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Marielle confiava em Rivaldo, diz ao ICL sobrevivente de atentado

"Muita coisa chegou e foi engavetada na investigação", diz ex-assessora de vereadora
25/03/2024 | 13h57

Fernanda Chaves, única sobrevivente do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, deu entrevista ao ICL Notícias 1ª Edição. A ex-assessora e braço direito da vereadora durante seu mandato, quando foi a parlamentar de esquerda mais votada do Rio de Janeiro, relembrou fatos que, após a revelação sobre a participação do ex-chefe de Polícia Civil Rivaldo Barbosa no planejamento do crime, considera ainda mais estranhos.

“Primeiro passou um carro da Polícia Civil. Parou, mas foi embora, disse que viria outro carro responsável por aquele região, o que é meio esquisito”, recorda.

“Depois veio a Polícia Militar. O policial muito inábil pra lidar com aquela situação. Ele não chegou se identificando, já foi fazendo uma ligação da viatura antes de falar comigo. Eu não enxergava muito bem, estava cheia de sangue. Ele falou pelo telefone ou pelo rádio: ‘São dois mortos e uma sobrevivente’. Disse isso antes de olhar para mim. E eu só repetia ‘chama uma ambulância, chama uma ambulância, chama uma ambulância’.”

Rodrigo Vianna pediu à Fernanda um balanço político do crime. Em suas redes sociais, ela escreveu uma nota ontem em que diz que “foi preciso que um novo presidente fosse eleito para o crime ser resolvido”. Ela se disse chocada com a participação do ex-chefe de Polícia Civil Rivaldo Barbosa, uma pessoa em quem a própria Marielle confiava e com quem costumava lidar.

“O maior choque que eu tive foi com o Rivaldo Barbosa, a participação dele foi chocante. Recebi chocada essa notícia, de que ele estaria envolvido não só no processo de abafar a investigação, o que já seria bizarro. Foi mais do que isso. Rivaldo está desde a concepção, segundo o inquérito. Preparou o terreno para que o crime não fosse elucidado. Fiquei muito chocada, muito revoltada com essa informação”, disse.

MARIELLE TINHA INTERLOCUÇÃO COM DELEGADO

Segundo a ex-assessora e amiga de Marielle Franco, Rivaldo era visto como um homem progressista na Polícia Civil, alguém que tinha o respeito de Marielle.

“Não é novidade que os irmãos Brazão são relacionados com milicianos, constaram no relatório final da CPI das Milícias em 2008. A gente entende que poderia vir alguma coisa daí. Mas a participação do Rivaldo… Sempre tivemos interlocução com ele. Era uma figura de referência em segurança pública, tida como uma figura progressista dentro da Polícia Civil, uma pessoa confiável com quem Marielle lidava. Ele disse que era uma questão de honra para ele, resolver o crime. Ele estava com a gente, estava com a família.”

Sobre um homem infiltrado no PSOL, Fernanda disse que essa informação circulou no partido há cerca de quatro anos. Sabia-se inclusive que o homem teria algum envolvimento com milícia. Mais cedo, também em entrevista ao ICL Notícias 1ª Edição, Marcelo Freixo disse que eram dois infiltrados, um homem (Laerte Silva de Lima) e também uma mulher.

“Ronnie Lessa ouviu de Domingos Brazão que o infiltrado Laerte teria levantado que Marielle pediu para a população não aderir a novos loteamentos situados em áreas de milícia”, diz o relatório da Polícia Federal.

Em nota, o PSOL afirmou que, ao tomar ciência da filiação de milicianos infiltrados, encaminhou o caso para o diretório nacional solicitando expulsão, processo que ocorreu após alguns meses, “para evitar que este ato chamasse a atenção destes atores para as investigações em curso”.

“Esse caso tinha aparecido no PSOL e foi meio que menosprezado. Sabíamos que era um cara da zona oeste, um cidadão comum, sabíamos que de algum modo apoiava milícia. Isso foi meio que transformado numa coisa menor. Morreu o assunto, deve ter uns quatro anos isso. Muita coisa chegou e foi engavetada, foi escanteada na investigação. Hoje sabemos que ele foi colocado pelos irmãos Brazão.”

Ela relembrou o passo a passo daquela noite:

“Ainda convivo com as imagens, são muito nítidas. A gente ia pra casa, era comum estarmos juntas, pois morámos perto uma da outra. De repente vi uma metralhada, uma única rajada, não consegui perceber nenhuma aproximação antes. Eu estava ao lado dela, olhando as fotos do próprio evento de onde tínhamos acabado de sair. Eu não estava, e ela também não, prestando atenção no entorno. Anderson não esboçou qualquer preocupação. É Rio de Janeiro — na hora me passou isso pela cabeça. O vidro estourou com os tiros. Ela sempre gostou de ser copiloto, de ir na frente, ela quis ir atrás nessa dia para vermos as fotos, foi uma configuração incomum. Anderson esboçou dor, fez um ‘ai’, Marielle não. Percebi que o carro continuava em movimento, consegui ir pra frente, puxar o freio de mão e sair do carro. Ainda não tinha percebido que eles estavam mortos. Eu estava muito em choque e o lugar era muito escuro. Eu não estava enxergando bem por causa dos estilhaços e do sangue. Marielle estava encostada em mim. Eu gritava pedindo ajuda. Mexi na perna dela. Abri a porta e saí engatinhando. Sai olhando, abaixada, tentando me proteger, procurando de onde veio aquilo. Pra mim eles estavam desmaiados”.

 

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