Lula foi homenageado pela universidade francesa Paris 8 e fez um discurso sobre educação. Os universitários franceses falaram de liberdade. Lula falou do conhecimento como emancipação individual e da instrução como instrumento decisivo para o desenvolvimento. Vocês conhecem o discurso: o Peru teve a sua primeira universidade em 1554, o Brasil só a inaugurou em 1920. O resultado foi o analfabetismo e a elite do atraso.
Essa circunstância torna a igualdade de oportunidades a parte mais emotiva do discurso: desta vez foi a linda história do filho do coveiro de São Paulo que agora estuda no Instituto Rio Branco para ser diplomata. Como habitualmente, as melhores partes da fala do presidente foram os improvisos. Mas o que realmente impressionou quem não o via há muito tempo foi a impressionante forma física. Não, o tema do envelhecimento não vai colar. Lula está forte e está confiante.
Enquanto falava lembrei-me do que escreveu um artista brasileiro quando Lula foi preso: “(…) fim de linha para você metalúrgico boçal, ex-presidente aleijado, não é pelo triplex que você esta sendo condenado, é pela ousadia em ajudar o garçom a virar advogado, em contribuir para a ascensão do negro favelado, que agora acredita que pode estudar medicina, sair da miséria e atá conhecer a Capela Sistina(…)”. Grande parte do ressentimento social da direita encontra explicação nesta revolução democrática do ensino superior. Neste discurso, Lula mostrou que quer defender o seu legado. Não, o tema da idade não vai ter sucesso na campanha. Lula está forte e está pronto para a luta.
A França e o Brasil, outrora unidos pela aristocracia intelectual (as primeiras aulas nas primeiras universidades brasileiras eram em francês), unem-se agora pela democracia universitária — o saber deve ser para todos e não, como era antes, para os filhos das oligarquias cujo mérito sempre consistiu em “se darem ao trabalho de nascer”. A homenagem dos universitários foi à democratização do ensino universitário e à liderança política que ousou fazê-la. Quem lá esteve compreendeu — a universidade está sob ataque no Ocidente e a homenagem a Lula foi uma forma de reagir: não nos vamos entregar sem luta. Na sua batalha pela liberdade os universitários europeus procuram a solidariedade do único presidente brasileiro sem título académico.
Lula falou de educação e os professores de liberdade. A universidade ofereceu a Lula o poema “Liberté “de Paul Éluard: “pelo poder de uma palavra/ recomeço a minha vida/ nasci para te conhecer/ para te nomear/ liberdade”. Belíssimo poema com uma belíssima história por detrás. Foi escrito durante a ocupação nazi e dirigido à mulher do poeta que estava internada no hospital. Disse ele, mais tarde: “No final, pensei revelar o nome da mulher que amava, a quem o poema era destinado. No entanto, apercebi-me rapidamente que a única palavra que tinha na cabeça era a palavra liberdade”. Assim, a mulher que amava incarnou um desejo maior do que ela. Um dos mais belos poemas de intervenção política nasceu como poema de amor.
Mas há uma outra história, essa menos pessoal e mais política. O poema foi clandestinamente levado para Inglaterra e foi mais tarde lançado por aviões aliados em toda a Europa ainda ocupada. Esta ação teve um impacto extraordinário no moral dos franceses que sentiram a libertação mais próxima. Fiquei a saber pelo discurso da antiga reitora, a professora Annick Allaigre, que foi o pintor pernambucano Cícero Dias quem levou clandestinamente o poema para Inglaterra. Não é bonito? Nesse breve momento a França e o Brasil estiveram juntos na luta pela liberdade da Europa. Nesta cerimônia, 80 anos depois, os dois países voltam a encontrar-se na defesa da liberdade universitária.
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