Pegou mal para o governo brasileiro o anúncio de adesão à Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) durante a COP28 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), realizada em Dubai, nos Emirados Árabes. Na visão de ambientalistas, a passagem do país na conferência, que marcaria a volta do Brasil como liderança nas discussões ambientais, ficará manchada pela mensagem endereçada de modo bastante contraditório.
Outro tema que manchou a passagem do Brasil pela COP28 foi a indicação de que o acordo entre Mercosul e União Europeia, que vem sendo discutido há ao menos duas décadas, não deve ser formalizado, conforme deixou bastante claro o presidente da França, Emmanuel Macron.
Sobre a adesão do país à Opep+, de acordo com informações do jornalista Jamil Chade, do UOL, o anúncio por parte de países da Opep de que o Brasil iria aderir ao cartel de petróleo como membro associado manchou a estratégia que o governo Lula planejava adotar na COP28, de ser uma liderança global pelo clima.
Segundo o colunista, a Opep vinha buscando a adesão do governo brasileiro desde a época do governo de Jair Bolsonaro, mas a iniciativa foi barrada. Em outubro deste ano, o grupo acabou convencendo o Ministério de Minas e Energia a retomar a ideia e o presidente Lula acabaria também recebendo os representantes da organização internacional.
Mas havia uma divisão clara dentro do governo. Enquanto parte do Itamaraty, em Brasília, insistia que não faria sentido o país aderir na condição de membro associado, um grupo liderado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira de Oliveira, e por alas da Petrobras eram favoráveis à ideia.
COP28: Ambientalistas dizem que adesão do país à Opep descredita discurso de Lula em prol do meio ambiente
No caso da adesão à Opep+, ambientalistas disseram que é contraditório o governo brasileiro atacar o uso de combustíveis fósseis e, ao mesmo tempo, se aliar a um grupo que luta pelos interesses do setor de petróleo.
Coube à ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança Climática, tentar passar o pano. Na última sexta-feira (1º) – antes, portanto, do anúncio oficial da adesão do Brasil -, ela disse que não via contradição na entrada do Brasil como associado na Opep, desde que o país esteja na condição de observador e de que a entidade discuta economia verde.
“Primeiro lugar, o Brasil não vai participar da Opep. Vai participar como observador, inclusive para usufruir daquilo que são os debates e os aportes tecnológicos”, disse Marina em coletiva de imprensa, em Dubai. “É exatamente para levar o debate que precisa ser enfrentado no âmbito daqueles espaços que são os grandes produtores de combustível fóssil, que é o grande responsável pelo aquecimento do planeta”, complementou a ministra.
A Opep+ é um grupo, dentro da Opep, que inclui os maiores produtores de petróleo do mundo. Além do Brasil, que foi convidado, Rússia e México já fazem parte dos aliados.
O anúncio da adesão do Brasil foi feito pela própria Opep e pegou o governo brasileiro de surpresa. Inicialmente, o Palácio do Planalto desmentiu que já houvesse uma confirmação da participação do país no grupo e informou que o tema estava “sob análise”.
Mas, no sábado (2), o próprio Lula admitiu que o Brasil entraria para o bloco, mas disse que o país faria parte apenas dos membros associados, ou seja, “não apitaria nada”.
No domingo (3), poucas horas antes de embarcar para a Alemanha, ele respondeu às críticas. Sobre a Opep+, Lula disse que a condição de aliado à Opep não significa uma adesão ao grupo, mas sim que o país será “observador” — “eu vou para ouvir e para dar palpite”, para defender alternativas ao petróleo.
“É verdade que nós precisamos diminuir o combustível. Mas é verdade que nós precisamos criar alternativa. Então, antes de você acabar por sectarismo [com o petróleo], você precisa oferecer à humanidade uma opção. E a nossa participação na Opep+ é para discutir com a Opep a necessidade dos países que têm petróleo e que são ricos começar a investir um pouco do seu dinheiro para ajudar os países pobres do continente africano, da América Latina, da Ásia a investir em combustível”, complementou.
Lula disse que a Opep pode ajudar países como o Brasil a investir em projetos de etanol, energia eólica, solar e hidrogênio verde.
Na conferência, Macron critica acordo entre UE-Mercosul
Já no acordo Mercosul – União Europeia, as críticas partiram de Macron, que elogiou Lula por seu protagonismo mundial na questão do ambiente, mas disse que o tratado facilitaria a importação na França e na Europa de produtos com pegada ambiental suja produzidos em países do Mercosul — em especial do Brasil.
As regras mais rígidas exigidas pelos europeus, com a França à frente, era um dos pontos de entrave do acordo. Lula quis aproveitar a participação na COP28 para tentar viabilizar o acordo antes da posse do presidente eleito de ultradireita, Javier Milei, como presidente da Argentina. Durante a campanha, ele sempre se mostrou contrário ao Mercosul.
Lula respondeu às críticas de Macron sobre a falta de cláusulas ambientais no acordo Mercosul-UE. O presidente francês havia dito no sábado (3), minutos após se encontrar com Lula, que o acordo era “completamente contraditório” com a política ambiental de França e Brasil, pois ele não garante que haverá descarbonização das economias envolvidas.
Por sua vez, Lula disse que a verdadeira preocupação da França no acordo não é o meio ambiente, mas, sim, garantir formas de proteger seus produtores de competição que vem do Brasil e da América do Sul.
“A posição do nosso companheiro presidente da França é conhecida historicamente. A França sempre foi o país que criou obstáculo no acordo Mercosul-União Europeia porque a França tem milhares de pequenos produtores e eles querem produzir os seus produtos. Agora, o que ele não sabe é que nós também temos 4,6 milhões de pequenas propriedades de até 100 hectares que produzem quase 90% do alimento que nós comemos e que são alimentos de qualidade e que nós também queremos vender”, disse Lula.
Segundo o presidente brasileiro, “se não tiver acordo, paciência, não foi por falta de vontade. A única coisa que tem que ficar claro é que não digam mais que é por conta do Brasil. Assumam a responsabilidade de que os países ricos não querem fazer um acordo na perspectiva de fazer qualquer concessão.”
Lula reafirmou na COP28 compromissos do Brasil
A participação de Lula na COP28 foi encerrada, mas o encontro ainda vai continuar até a semana que vem.
Negociadores de todo mundo (Brasil incluso) seguirão debatendo temas importantes para limitar o aquecimento global a 1,5º C acima de níveis pré-industriais, financiamento de países ricos aos mais pobres que sofrem com eventos climáticos extremos e a transição energética de combustíveis fósseis para fontes renováveis.
Lula reforçou a agenda ambiental brasileira: de compromisso com a meta de limitar o aquecimento global, de que países ricos que emitem muitos gases nocivos precisam compensar os países pobres que sofrem com eventos climáticos extremos e de que precisa haver uma transição energética — com diminuição do uso de combustíveis fósseis e adoção maior de energia renovável.
“É hora de enfrentar o debate sobre o ritmo lento da descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis. Temos de fazê-lo de forma urgente e justa”, disse Lula no seu discurso na sessão de abertura. “Quantos líderes mundiais estão de fato comprometidos em salvar o planeta?”, questionou.
Redação ICL Economia
Com informações das agências de notícias e BBC Brasil
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