, é a “opinião” de um representante do povo”, registra a petição que pediu a condenação do parlamentar.

A postagem foi feita no dia 16 de fevereiro nas contas de Profeta e usava expressões pejorativas, além de trazer aspectos da vida familiar e afetiva das vítimas. Também elaborava um discurso anti-vacina, apontando que Camasão “se diz preocupado com o filho dos outros e por isso defende a obrigatoriedade da aplicação de mRNA em crianças”. Na época, Camasão ainda não havia sido eleito ao cargo de vereador, o que ocorreu nas eleições de 2024.

No Portal da Câmara de Vereadores de Joinville, Profeta é apresentado como “vereador nascido em Joinville, em 14 de outubro de 1979, residente no Bairro Centro. Se candidatou pela primeira vez em 2020, recebendo 994 votos, e atualmente ocupa a vaga de primeiro suplente do PL”. Seu último projeto de lei “institui o Dia do CAC — Caçador, Atirador e Colecionador, no âmbito do município de Joinville-SC” e aguarda o parecer do relator.

O texto não citava os nomes do casal, mas trazia elementos discursivos que deixavam clara a direção da postagem. “Ele construiu um texto achando que estaria imune a alguma responsabilidade no âmbito cível ou criminal. Subjetivamente, isso já mostra aquilo que chamamos de animus injuriandi, ou seja, a vontade consciente e deliberada de ofender, de injuriar”, explica o advogado do casal, Rodrigo Sartoti, que reuniu um conjunto de provas, entre fotos e postagens, para sustentar o argumento.

Vereador de Florianópolis, Leonel Camasão (PSOL), e seu marido Paulo Cordeiro

Vereador de Florianópolis, Leonel Camasão (PSOL), e seu marido Paulo Cordeiro

Na sentença, para a qual ainda cabe recurso, o juiz indica que não se aplica a suposta imunidade parlamentar pelo fato de Profeta ser vereador de Joinville à época. “A homofobia e a sorofobia não podem ser consideradas como relacionadas ao exercício da função pública, por mais que o réu seja de direita, fazendo com que não esteja imune às consequências de sua publicação”.

O vereador de Joinville se defendeu dizendo que a postagem se referia ao “clube do carimbo”, grupo que transmitia HIV de forma intencional a crianças, por meio de violência sexual. O argumento, no entanto, não foi aceito pelo tribunal. “Não há nenhum elemento na publicação que se permita chegar a essa conclusão, até porque o réu se refere a um indivíduo específico, o que se denota pela flexão dos verbos no singular e pelo emprego de pronome demonstrativo masculino (“esse”)”, aponta a sentença, acolhendo a tese do casal.

A sentença também lembra que, apesar das diferenças políticas entre Profeta, Camasão e seu marido, não se poderia ter utilizado “a orientação sexual daqueles ou o diagnóstico de um deles para criticar as atitudes tomadas pelo autor Leonel enquanto militante de partido de esquerda”. Além disso, indica que o fato de o primeiro autor ser de esquerda não afeta a capacidade de ser pai e de cuidar dos filhos, como a postagem de Profeta sugeria.

Camasão celebrou a sentença em suas redes. “Além desse processo cível, há um inquérito na Polícia Civil de Joinville, no qual são investigados os crimes de injúria movida pelo preconceito (racismo no sentido amplo) e sorofobia. Iremos até o fim para buscar a condenação de políticos que tentam usar a imunidade parlamentar para cometer crimes. Iremos provar na Justiça que este é o caso em questão”, comentou.

Profeta também se manifestou em suas redes. “Em nenhum momento houve violação de direitos ou quaisquer atos discriminatórios direcionados aos autores”. Ele também disse que há uma tentativa de vitimização e promoção política, mas sem apresentar provas. “Eis o atual momento em que vivemos, onde qualquer fala, fora de contexto, pode ser motivo para uma demanda judicial”, lamentou.

Imunidade parlamentar

Segundo o advogado Lucas Mourão, especialista em causas relacionadas à liberdade de expressão, a constituição federal prevê que o vereador é imune “por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município”. No entanto, lembra ele, como qualquer direito, não é absoluto.

“O que está constitucionalmente protegido são as palavras e opiniões proferidas no exercício do mandato ou em razão dele. No caso concreto, é difícil imaginar como um xingamento gratuito e altamente preconceituoso em uma rede social de alcance global poderia ser compreendido como sendo parte do exercício do mandato ou derivado dele”, comenta.

Na sentença, para a qual ainda cabe recurso, o juiz indica que “a suposta imunidade parlamentar pelo fato de o requerido ser vereador de Joinville à época, a homofobia e a sorofobia não podem ser consideradas como relacionadas ao exercício da função pública, por mais que o réu seja de direita, fazendo com que não esteja imune às consequências de sua publicação”.

A justiça catarinense também reconheceu que “não se trata de mero dissabor, pois há comprovação cabal de que houve violação aos direitos da personalidade do requerentes, que fazem jus à devida reparação civil”. Além da condenação em R$ 10 mil, a sentença também condenou Profeta a, no prazo de até 15  dias, contados da intimação da sentença, realizar postagem se retratando e pedindo desculpa pela publicação e admitindo a ofensa “com expressões homofóbicas e sorofóbicas”.

 

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