A Comissão de Meio Ambiente do Senado aprovou ontem (4), por unanimidade, o projeto de lei que regulamenta o mercado de créditos de carbono no Brasil, com foco nas fontes que emitam, anualmente, mais de 25 mil toneladas de gás carbônico (CO2). No entanto, foi excluída a agropecuária, o que corresponde a um contrassenso já que esse setor é responsável por 75% das emissões, segundo dados da plataforma SEEG (Sistema de Estimativa de Emissão de Gases Estufa).
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o engenheiro florestal Tasso Azevedo, criador do SEEG, disse que deixar de fora a agropecuária é “ridículo”. “Exclui o setor que mais emite no primeiro artigo da lei. Qual o sentido disso?”, questionou.
O projeto aprovado no Senado cria o SBCE (Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões) e foi aprovado em caráter terminativo, o que dispensa votação em plenário, a menos que haja recurso de senadores. Se não houver contestação, o projeto seguirá diretamente para a Câmara.
O projeto foi articulado com o governo federal em reunião realizada na última terça-feira (3). O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, anunciou que um acordo havia sido construído para a votação do projeto. “Esse mercado será um exemplo para o mundo todo”, disse o ministro.
O mercado de crédito de carbono é um sistema usado para compensar a emissão de gases de efeito estufa. Ele beneficia empresas e países que poluem pouco e cobra daqueles que liberam mais poluentes na atmosfera.
O economista do ICL André Campedelli comentou o tema na edição de ontem do Mercado e Investimentos, live diária transmitida via redes sociais. Na avaliação dele, o mercado de crédito de carbono possui distorções, pois dá licença para que países poluidores poluam mais para desenvolverem sua economia, ampliando as desigualdades.
“O país de primeiro mundo que quer poluir mais compra créditos de carbono daqueles que poluem menos. Assim, o país não poluidor continuará para trás no desenvolvimento, enquanto o outro polui mais às custas do clima. Isso não resolve o problema ambiental, pois a poluição do norte chega aqui do mesmo jeito. Além disso, faz com que se tenha um aumento da desigualdade entre as nações”, observou.
O mercado crédito de carbono que o Brasil vai ganhar, segundo Campedelli, “acaba ficando nas mãos do mercado financeiro”. “Como dizia Chico Mendes, ‘ecologia sem consciência social é mera jardinagem’, e crédito de carbono é mera jardinagem. Para melhorar a questão climática, temos que pegar muito mais as questões estruturais. Não adianta só pensar em carro elétrico a partir de combustíveis fósseis. A gente tem que ter uma mudança estrutural de fato”, apontou.
Proposta para mercado de créditos de carbono sofreu alterações para atender pleito da bancada ruralista
A proposta do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sofreu alterações para contemplar demandas de senadores da bancada ruralista. A principal mudança foi a retirada das atividades agrícolas primárias da regulamentação.
O argumento usado pelos representantes do agro é a dificuldade de quantificar as emissões de gases geradores do efeito estufa nas atividades do setor. A retirada foi acatada pela relatora do projeto, senadora Leila Barros (PDT-DF).
“Não temos como medir a taxa de emissão do setor, então entendemos que não havia, no momento, necessidade de criar um campo de batalha”, afirmou a relatora.
Uma fonte entrevistada pelo Valor Econômico disse que a minuta que veio do governo Lula para o Senado foi muito bem estruturada.
A proposta, inspirada no modelo europeu, criaria um mercado muito avançado, fugindo da abordagem setorial, mas trabalhando, de início, de forma abrangente e com quem emite mais. Mas, ao retirar a agropecuária, a mercado nasce nanico.
“O PL é excelente para os 25% das emissões do Brasil, as mesmas que incomodam os países desenvolvidos, mas nada fala sobre o uso da terra, florestas e agricultura que é o que nos interessa enquanto país que busca um papel diferente no futuro”, disse a fonte que conhece bem o tema e muito bem o agro. “Mas, podemos corrigir passo a passo à medida que que andamos em relação ao futuro”, complementou.
Pelo texto aprovado pelo Senado, as empresas que emitem acima de 10 mil toneladas de gases de efeito estufa por ano precisarão apresentar relatório de suas emissões ao órgão que fará a gestão do mercado de carbono.
Além disso, também deverão informar as ações para remoção desses gases de efeito estufa da atmosfera, seguindo um plano de monitoramento que também vai requerer a aprovação do órgão gestor.
Quando as emissões ultrapassarem 25 mil toneladas ao ano, as empresas deverão enviar relato de conciliação periódica de obrigações.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e do Valor Econômico
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