Por Cristiane Sampaio — Brasil de Fato
Em despacho dado na tarde desta segunda-feira (5), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), nomeou os parlamentares que irão compor a comissão de conciliação do marco temporal no Supremo Tribunal Federal (STF) e escolheu como titulares Pedro Lupion (PP-PR) e Lucio Mosquini (MDB-RO), ambos integrantes da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), conhecida como “bancada ruralista”. Paralelamente, Lira deixou como 1ª suplente a bolsonarista Bia Kicis (PL-DF) e como 2ª suplente a deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG).
“É um absurdo eu, que ocuparia um lugar legítimo da defesa dos povos indígenas, ir pra essa mesa de conciliação pra ser suplente da bancada ruralista, de dois membros que são líderes da frente parlamentar do ‘passar a boiada’ e que tem interesse direto [no marco temporal]. Foram eles que pressionaram e votaram em regime de urgência o marco temporal ainda no mês de abril do ano passado, e depois foram eles que pressionaram para se votar o mérito. Eu imagino que a sociedade brasileira também receba isso com indignação”, disse Célia Xakriabá ao Brasil de Fato.
Lupion é o atual presidente da FPA, enquanto Mosquini atua na seção de Direito de Propriedade da frente e Bia Kicis na parte de Alimentação e Saúde. Já Xakriabá coordena atualmente a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas. Sendo assim, a escolha de Lira reproduz a histórica disputa política entre a FPA e o segmento indígena em torno da pauta agrária no Congresso Nacional e tende a atiçar o antagonismo entre os dois dentro e fora do Legislativo.
“Nós já sabíamos dessa postura, mas, a princípio, fui pessoalmente pedir a ele mais de uma vez [para ser titular], junto com a líder Erika Hilton, e ele falou que não teria contradição, desde que isso não fosse decidido por votação, mas nós sabemos que mesa de conciliação não é [decidida] por votação. Nesse sentido, não teria prejuízo ter uma mesa de equilíbrio. Me parece muito mais a mesma estratégia que foi usada na Comissão Externa para Acompanhar a a Crise Humanitária dos Yanomami [em 2023], quando foram indicadas 15 pessoas da bancada ruralista, que votam a favor do marco temporal, para ocupar as vagas e cuidar [da situação] do povo Yanomami”, associa Célia.
A parlamentar diz lamentar o que considera ser a utilização da pauta indígena para o jogo de toma lá dá cá do ambiente político. “E eu sempre disse que, se querem usar alguma pauta para atacar o governo, que usem outra, não a dos povos indígenas, que já são um caso muito doloroso, como é o caso do que ocorreu com o povo Yanomami e do que agora se passa com os Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul, por exemplo.”
Comissão e Lira
Além dos quatro deputados que integrarão a comissão, a representação da Câmara terá ainda um membro técnico titular e um suplente, bem como um consultor legislativo, sendo os três servidores do quadro efetivo da Casa. O despacho de Lira atende à conciliação agendada para começar nesta segunda (5), no STF.
A Corte havia rejeitado, em setembro do ano passado, a tese do marco temporal, mas pouco depois o Congresso Nacional aprovou essa releitura dos direitos territoriais indígenas, convertendo a tese em lei. Diante disso, o Supremo decidiu criar uma comissão especial para buscar uma conciliação sobre o assunto. O diálogo envolve lideranças indígenas, representantes dos estados, municípios, do governo federal e do Legislativo.
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