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Nikolas Ferreira impulsiona venda de cursos e está na lista de maiores patrocinados na Meta

Empresa do deputado mineiro investiu R$ 71,9 mil no perfil do político nos últimos 30 dias
24/01/2025 | 12h20

Por Amanda Miranda — Newsletter Passando a Limpo

Com o rosto e o discurso vistos por mais de 300 milhões de vezes no vídeo em que gerou desinformação sobre o Pix, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) passa, agora, a capitalizar e transformar o viral em dividendos por meio do impulsionamento da sua empresa no Facebook e no Instagram. Na quinta-feira (23), um post da sua rede figurava entre o quinto mais impulsionado do Brasil, segundo dados da Biblioteca de Anúncios da Meta.

Nos últimos 90 dias, Nikolas Ferreira sequer aparecia entre os principais impulsionadores de conteúdo no Facebook e Instagram no Brasil, relação então liderada por Pablo Marçal, com mais de R$ 1,7 milhões investidos para fazer seu conteúdo chegar a mais gente.

Há um mês, o político mineiro passou a figurar entre os 20 maiores impulsionadores, estava em 18º. Há uma semana, subiu para sétimo. Nesta quinta-feira já era o quinto maior cliente do dia da big tech no Brasil. Os dados consideraram anúncios feitos até 20 de janeiro.

Na verdade, quem impulsiona o conteúdo do Nikolas não é ele próprio, mas a empresa Destra Cursos LTDA, que tem na sociedade, além de Nikolas, Arthur Torres de Assis e Ivens Henrique Grahl Ribeiro. Localizada na cidade de Goiânia, a empresa tem como atividade principal o comércio varejista de livros. A Destra está bancando os anúncios na página do deputado no mês de janeiro.

A empresa investiu R$ 71,9 mil no perfil do político nos últimos 30 dias. O impulsionamento não foi na página da empresa, mas na do deputado. Nikolas tem dois anúncios ativos na plataforma, ambos direcionam para um site no qual, em letras garrafais, há uma mensagem em fundo preto: “A verdade que eles NÃO querem que VOCÊ saiba!”.

Em vídeo, o deputado conta que sua plataforma de cursos está sendo atacada pelo jornalismo para silenciá-lo, em uma história conspiratória na qual insinua que repórteres chegaram a pedir demissão para não produzir materiais críticos sobre seus cursos. A plataforma é o produto à venda: um curso para “destruir as narrativas da esquerda e nunca mais ser manipulado”. O post patrocinado no Facebook, que remete a essa mensagem de Nikolas, também diz que alguém, que ele chama de “eles”, “têm medo do que vai acontecer quando mais pessoas tiverem acesso ao Cristão e a Política”.

O texto patrocinado também traz os emojis como recurso de marketing:

“📖 Medo de você aprender a identificar as mentiras.
🎯 Desmascarar as narrativas.
✊ Defender os valores que estão sendo atacados.
❌ Primeiro, compraram meu curso e assistiram todas as aulas para tentar me derrubar.
❌ Depois, derrubaram meu site.
❌ Agora, tentam calar até você.

Essa é a chance de fazer parte desse movimento que está incomodando tanto”.

O anúncio atingiu praticamente o dobro a mais de homens em relação às mulheres e foi mais exibido nos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Mas também atingiu em cheio a Região Sul, considerada como mais bolsonarista.

“Se querem guerra, vão ter guerra”, diz Nikolas no vídeo impulsionado em janeiro, antes de anunciar uma “super oferta” do curso “O Cristão e a Política”. Ele sugere que os cursos também são uma preparação para 2026. O conteúdo termina com um botão que vende as aulas da plataforma de Nikolas de R$685 por R$ 497. O site que vende os cursos também traz mensagens como “Política não é partido, é influência” e botões com a sentença “Quero ser a Luz no Mundo” que levam diretamente para a página de ofertas.

Não é novidade que Nikolas vende cursos para uma empresa que tem capital de R$ 300 mil, opta pelo Simples e foi fundada em setembro de 2022, um mês antes de Nikolas se eleger como deputado mais votado do país, com 1,47 milhões de votos. Há reportagens sobre o assunto, uma delas inclusive é usada no vídeo impulsionado como “denúncia” para dizer que está sendo perseguido.

A mistura da política com o negócio de cursos é usada por outros parlamentares. Em Santa Catarina, uma deputada estadual também tem empresa de venda livros com conteúdo conservador ao mesmo tempo em que exerce seu mandato. A Livraria Campagnolo tem mais de 21 mil seguidores no Instagram e em 2022 já anunciava promoções com o rosto da deputada estadual Ana Carolina Campagnolo (PL). O site vende itens como o “Guia de bolso contra mentiras feministas” com desconto — de R$ 37,90 sai por R$ 20,09.

Projeto de lei tenta proibir mandatos que monetizem “influencer político”

Os deputados Chico Alencar e Tarcísio Motta, ambos do PSOL-RJ, são os autores do Projeto de Lei 672/24 e estão atentos a esta nova dinâmica surgida a partir dos políticos que também atuam como influenciadores nas redes. A proposta que está sendo debatida proíbe políticos de serem remunerados pela divulgação de conteúdos, como publicações em redes sociais, incluindo áudio e vídeo, relacionados ao exercício do mandato ou produzidos com recursos públicos.

O projeto também proíbe que políticos recebam receitas em função de conteúdo produzido com emprego de recursos públicos. Por enquanto, tramita na Comissão de Administração e Serviço Públicos da Câmara. Chico Alencar explica que a ideia é defender a própria atuação parlamentar, que tem de ser de caráter exclusivamente público.

“A remuneração e as condições para exercício de mandato que temos, muito boas, visam garantir que você não precise de outros modos e meios de auferir recursos”, comenta. O parlamentar lembra que quem faz isso está, na verdade, promovendo uma indevida parceria público-privada do próprio mandato, privatizando-o, tentando ter ganhos adicionais a partir do que deveria ser o espírito público.

“É inaceitável, é antiético. Na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, a partir do episódio de um vereador que monetizava, fazia lacração, fazia ‘experimentos sociais’, entre aspas, e que acabava ganhando muitos patrocínios com isso, nós aprovamos o fim dessa monetização espúria”. Alencar se refere ao mandato cassado de Gabriel Monteiro, que era influencer nas redes sociais e produzia conteúdos que expunham cidadãos a constrangimentos, entre outras coisas.

“É preciso separar a atividade pública da atividade particular e privada sob pena de comprometê-la”, sintetiza Alencar, que também pensa que, sendo aprovado, o projeto deve inibir os parlamentares que têm milhões de seguidores e que ganham recursos com isso ou mesmo  com campanhas de arrecadação, como aconteceu quando o ex-presidente Jair Bolsonaro precisou pagar multas à justiça eleitoral. “Isso é uma depravação, uma deterioração, um desvirtuamento da atividade parlamentar”.

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