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Jessé Souza

Escritor, pesquisador e professor universitário. Autor de mais de 30 livros dentre eles os bestsellers “A elite do Atraso”, “A classe média no espelho”, “A ralé brasileira” e “Como o racismo criou o Brasil”. Doutor em sociologia pela universidade Heidelberg, Alemanha, e pós doutor em filosofia e psicanálise pela New School for Social Research, Nova Iorque, EUA

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O desabafo de Jojo Todynho

Questão principal aqui é compreender por que a barata escolhe votar no chinelo
18/09/2024 | 05h00

Uma mulher negra, artista com dezenas de milhões de seguidores, nascida em uma favela, declarou em um tom de desabafo, como uma verdade que precisava ser dita de qualquer jeito, que ela era uma “preta de direita”. Houve comoção e surpresa nas redes sociais. Mas a questão principal aqui é compreender por que a barata escolhe votar no chinelo, ou seja, se identificar com seu algoz, que existe para roubar o futuro e a esperança precisamente dos pretos e dos pobres.

E esta questão ainda é, infelizmente, muito mal compreendida no nosso país. Existem duas respostas a esta questão no mundo acadêmico e no espaço público: 1) ou se imagina que o “pobre de direita” é burro, um “minion”, um gado que segue seu opressor; e 2) uma outra versão mais acadêmica, mas não menos errada e superficial, que simplesmente culpa a orientação religiosa conservadora, sem, no entanto, perceber que a questão central é exatamente saber, em meio a tanta opção religiosa disponível, por que o pobre e o preto escolhem precisamente a moralidade evangélica mais arcaica e conservadora?

Para que a gente compreenda alguma coisa na sociedade é necessário ir às causas mais profundas, e num país como o nosso as causas mais profundas têm sempre um fundo racial. Jojo Todynho, como muitos negros que ascendem socialmente no nosso país, são consumidos pelo desejo de “embranquecer”. No Brasil, “embranquecer” não é deixar a pele branca como fez Michael Jackson, mas sim assumir como se fossem seus os valores dos opressores, ou seja, dos brancos e dos ricos.

Subjetivamente, essas pessoas, ao se identificarem emocionalmente e moralmente com os opressores, conseguem uma distância — imaginária, sem dúvida, mas na cabeça delas real — em relação à sua condição humilhante anterior.

Ou seja, não tem nada a ver com burrice nem com escolha religiosa. Mas sim com uma tentativa desesperada de reagir a uma condição social que é tão humilhante que qualquer boia de salvação que negue e reprima essa humilhação, a qual todo negro é condenado desde o nascimento, é recebida como um bálsamo bem-vindo.

A condenação do negro no Brasil não se confunde com a do branco pobre, do Sul e de SP que também tende a se identificar com Bolsonaro e com a extrema direita. É que o negro tem que lutar para afirmar sua condição humana, o que o branco pobre não tem. É o negro que é associado ao crime e é negro que pode ser morto sem causar comoção em quase ninguém. E para se libertar desse lugar infernal, qualquer coisa vale, mesmo que seja se unir com racistas como Bolsonaro e Michelle. Ai o negro assume o lugar social do branco no qual ele anseia e fantasia sua libertação.

Este é o tema, inclusive, do meu último livro “O pobre de Direita”, realizado a partir de centenas de entrevistas que realizei no país inteiro nos últimos três anos. Convido a todos para assistir a aula gratuita e exclusiva no dia 29 de setembro, um domingo, às 20h, com mediação do meu amigo Eduardo Moreira. Venha compreender melhor com a gente a mais importante questão política do Brasil de hoje que ainda não foi respondida a contento. Vocês não vão se arrepender!

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