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A equipe de transição do governo eleito deve pedir a revogação de uma norma publicada pelo atual mandato, na sexta-feira passada (16), que flexibiliza regras para exploração de madeira em terras indígenas. O “plano de manejo florestal sustentável” atende a interesses de madeireiras, que vinham pressionando o Executivo para que fizesse medida nesse sentido. O documento é assinado pelos presidentes da Funai (Fundação Nacional do Índio), Marcelo Xavier, e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Eduardo Bim. 

Por lei, os recursos naturais dessas áreas podem ser utilizados apenas pelos próprios povos originários, como realizar pesca em determinadas regiões do Amazonas. Porém, a norma publicada na sexta-feira passada permite que esse tipo de exploração em terras seja feito por indígenas e, também, por não indígenas.

Em 2021, a Funai foi consultada pela Sollos, fabricante de móveis de madeira, acerca da viabilidade da criação de um “projeto-piloto” de plano de manejo sustentável para a Terra Indígena Baú, no Pará.

O ofício, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, indica que “não há impedimento legal” para tal atividade em terras indígenas, mas que ela carece de regulamentação. O documento ainda afirma que “estão sendo realizadas articulações interinstitucionais entre Funai e Ibama para a construção de uma instrução normativa conjunta” para resolver a questão.

O documento é da Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da fundação. Não é possível afirmar, no entanto, se a instrução à qual ele se refere é exatamente a que foi publicada na sexta (16), ainda que atenda à demanda da empresa.

A Sollos tem lojas em 15 países e, em seu site, diz que busca “integrar o melhor de nossa cultura às referências internacionais através do uso racional da madeira como matéria-prima, do controle dos processos e métodos de produção em concordância com todos os requisitos ecológicos e do investimento em equipamentos de última geração aliados a técnicas artesanais”. Procurada por meio de sua assessoria de imprensa, a empresa não se posicionou para a reportagem da Folha de S. Paulo.

Editada no Diário Oficial a duas semanas do fim do governo de Jair Bolsonaro (PL), o título da instrução normativa diz que ela é de “31 de outubro de 2022”, ou seja, em tese está pronta desde o dia seguinte ao segundo turno da eleição, da qual o atual presidente saiu derrotado.

Um dos focos da equipe de transição do futuro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sido justamente o chamado revogaço. Segundo o coordenador da equipe de transição, Aloizio Mercadante, foram entregues a Lula 23 páginas com possíveis normas a serem revogadas. A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) e o grupo de trabalho sobre questão indígena da transição também propuseram uma série de reversões relacionadas ao tema.

“As questões de normas e regulações estão sendo analisadas pelos grupos de trabalho de cada área, que irão encaminhar ao presidente e futuras autoridades de cada área as suas recomendações”, afirmou a assessoria de imprensa de Lula, que acrescentou ainda que, em que pese os relatórios temáticos já terem sido finalizados, novas informações ainda podem ser acrescidas.

Há, dentro do movimento indigenista, o debate sobre a regulamentação da atividade madeireira em terras indígenas. Há comunidades, inclusive, que demandam a criação de regras para a extração em terras.

Críticos da medida publicada afirmam que norma também permite obras em terras indígenas sem estudos de impacto

Além da questão da exploração de madeira em terras indígenas, críticos da medida apontam que ela também abre brechas para realização de obras sem a previsão de estudos de impacto ambiental.

“A instrução editada no final de mandato de um governo derrotado, sem consulta aos povos indígenas e à revelia da Constituição e do Estatuto do Índio, porque permite que não indígenas se apropriem dos recursos florestais que são destinados ao usufruto exclusivo dos indígenas”, afirma a advogada Juliana de Paula, do ISA (Instituto Socioambiental).

A norma publicada na sexta permite a exploração de madeira pelos indígenas, mas também por sociedades de composição mista, definidas como: “forma de associação ou cooperativa onde é admitida a participação de não indígenas, desde que essa participação seja inferior a cinquenta por cento (50%)”.

Além disso, segundo a advogada do ISA, a norma abre brecha para que sejam realizadas obras, como estradas e até edifícios, dentro dessas localidades sem a necessidade de estudo de impacto ambiental.

O artigo 15 do documento diz que podem ser realizadas, por meio de contratação, a “abertura de estradas, pátios e ramais” e a “construção de obras de arte especiais, tais como pontes, estradas, obras de drenagens e outras”, além de “edificações”.

“Para a realização do manejo florestal, a instrução prevê que poderão ser construídas estradas e edificações, mas não explica se essas atividades serão licenciadas nem como. Isso poderá gerar mais impacto sobre os indígenas e aumento do desmatamento”, afirmou ela à Folha.

Historicamente, os territórios indígenas concentram algumas das maiores áreas de floresta preservada do Brasil. Sob o governo Bolsonaro, contudo, o desmatamento nessas áreas disparou.

Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e da reportagem da Folha de S. Paulo

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